O dia que Mauro Cezar Pereira telefonou pra mim
Natal, RN 16 de abr 2024

O dia que Mauro Cezar Pereira telefonou pra mim

2 de janeiro de 2021
O dia que Mauro Cezar Pereira telefonou pra mim

Ajude o Portal Saiba Mais a continuar produzindo jornalismo independente! Apoie com qualquer valor e faça parte dessa iniciativa.

Quero Apoiar

Uma tarde de 2011 ou 2012, na redação do Novo Jornal, Marluce atende o telefone, ouve o que diz o sujeito do outro lado da linha e fala em alto, bom som e de forma natural, para espanto de repórteres e editores:

- Rafa, Mauro Cezar da ESPN no telefone quer falar com você.

A hoje finada redação do NJ, bem jovem àquela época, parou e pelo menos uns oito pares de olhos se arregalaram na minha direção. Mais experiente em comparação à turma, mas ao mesmo tempo me tremendo por dentro e fingindo naturalidade por fora, tirei o telefone que ficava ao lado da minha mesa do gancho e mandei, de propósito, uma saudação bem boçal:

- Fala, Mauro ! Rafael aqui, beleza ? O que manda ?

A rapaziada que me olhou com os olhos esbugalhados naquela tarde tinha certeza que eu e Mauro Cezar Pereira, uma das estrelas da ESPN Brasil, éramos grandes amigos. Mentira. Estive com ele pessoalmente duas vezes: num ABC x Vasco de Copa do Brasil, no Frasqueirão, e em outra oportunidade nos falamos bem rápido após uma oficina que Mauro deu no curso de jornalismo da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), em São Paulo.

Mauro ligou para mim porque, na época, o jornalista José Cruz, no Correio Braziliense, me indicou como o repórter em Natal que cobria a Copa do Mundo da forma como reza a cartilha do bom jornalismo: cutucando o poder público que tentava esconder para debaixo do tapete a transparência dos gastos públicos.

Naquele período, sob o comando do mestre Carlos Magno Araújo, fizemos um estrago na tentativa do Governo Wilma e Iberê de esconder informações da sociedade. Depois veio o governo Rosalba, o jornal passou a ter outros interesses e deixei a cobertura.

No papo curto, Mauro queria informações sobre a Arena das Dunas – naquele tempo ainda em construção. Contei o que sabia, trocamos telefones e ficamos de nos falar depois, o que não aconteceu.

Lembrei dessa história hoje após ler o próprio Mauro Cezar anunciar que está deixando a ESPN Brasil depois de 16 anos.

Desde então, uma enxurrada de jornalistas lamentou a despedida porque a ESPN Brasil, durante vários anos, foi aquele canal onde a gente, que ama futebol, sonhou em trabalhar um dia com os nossos ídolos.

Quem não gosta de futebol nunca vai entender, mas as mesas redondas na televisão são como extensões dos nossos sentimentos. Se o Flamengo ganha, por exemplo, eu vejo até as reprises dos programas de madrugada.

Já quando o Flamengo perde, é do jeito que cantava João Nogueira: eu não quero almoçar, eu não quero jantar.

Mauro Cezar foi um dos protagonistas daquele time romântico do jornalismo esportivo. Minha geração não viu Nelson Rodrigues ou Armando Nogueira na bancada da TV, mas contou com o talento e o amor pelo futebol de José Trajano, Juca Kfouri, Lúcio de Castro, Paulo César Vasconcelos, Paulo Vinícius Coelho (PVC), Dudu Monsanto, João Canalha e outros bambas.

Dessa turma, Mauro foi o último a deixar o barco, o que de certa forma coloca um ponto final nesse repertório que unia esporte e política. É o fim, mas um recomeço. Ninguém morreu ali.

É como o ano novo, que começa quando termina aquele tempo que já foi e não volta mais.

Apoiar Saiba Mais

Pra quem deseja ajudar a fortalecer o debate público

QR Code

Ajude-nos a continuar produzindo jornalismo independente! Apoie com qualquer valor e faça parte dessa iniciativa.

Quero Apoiar

Este site utiliza cookies e solicita seus dados pessoais para melhorar sua experiência de navegação.