Fim da violência contra mulher passa por mais participação feminina na política
Natal, RN 28 de mar 2024

Fim da violência contra mulher passa por mais participação feminina na política

27 de agosto de 2018
Fim da violência contra mulher passa por mais participação feminina na política

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O sol ainda nem se levantou, quando Maria já iniciou sua rotina. Acordar, preparar o café, arrumar as crianças para a escola, deixar o almoço da família já preparado antes de se deslocar para o trabalho é uma realidade que não é privilégio seu, mas faz parte do cotidiano de uma parcela significativa das mulheres que representa 51,6% da população brasileira.

Nesta hora gasta com os afazeres domésticos, Maria assiste ao noticiário que dá conta de outras 500 mulheres que tiveram sua rotina interrompida por agressões físicas. Um número 29% maior sofre neste mesmo momento com a violência verbal e intimidações. Estão presentes nos ônibus, metrôs, trens, na rua, no trabalho, no supermercado, dentro e fora da casa de Maria, que sente no dia-a-dia o que representa não ser prioridade em meta de segurança pública.

E em cada uma dessas agressões vivenciadas, em cada perda, em cada mentira, em cada verdade negada, há dores demais para Maria esconder. Falta um braço a lhe envolver, uma palavra a lhe confortar, um olhar que a acaricie. Não há uma estrutura de atendimento que lhe acolha. Então, a descrença na política passa a se abrigar na principal força eleitoral do país, que chega à campanha mais afastada dos candidatos que nunca. Um terço das eleitoras brasileiras afirma que não sabe em que votar, segundo a última pesquisa Datafolha.

Enquanto Maria não encontra quem a represente, vê ascender postulantes a diferentes cargos com seus discursos machistas e misóginos. As práticas presentes nas narrativas midiáticas e nos discursos de candidatos a cargos de gestão que usam seu poder e influência política para constranger mulheres, assediá-las e agredi-las apostam na violência como um mecanismo de resolução de conflitos e negam a política como espaço para solução à naturalização das agressões contra a mulher.

Este é o retrato sem retoque da contraditória relação que a política brasileira mantém há décadas com as mulheres. Num país onde elas constituem a maioria do eleitorado, são também as menos representadas nos postos de poder. Uma sub-representação que mantém na periferia do debate público assuntos que afetam diretamente Maria, como as cifras de feminicídios, que não param de crescer: a cada duas horas, uma mulher é assassinada no Brasil.

Dessa forma e de tão comum, essas violências cotidianas passam a não serem percebidas por Maria. A prevenção necessária para que elas não ocorram em primeiro lugar não é apresentada como prioridade em metas de segurança pública. E quando elas ocorrem, as redes de acolhimento e de proteção que deveriam atender às necessidades das mulheres e meninas inexistem.

Mas esse infinito descaro não consegue ocultar o perfume das rosas que se erguem delicadas e altivas, mas com os espinhos à mostra, para lembrarmos que a beleza só pode germinar se for defendida. A luta diária da Maria, por respeito e dignidade, é a luta feita todos os dias pelas mulheres por uma outra sociedade, livre e sem opressão, seja pelo consumo ou pela violência de gênero.

Agora, como que num movimento em espiral, é preciso uma nova prática social propiciadora da formação da consciência emancipacionista. O percentual de 34% de mulheres que ainda não fizeram a opção pelo voto se reflete, por exemplo, na presença feminina ainda tímida nos governos, nas casas legislativas e direções partidárias.

Com raízes culturais e ideológicas ainda profundas, a luta pela emancipação da mulher, uma das pedras de toque do avanço civilizatório, demanda uma batalha permanente de ideias e recomenda o caminho da política, a coragem para se ter lado na definição dos rumos do país nas urnas.

Contra a diversidade da natureza democrática que envolve a luta das mulheres, depõem Dilma, cassam o Lula, definem que pássaros poderão cantar e que é preciso matar as rosas vermelhas. Mas, nenhum processo forjado ou nenhuma defesa do arbítrio poderá calar Maria.

Que nos postemos como cerca viva na defesa de Maria, que lutemos contra as ervas daninhas que a querem sufocar, que a protejamos contra os que a querem tombar, para que ela floresça com seu brilho na participação política nas eleições deste ano, porque seu espaço é nas instâncias decisórias, de poder, é onde queira estar.

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