Muitas conexões, poucos conectados
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Muitas conexões, poucos conectados

14 de janeiro de 2019
Muitas conexões, poucos conectados

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O nome dela começa com J, termina com A e não tem N. Ela tem 11 anos, faz poesia e bem que gostaria de ter um canal no youtube. Só que a mãe dela monitora, por um aplicativo, tudo o que a menina faz no smartphone, além de bloquear o acesso a muita coisa que uma criança de 11 anos não deveria ver ou fazer na internet. O mais curioso de tudo isso é que ela vive na periferia da capital potiguar.

Ela é uma dos pouco mais de 126 milhões de brasileiros conectados à rede mundial de computadores e ainda faz parte dos 97% dessa população que entra na rede pelo telefone celular. Mas nossa amiga – que não é Janaína nem Juliana – ainda mora em um dos 16% dos lares que acessa a internet também pela TV. Lá, ela passa tardes e mais tardes vendo filmes que ela mesma escolhe e só cede o lugar na hora da novela.

Outro dado importante é que, em um ano, o país ganhou 10 milhões de internautas – e, desses, 2,3 milhões é de idosos com mais de 60 anos, grupo que registrou o maior percentual de aumento. Vovôs e vovós conectados, principalmente, para falar com filhos e netos.

É. Estamos muito conectados. Tá certo que ainda temos 54 milhões de brasileiros que não sabem ou não têm dinheiro para pagar a internet ou comprar os equipamentos para o acesso. Mas conseguimos conectar quase 70% da nossa população.

Mas será que estamos bem conectados?

Há dez anos, pesquisadores que observavam as políticas de “inclusão digital” - eu, inclusive - lamentávamos que os governos tivessem mudado o foco dos investimentos. Saíam os centros públicos de acesso e entrava o acesso individual. Muito dinheiro público foi investido nas operadora de telecomunicações para garantir pacotes de acesso à internet residencial a preços populares – que a população ainda não tinha condição nem disposição para pagar.

Depois, vieram os smartphones mais baratos e os chips pré-pagos com 3G e ficou fácil fazer a população de internautas brasileiros aumentar. Isso sem falar no “zero rating” - a prática de as operadoras não cobrarem pelos dados em determinados aplicativos – como os planos que oferecem facebook e whatsapp à vontade, sem descontar da franquia.

O resultado, o IBGE também mostra. O principal objetivo de quase 96% dos nossos internautas é para enviar mensagens de texto, voz ou imagens por aplicativos como whatsapp, facebook ou instagram – todos eles pertencentes a Mark Zuckerberg.

Não dá para negar os benefícios do simples fato de estar conectado. Mas estar conectado dentro das fronteiras do facebook é muito pouco diante do potencial que a internet tem para o desenvolvimento local, para o acesso ao conhecimento ou para o consumo de informações que possam fortalecer nossa cidadania.

E, nesse ponto, a situação brasileira é bem complicada. De acordo com o Relatório da Saúde da Internet, 55% dos brasileiros acha que a internet é o facebook. Mais da metade dos nossos internautas acha que não há nada além da timeline, do botão de curtir ou do botão de compartilhar. Não estamos tão ruins como a Nigéria, Índia ou Indonésia, onde a cifra pode chegar a 65%. Mas ainda estamos bem longe dos 5% dos internautas enclausurados no facebook dos Estados Unidos.

E era por isso que, lá atrás, lamentamos o fim dos investimentos em telecentros. Talvez, aprendendo a se conectar em comunidade, pudéssemos chegar à era dos smartphones com mais desenvoltura para aproveitar a liberdade que a rede pode nos proporcionar.

Agora, é torcer para que nossa amiga – que pode ser Julieta ou Jailma – consiga escapar dos domínios do malvado Zuckerberg.

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