Lula Livre: uma noite no leilão das fotos históricas do ex-presidente
Natal, RN 19 de abr 2024

Lula Livre: uma noite no leilão das fotos históricas do ex-presidente

4 de abril de 2019
Lula Livre: uma noite no leilão das fotos históricas do ex-presidente

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“Nosso maior bem são as nossas imagens, então vamos usar esse instrumento para contribuir com a defesa de Lula, que não é um político preso, é um preso político no Brasil”. Quem explica é Mônica Zarattini, uma das organizadoras do Leilão Lula Livre, realizado quarta-feira (03), em São Paulo, no bar Sabiá, tradicional reduto boêmio paulistano, na Vila Madalena. Mônica integra o coletivo Fotógrafos pela Democracia, idealizador da iniciativa.

O leilão arrecadou mais de R$ 600 mil e toda a renda foi doada ao Instituto Lula para custear o processo de defesa do ex-presidente.

A agência Saiba Mais esteve no Sabiá, acompanhou o leilão Lula Livre e conversou com alguns dos 43 fotógrafos que doaram 50 imagens do ex-presidente para o evento.

Todas as fotografias foram assinadas por Lula de dentro da cela que ocupa na Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. A casa de leilões PB, da Paraíba, abraçou a ideia e legitimou o evento, acompanhado presencialmente em São Paulo e também em João Pessoa, no salão de um hotel localizado na Praia de Cabo Branco.

Mais de 500 pessoas foram ao bar Sabiá e mais de cinco mil acompanharam o leilão pela internet (foto: Ketilyn Bells)

Em meio a personalidades conhecidas do mundo político, como o ex-deputado e ex-presidente do PT, José Genoíno, o vereador Eduardo Suplicy, e Ana Estela Haddad, educadora e esposa do ex-prefeito e ex-ministro Fernando Haddad, circulava pelo leilão a aposentada Malvina Joana de Lima. Durante o evento, ela carregava a todo o tempo uma faixa com o slogan que resumia a noite.

Figura simples em meio à maioria integrante da chamada esquerda caviar, Malvina chamava a atenção e a reportagem foi conversar com ela.

Mulher negra, carioca, de família pobre, foi abandonada pela mãe ainda criança na década de 1950. No fim da década de 1970, Malvina foi morar em São Paulo, onde conheceu a família dos políticos Marta e Eduardo Suplicy. A entrada no universo da militância foi sem volta. Há muito tempo ela participa de todos os eventos capitaneados pela cúpula petista. Está inclusive acampada em Curitiba desde que o ex-presidente foi preso e cozinha para os demais integrantes do acampamento. Vem uma vez por mês à capital paulista pagar contas e aproveitou para prestigiar o leilão. Questionada sobre os motivos de tamanha devoção, ela justifica:

“Lula para mim é família. Ele e o pessoal do PT me acolheram quando eu não tinha nada nem ninguém. No dia em que ele sair eu vou estar lá em Curitiba e quero ter o prazer de entregar uma faixa com “Lula Livre” que eu mesma fiz. Ele jamais deveria estar preso. É um cara que cuidou dos pobres, dos oprimidos. Eu sou uma dessas pessoas. Antes de Lula, minha geladeira era fechada com uma tábua de madeira. Hoje eu tenho uma geladeira de duas portas. Eu achava que ia morrer sem andar de avião e hoje usufruo de tudo isso. Entravam e saíam presidentes cultos, poliglotas, e eu não passava de uma pobre coitada. A mudança só veio com Lula. Só eu sei o que ele fez por mim e por milhões de outros brasileiros”.

Lances variaram de R$ 5 mil a R$ 65 mil

Renda arrecadada será doada ao Instituto Lula para custeio da defesa do ex-presidente (foto: Ketilyn Bells)

Segundo os organizadores, mais de 500 pessoas compareceram ao Sabiá. Casas cheias e cadastro virtual disputado. O leilão atraiu participantes de várias partes do Brasil e do mundo. No início da transmissão, mais de cinco mil pessoas acompanhavam pela internet, sendo duas mil participantes, ou seja, aptas a fazer um lance.

O leilão das fotografias arrecadou R$ 623.900, valor três vezes maior do que a expectativa inicial dos organizadores. Os lances variaram entre R$ 5 mil e R$ 65 mil, valor pago à imagem mais cara, do fotógrafo Paulo Pinto.

O ator José de Abreu, que recentemente se autodeclarou presidente da República numa sátira ao venezuelano Juan Guaidó, participou online e chegou a arrematar uma imagem.

Presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto foi um dos que circularam pelo Bar Sabiá durante o leilão. Ele agradeceu o apoio dos Fotógrafos pela Democracia:

“Ficamos muito satisfeitos por poder contar com a parceria de 43 mestres nessa arte. Eles registraram a caminhada de Lula ao longo de mais de quatro décadas, lutando pelo povo e servindo o povo. Quantas personalidades políticas tem o privilégio de ter essa quantidade de fotógrafos doando o seu trabalho para ajudá-lo a continuar defendendo sua honra e sua inocência? Não é para qualquer um. Isso só é possível porque Lula tem passado e tem honradez.  É importante que essa história seja lembrada”, afirmou.

Imagens que valem por muitas histórias

Mônica Zarattini, fotógrafa e uma das idealizadoras do leilão Lula Livre (foto: Ketilyn Bells)

Números à parte, quem está por trás dessas imagens e que histórias elas contam? Além de organizar o evento, Mônica Zarattini também participou como autora de duas das fotos leiloadas. Ela cita nomes de alguns colegas parceiros da iniciativa:

Francisco Proner, um prodígio de apenas 18 anos de idade, fez aquela foto icônica de Lula carregado nos braços do povo no dia da sua prisão, em abril de 2018, em São Bernardo do Campo. Temos também profissionais que acompanham a trajetória de Lula desde o início da vida pública, como sindicalista. Rogério Reis, por exemplo, é autor da foto mais antiga do leilão - um registro feito durante o 5º Congresso Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNPI), no Rio de Janeiro, em 1978. Nair Benedicto e Juca Martins são contemporâneos da época em que Lula liderava os movimentos sindicais no ABC paulista, ainda durante a ditadura”, comentou.

Fotografia registra Lula nos braços do povo antes de ser levado para Curitiba pela Polícia Federal. Registro foi do fotógrafo Paulo Pinto

Juca Martins teve duas imagens leiloadas. A mais antiga foi arrematada por R$ 20 mil. O registro é lendário: Lula discursa para uma multidão durante a assembleia dos metalúrgicos, no Estádio Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, em 1979. A segunda foto, de 1983, mostra o ex-presidente e Dona Marisa Letícia na juventude, em um clima bem informal, na residência do casal.

“Essa fotografia ficou inédita por mais de 30 anos. Soube que Lula a viu pela primeira vez agora quando foi assiná-la e se emocionou”, conta orgulhoso.

O fotógrafo figura entre os mais renomados do país. Tem o Prêmio Esso, Prêmio Internacional Nikon e Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos na bagagem. Trabalhou para os principais jornais e revistas brasileiras durante a ditadura militar, integrou inclusive a equipe do jornal Movimento, veículo de oposição velada ao regime. Com conhecimento de causa, por ter acompanhado de perto os grandes movimentos políticos e sociais que abalaram o país desde a década de 60, Juca Martins analisa o atual momento:

"Lula foi tirado de circulação para não participar das últimas eleições. Foi jogado em uma cela, sem provas, após um processo baseado apenas em convicções. É uma prisão política.  Eu estava aqui durante a ditadura e cerca de 40 anos depois o que parece é que estamos voltando para essa época arbitrária. Depois de tudo o que passamos, estou agora novamente nas ruas em defesa da manutenção do regime democrático”, lamenta, para logo em seguida reforçar seu papel da militância:

 “Não sei se vamos conseguir a liberdade de Lula em breve, mas essa mobilização e essa pressão são fundamentais para qualquer transformação social. Não podemos abrir mão dos direitos conquistados com a Constituição de 88. Não tenho mais a energia que tinha aos meus 30 anos, na época em que fiz essas fotos, mas não vou ficar parado e não vou ter uma atitude passiva”, desabafa.

Lula Livre em uma imagem

Lula durante visita ao Pantanal Matogrossense, em campanha pelas eleições presidenciais de 1989. Foto: Mônica Maia/AE

Para Mônica Maia, outra fotógrafa participante, a finalidade do leilão não é apenas levantar recursos financeiros, mas principalmente, movimentar a cena.

“A ideia nasceu com o objetivo de mobilizar as pessoas, de chamar a atenção para essa causa e resgatar os 40 anos de trajetória de Lula. Registrei a corrida presidencial dele em 1989. Foi uma campanha com pouquíssimos recursos e equipe reduzida, estávamos sempre juntos viajando pelo país – Lula, os assessores e a imprensa. A minha foto, inclusive, é desse período, quando a gente visitou uma fazenda no Pantanal mato-grossense. Um pássaro corrupião da casa pousou no dedo dele e eu fiz em um clique esse registro incrível. Para mim, essa fotografia é a simbologia maior do Lula Livre”, se emociona.

O Nordeste e a esperança

Um dos registros que integrou o leilão é da fotógrafa Luludi Melo. Em 1994, ela acompanhou o então candidato Lula na Caravana da Cidadania pelo Nordeste. Na foto, o ex-presidente está em cima de um ônibus no município de Madalena, no sertão do Ceará, sendo ovacionado pelo povo. “Dá para ver bem a esperança que Lula passa para as pessoas. No Nordeste a acolhida era ainda mais especial, acredito eu, pelo fato dele ser nordestino e vindo de uma família pobre. O nordestino se sente representado pela força de Lula”, diz.

Quem são os Fotógrafos pela Democracia

O movimento surgiu durante o período que culminou no processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Na época, o coletivo se autodenominava Fotógrafos contra o Golpe. Em 2018, no segundo turno das eleições presidenciais, o grupo ganhou força e começou a planejar ações para barrar a chegada de Jair Bolsonaro ao poder. Integrantes do agora chamado “Fotógrafos pela Democracia” foram às ruas por todo o país registrar as manifestações e os demais acontecimentos que marcaram mais um período turbulento da história brasileira. Agora, o grupo se uniu mais uma vez para colaborar com a causa Lula Livre.

Doaram os seus direitos de imagem para o leilão: Alberto Veiga, André Dusek, Bob Wolfenson, Celso Junior, Christian Carvalho Cruz, Claudia Ferreira, Claudia Guimarães, Douglas Mansur, Ed Viggiani, Edu Simões, Egberto Nogueira, Eliária Andrade, Ennio Brauns, Francisco Proner, Helcio Toth, Hélio Campos Mello, Ian Maenfeld, Jarbas de Oliveira, Jesus Carlos, João Bittar, João Roberto Ripper, João Wainer, Juca Martins, Juvenal Pereira, Luiz Prado, Lula Marques, Luludi Melo, Márcia Zoet, Marisa Carrião, Marlene Bergamo, Masao Goto Filho, Midia Ninja, Miguel Chikaoka, Mônica Maia, Mônica Zarattini, Nair Benedicto, Nana Moraes, Paulo Pinto, Ricardo Stuckert, Roberto Parizotti, Rogério Reis, Rosa Gauditano e Wilson Pedrosa.

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