Estudo aponta 1.136 violações aos Direitos Humanos no Patrulha da Cidade
Natal, RN 19 de abr 2024

Estudo aponta 1.136 violações aos Direitos Humanos no Patrulha da Cidade

30 de novembro de 2017
Estudo aponta 1.136 violações aos Direitos Humanos no Patrulha da Cidade

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O programa Patrulha da Cidade, veiculado de segunda à sexta-feira na TV Ponta Negra, afiliada do SBT, cometeu 1.136 violações aos direitos humanos nos meses de abril e outubro de 2017. O monitoramento inédito no Rio Grande do Norte foi realizado pelo Observatório Latino Americano de Comunicação, Mídia e Direitos Humanos (Amaru) e divulgado terça-feira (28) em evento promovido pelo Departamento de Comunicação Social da UFRN. O grupo analisou 25 edições do programa líder de audiência horário do almoço. Os meses de abril e outubro foram escolhidos em razão da disponibilidade da equipe.

Procurada pela agência Saiba Mais, a direção da TV Ponta Negra afirmou que enviaria um posicionamento oficial da empresa diante dos questionamentos encaminhados no final da manhã desta quinta-feira (30), mas até a publicação desta reportagem, não houve retorno.

Composto por professores e estudantes, essa iniciativa soma-se a outros observatórios de mídia existentes no país, e no Rio Grande do Norte tem uma tarefa árdua pela frente: monitorar supostas violações aos direitos humanos cometidas por programas policiais.

O Amaru constatou 399 violações em abril e outras 737 em outubro no Patrulha da Cidade. A análise foi feita por estudantes de comunicação e tinha por foco os programas exibidos nas segundas, quartas e sextas-feiras. Eles preenchiam uma tabela onde indicavam a violação cometida, quem teve os direitos violados, de onde partiu a violação, além da descrição do trecho identificado como violador de direitos. Esses dados serão submetidos na plataforma nacional Mídia sem Violações de Direitos, realizada pelo Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, que monitora violações aos direitos humanos ocorridas em programas policiais de todo país.

Entre os principais critérios para figurar na análise estavam indicadores como: desrespeito à presunção de inocência, incitação ao crime e à violência, incitação à desobediência das leis ou decisões judiciárias, exposição indevida de pessoas, exposição indevida de famílias, discurso de ódio e preconceituoso, Identificação de adolescentes em conflito com a lei e violação do direito ao silêncio.

Segundo Aline Lucena, professora do Departamento de Comunicação da UFRN e uma das coordenadoras do Amaru, a escolha de investigar os programas policiais se deu pela falta de dados sobre os programas no Rio Grande do Norte e pelo fato do estado não figurar em outras pesquisas nacionais já realizadas sobre as violações de direitos humanos nesse tipo de atração.

- Nunca foi feito um monitoramento dessa forma em relação aos programas policiais de Natal, o Amaru foi pensado para atuar em parceria com a plataforma nacional mídia sem violações de direitos [...] tínhamos a hipótese de que o Patrulha Policial era um violador de direitos e, com essa pesquisa, confirmamos cientificamente que esses direitos são violados.

O Amaru constatou, a partir dos monitoramentos, que 21% das violações aos Direitos Humanos foram cometidas pelo apresentador Cyro Robson, o Papinha. Pelo levantamento de outubro, Papinha proferiu ao menos 36 vezes discurso considerado de ódio ou preconceituoso, por 15 vezes incitou à desobediência das leis ou das decisões judiciárias e por 11 vezes fez algum tipo de incitação ao crime e à violência.

A professora Aline Lucena destaca a importância do apresentador na propagação do discurso divulgado pelo veículo:

- O apresentador é uma figura extremamente importante no programa, é na voz dele que estão as violações relacionadas ao discurso de ódio e preconceito, as violações relacionadas à incitação da violência e à desobediência da lei. Embora a pesquisa aponte que o repórter é quantitativamente o principal violador, mas no que se refere a proliferação de um discurso de ódio, ele esta de forma contundente na voz do apresentador.

Apresentador Cyro Robson foi responsável por 21% das violações

O monitoramento ainda mostrou que o alvo das violações são, na maioria das vezes, os acusados de crimes exibidos no programa. Em 37% dos relatos são eles que têm algum direito violado, seja pelo repórter que faz a matéria, seja pelo apresentador do programa. Em 12% dos casos observados como violadores de direitos, o alvo das violações eram as famílias das vítimas e em outros 13% as famílias dos acusados.

Monitoramento foi entregue ao Ministério Público

Coordenadores do Amaru, na UFRN, durante a divulgação do monitoramento do programa Patrulha da Cidade

Com os primeiros dados coletados, uma representação foi protocolada junto à Procuradoria da Cidadania, no Ministério Público Estadual. No último dia 23 de novembro, o Amaru, junto de outras entidades, participou de uma reunião com o Procurador de Geral de Justiça, Eudo Leite, para tratar das violações aos direitos humanos na mídia. Com os novos dados, coletados em outubro, a ideia é preparar um relatório final que será encaminhado ao Conselho Nacional de Direitos Humanos, ao Ministério Público Estadual, ao Ministério Público Federal e também para órgãos internacionais como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

O Amaru está vinculado à disciplina de Comunicação, Mídia e Direitos Humanos do curso de Audiovisual da UFRN. Os estudantes tem um papel crucial para a realização do monitoramento, aplicando as discussões teóricas sobre direitos humanos que acontecem na disciplina.

A estudante do curso de jornalismo da UFRN Amanda Monique Porfírio conta que o monitoramento mudou a visão que ela tinha do conceito de Direitos Humanos.

- Esse monitoramento mudou bastante a visão que tinha em relação aos conceitos de direitos humanos e a importância que nós temos, como futuros profissionais da comunicação, de fiscalizar e cobrar uma postura de ética e respeito em todos os veículos. Acho que esse foi o maior legado que esse monitoramento deixou pra mim.

O Observatório não pretende parar apenas na análise do conteúdo dos programas policiais e também vai monitorar, a partir do ano que vem, a audiência desse tipo de programa. Já está prevista a realização de pesquisas de recepção para entender como as pessoas consomem esse conteúdo. A relação com os anunciantes dos programas policiais também deverá ser foco.

Durante o lançamento do Amaru, panfletos denunciavam as marcas que anunciavam nos intervalos comerciais do Patrulha da Cidade, indicando que esse tipo de publicidade financiava a violação de Direitos Humanos. Entre os anunciantes que chamavam atenção estava uma escola de ensino fundamental da cidade, loja de brinquedos e várias empresas de segurança.
Aluna do curso de Publicidade e Propaganda, Andressa Milanez destacou a importância de ampliar horizontes, especialmente em relação ao monitoramento.

- O Amaru nasceu com o intuito de agregar positivamente na luta por Direitos Humanos em meio a uma mídia que se demonstra tão violadora. O monitoramento dos programas policialescos entrou como uma das ações do Observatório, mas objetivo é monitorar muitos outros conteúdos, ampliando os horizontes.

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