Fátima Bezerra: “Se precisar endurecer mais as medidas, faremos; mas lockdown sem proteção social não se sustenta”
Natal, RN 28 de mar 2024

Fátima Bezerra: "Se precisar endurecer mais as medidas, faremos; mas lockdown sem proteção social não se sustenta"

7 de março de 2021
42min
Fátima Bezerra:

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A governadora Fátima Bezerra (PT) anunciou na sexta-feira (5) o mais duro decreto relacionado à pandemia com medidas restritivas para ampliar o isolamento social e frear a velocidade de transmissão do novo Coronavírus no Rio Grande do Norte. Entre as novas determinações está a ampliação do toque recolher no Estado, desde sábado (6) a partir das 20h até 6h; e a proibição de circulação de pessoas aos domingos, a exceção daquelas que precisem acessar algum serviço essencial, como hospitais, farmácias e supermercados.

Nesta entrevista especial, Fátima explica divergências com o prefeito de Natal Álvaro Dias (PSDB) e descarta o lockdown sem que haja uma proteção social para que a população mais vulnerável possa ficar em casa nos dias de isolamento. A entrevista foi concedida um dia antes da prefeitura de Natal divulgar um decreto que afrouxa na capital algumas das medidas anunciadas pelo Governo. Chama a atenção o relato da governadora, que nos últimos dias chegou a ligar várias vezes para o prefeito e não obteve retorno.

Única mulher a governar um Estado no Brasil, Fátima Bezerra também fala sobre o Dia Internacional da Mulher, celebrado nesta segunda-feira, 8 de março, e diz que, na política, vivencia de forma recorrente casos de machismo.

Confira a entrevista:

Agência Saiba Mais: A senhora anunciou na sexta-feira (5) um novo decreto com medidas mais rígidas para conter a pandemia. Mas alguns estados estão indo além, como o Ceará, onde o governador Camilo Santana, por exemplo, decretou o lockdown por 15 dias. Ainda não chegamos ao limite da rigidez ? É possível ampliar essas medidas e ser mais rígido ? Que avaliação a senhora faz desse momento ?

Fátima Bezerra: O quadro da pandemia é muito grave. Imaginávamos que num ano marcado por uma crise sanitária sem precedentes como 2020, a pandemia tivesse ficado para trás. Mas, infelizmente, esse segundo momento, esse recrudescimento, com a chegada dessas novas cepas, tornou a pandemia muito mais perigosa. O quadro se agravou de tal forma que, se não tomássemos as medidas que estamos tomando, correríamos o risco de viver o março ou abril mais trágico das nossas vidas. É nesse contexto que temos de tratar as ações de enfrentamento à pandemia.

Que fatores, na avaliação da senhora, fizeram com que chegássemos até aqui nesse estágio ?

A pandemia no Brasil tomou um rumo de bastante gravidade em decorrência não só da falta de uma estratégia nacional unificada, de coordenação em nível nacional, mas se somou a isso a postura negacionista do Governo Federal, na figura principal do presidente da República. O presidente negou a ciência, não valorizou a ciência e está aí a tragédia que estamos vivendo.

O que levou o Governo a endurecer as medidas ?

Nesse último decreto que publicamos, após ouvir a recomendação científica fruto do trabalho dedicado de relevante espírito público, o nosso comitê de especialistas nos colocou o seguinte: primeiro, a alta taxa de transmissibilidade e com as novas cepas a transmissibilidade é ainda mais contagiosa; segundo, a taxa de ocupação de leitos, na casa de 94%. E veja que na sexta-feira (5) haviam apenas 17 leitos críticos disponíveis e uma fila com 72 pacientes. E vale salientar que essa fila nem chegou ao interior, é apenas Natal e Região Metropolitana. Bem, em terceiro lugar como fator para que tomássemos as medidas mais rígidas é que não há medicação adequada para prevenção do vírus, além da baixa cobertura vacinal.

Então editamos medidas mais restritivas, como o toque de recolher, de 20h às 6h, e no domingo o toque de recolher integral, excetuando os serviços essenciais. Mas não chegamos a essa situação por falta de aviso. No final do ano, quando a pandemia arrefeceu, graças a Deus, começamos inclusive a reverter leitos para as patologias em geral. E já no final do ano editamos decreto alertando a sociedade proibindo a realização de festas, como os réveillons. Veio em janeiro um novo decreto mantendo todas essas proibições, de todo e qualquer tipo de evento que resultasse em aglomeração, mas infelizmente não tivemos êxito. Houve um relaxamento por parte da sociedade e é preciso colocar nessa conta a postura do Governo Federal, que não valoriza sequer o uso da máscara, que incentiva aglomeração e receita comprimido sem eficácia comprovada. E a conta chegou.

Os Ministérios Públicos que tem tido um papel colaborativo muito importante na pandemia entraram com ações judiciais à época para suspender os réveillons de Pipa e São Miguel do Gostoso, mas não conseguiram êxito na Justiça. Estou dizendo isso para deixar claro que estamos atentos e temos tomado as medidas que são necessárias para mitigar os impactos da pandemia. Agora repito: ela chegou com essa velocidade.

"Houve um relaxamento por parte da sociedade e é preciso colocar nessa conta a postura do Governo Federal, que não valoriza sequer o uso da máscara, que incentiva aglomeração e receita comprimido sem eficácia comprovada. E a conta chegou".

Aproveitando essa questão do réveillon de Pipa e São Miguel do Gostoso. A senhora tem recebido críticas por recomendar medidas nos decretos, ao invés de determinar, o que na visão de muita gente seria uma forma mais assertiva de conduzir as ações. Ao mesmo tempo, a senhora já disse que quando tentou ser mais incisiva, o Governo foi impedido pela Justiça. Até onde o Estado pode ir e qual é o papel das prefeituras nesse ordenamento das medidas?

Isso ficou pacificado desde o ano passado. Todas aquelas medidas que dizem respeito à regulação, ao funcionamento dos serviços no âmbito local não são atribuição do Estado, mas dos municípios. Serviços em geral, comércio... todo o funcionamento desses serviços que implique em alvará concedido pela prefeitura, isso é de competência municipal. Tanto é verdade que em 2020 eu entrei na Justiça para que o Estado pudesse ter competência nessas esferas, mas perdi. Lembro de determinados decretos que publicamos no sentido de endurecer mais as medidas, mas a prefeitura de Natal adotou medidas mais flexíveis, fomos à Justiça, chegamos a ir até ao Supremo Tribunal Federal, mas o STF colocou que essas medidas que dizem respeito ao funcionamento local, serviços em geral, é de competência dos municípios. Essa é a realidade.

O toque de recolher é competência estadual ou é uma recomendação ?

O toque de recolher é uma esfera do Estado, que está tomando uma medida mais drástica levando em consideração a emergência sanitária que vivemos diante da magnitude da crise que está ceifando milhares de vidas aqui no Estado e, portanto, nesse momento o Estado está exercendo o papel de autoridade sanitária estadual. Mas o funcionamento do sistema de transporte público municipal eu não posso interferir, só recomendar, como tenho feito. Então esse é um dado concreto. Soma-se a isso a prefeitura da maior cidade que tem tido uma postura de flexibilizar mais as medidas, né ? E isso é o mesmo de estar na contramão da realidade que a gente vive, muito dramática do ponto de vista sanitário.

"Lembro de determinados decretos que publicamos no sentido de endurecer mais as medidas, mas a prefeitura de Natal adotou medidas mais flexíveis"

Há uma embate de decretos entre o Governo do Estado e a prefeitura de Natal também sobre a autorização das aulas presenciais no ensino médio das escolas privadas...

Ninguém mais do que eu, com alma de professora que tenho, sei o prejuízo que estamos tendo, principalmente os estudantes da rede pública há praticamente 1 ano sem aula presencial. E considerando, inclusive, que boa parte dessa garotada, que está na rede pública, não tem de maneira nenhuma acesso aos meios digitais dado ao caráter estratégico que a pauta da educação tem. Mas a vida é maior do que tudo, a prioridade máxima é a vida. O prejuízo é grande do ponto de vista educacional, mas a vida tem que estar em primeiro lugar. Considerando a crise sanitária, suspendemos as aulas nas escolas particulares e ainda fizemos uma mediação que foi deixar a permissão para o funcionamento do ensino infantil, nas séries iniciais.

Porque essa concessão ?

Porque, segundo os estudiosos, a criança quando sai da escola vai para casa. Já a turma do ensino médio, não. Ela sai da escola, vê um shopping, segue para outro lugar, vai embora e tome aglomeração. E infelizmente a prefeitura de Natal baixou um decreto destoando do decreto do Estado. Isso é muito ruim porque isso não atende as exigências do ponto de vista sanitário, que é aumentar o isolamento social, conter aglomeração e, portanto, baixar a taxa de transmissibilidade. E também a confusão que causa na cabeça da sociedade.

Como está a relação institucional entre a senhora e o prefeito Álvaro Dias ?

Durante a semana, antes de publicarmos esse último decreto, passei uma mensagem para o prefeito de Natal, ele não respondeu e liguei na quinta-feira. Até porque no decreto anterior eu havia ligado três vezes e ele não atendeu, o vice-governador ligou outras duas vezes e ele também não atendeu e não deu nenhum retorno. Mas nem por isso desisti. Até porque não é uma questão de Fátima ou Álvaro, é a institucionalidade que está aqui agindo em nome dos interesses da coletividade. Ele atendeu na quinta-feira à tarde, falando do novo decreto e eu disse que gostaria muito que a área técnica da prefeitura se reunisse com a área técnica do Governo do Estado para que a gente alinhasse ao máximo as medidas a serem adotadas. Liguei para o prefeito de Mossoró, idem, já que são as duas maiores cidades do Estado. Tenho um diálogo permanente com a Femurn, que representa todas as prefeituras do RN, e um diálogo com os demais Poderes também. Eu não baixo um decreto desse sem um amplo diálogo com a sociedade. Com o setor empresarial, com os trabalhadores e com os demais poderes.

E como tem sido as respostas desses setores ?

Tenho tido apoio unânime dos Poderes do meu Estado. Da Assembleia Legislativa ao Tribunal de Justiça, do Tribunal de Contas, da Defensoria Pública, dos Ministérios Públicos, todos reconhecendo que o quadro é muito grave e que as medidas que o Governo têm adotado são necessárias e adequadas.

"Antes de publicarmos esse último decreto, passei uma mensagem para o prefeito de Natal, ele não respondeu e liguei na quinta-feira. Até porque no decreto anterior eu havia ligado três vezes e ele não atendeu, o vice-governador ligou outras duas vezes e ele também não atendeu e não deu nenhum retorno. Mas nem por isso desisti"

Voltando à questão da relação institucional entre o Governo do Estado e a prefeitura de Natal, pelo que a senhora sentiu da reação do prefeito Álvaro Dias, é possível ter uma sintonia maior daqui para frente entre Governo e o município pelo menos em relação às medidas de enfrentamento à pandemia ?

Olha, eu estou mais esperançosa. Primeiro porque a sintonia, com os demais Poderes, tem sido muito boa, de solidariedade. Os chefes de Poderes do meu Estado estão tendo uma visão de empatia, de reconhecimento da gravidade da pandemia. Por parte da maioria das prefeituras, idem. Tanto é que se você olhar a maioria esmagadora das prefeituras está alinhada com as determinações do decreto estadual. Quem destoou foi a capital e outro município da região Metropolitana, acho que Parnamirim. Mas a própria prefeitura de Mossoró, que num primeiro momento não se alinhou ao decreto, no dia seguinte reconheceu a primazia do decreto estadual, do ponto de vista da determinação do toque de recolher e passou a se integrar às forças de segurança em Mossoró, que estão trabalhando conjuntamente.

A suspensão das atividades religiosas presenciais também causou polêmica. Como está o diálogo com esse segmento ?

Tem sido muito importante o diálogo que venho tendo com os líderes religiosos. A cada decreto desse precede toda uma disposição da governadora em dialogar, é o dia inteiro. Democracia se faz desse jeito, democracia dá trabalho. Mas a essência da democracia é o diálogo plural, inclusive com aqueles que pensam diferente de você, mas buscando construir um consenso em nome do interesse maior da sociedade, da coletividade, que é o caso do contexto sanitário. E queria agradecer a compreensão das lideranças religiosas do meu Estado. Tanto da igreja católica como das igrejas evangélicas. Até porque eles sofrem pressões. A religiosidade é um traço marcante do nosso povo. Eu venho dessa tradição, minha família comunga muito, com toda a fé, a questão da tradição católica. Tenho uma irmã, Conceição, que sofre muito porque gosta muito de ir à igreja, mas precisamos entender essas coisas. Até para que a gente não vá tratar isso de uma forma preconceituosa. Eu sou uma pessoa movida a muita fé. E tenho colocado para eles que a crise sanitária se impõe, daí a suspensão das atividades religiosas. Agora voltando sua pergunta inicial sobre a relação institucional entre o Governo e a prefeitura, espero que a esperança triunfe, avance e que tenhamos um espírito colaborativo.

"Os chefes de Poderes do meu Estado estão tendo uma visão de empatia, de reconhecimento da gravidade da pandemia. Por parte da maioria das prefeituras, idem. Tanto é que se você olhar a maioria esmagadora das prefeituras está alinhada com as determinações do decreto estadual"

Queria voltar à pergunta inicial. É possível novos decretos com medidas mais rígidas que o toque de recolher ? Alguns especialistas defendem o lockdown (fechamento integral do comércio e proibição de circulação de pessoas). A senhora trabalha com essa possibilidade no RN ?

Tenho absoluta consciência de que o que me move aqui é o interesse da coletividade. Escuto todo mundo, trabalhador, empresário, ambulante, lideranças religiosas, os diversos segmentos da sociedade. Agora, o que pauta minha decisão é aquilo que é de interesse da coletividade. No caso da pandemia, eu sempre procurei me amparar pela ciência. Ai de nós se não existisse a ciência, eu não sei o que seria da gente. Meu sentimento, primeiro, é de gratidão o ao papel que os cientistas estão realizando, não só no Rio Grande do Norte, como no Brasil e no mundo. Às vezes há discordância de determinadas orientações que o comitê coloca para o Governo ? Há, sim. Até porque o comitê está agindo enquanto papel de estudioso, da academia, das universidades. E quando você vem para a cadeira de gestor, ele tem que olhar para a floresta como um todo. O gestor tem que levar em consideração as condições do ponto de vista social, econômico... mas os especialistas olham muito mais, e estão corretos, as questões do ponto de vista sanitária. Por isso eu lhe falo: medida mais dura como lockdown sem proteção social não se sustenta. Desculpe, respeito quem discorda de mim, mas não se sustenta. Você não tem como não levar em consideração que, para aumentar o isolamento social, precisa dar de comer a essas pessoas. Você está vivendo num país com 14 milhões de desempregados. Foi uma luta grande para implementar um auxilio-emergencial até dezembro e foi um absurdo suspender aquele auxilio sem que a pandemia tivesse ido embora... então são esses aspectos que devemos levar em consideração. É preciso fazer uma mediação para, em primeiro lugar, garantir assistência à saúde à população e ver as condições do ponto de vista social e econômico.

E o que precisa ser feito nesse aspecto ?

O que foi feito em alguns países, medidas em nível nacional. E não vou nem chamar de lockdown. Por exemplo: a carta que o Conselho Nacional que os Secretários de Saúde publicou recentemente, fazendo um apelo. Levei essa carta numa reunião que participamos com o presidente da Câmara Federal Arthur Lira para tratar da questão da questão da vacina, do financiamento da saúde e do auxilio-emergencial. Falei na reunião: porquê o Congresso não assume essa luta de liderar um pacto nacional em defesa da vida, chamando o Supremo, os demais Poderes... “vocês tem diálogo com o presidente da República”, em que pese a postura negacionista dele. Imagine o Congresso liderar esse pacto, os governadores estariam todos com ele. E começaríamos com um toque de recolher em nível nacional. Imagine o significado disso para a sociedade e o efeito prático disso porque essas medidas ganhariam mais força e legitimidade.

"Por isso eu lhe falo: medida mais dura como lockdown sem proteção social não se sustenta. Desculpe, respeito quem discorda de mim, mas não se sustenta. Você não tem como não levar em consideração que, para aumentar o isolamento social, precisa dar de comer a essas pessoas. Você está vivendo num país com 14 milhões de desempregados"

Houve algum retorno ?

Qual não foi minha imensa frustração vendo que isso não anda. Naquele mesmo dia desabafei no grupo dos governadores, falando que a reunião tinha sido importante do ponto de vista das medidas legislativas para desburocratizar o processo de aquisição de vacina, para as medidas de financiamento de saúde, habilitação de leitos de UTI e o auxílio- emergencial. Eu dizia que a reunião tinha sido boa, mas estava tomada de uma angústia no meu peito porque não resolvem a curto prazo e a curto prazo tínhamos que ter esse movimento em nível nacional em defesa da vida para que essas medidas tivessem mais força, legitimidade e segurar a onda da pandemia para não estar contando com aquele misto de dor, angústia, aflição. Veja o número de pessoas queridas que tem ido embora...

Então se não vai haver um movimento em nível nacional estou fazendo no plano local. Se não há um pacto nacional, estamos fazendo aqui no plano estadual. O momento é de união, e não de discórdia. É de encontro, e não de desencontro. Ninguém, nem a governadora, o prefeito nem nenhuma liderança tem o direito de colocar qualquer outro assunto em pauta porque o que deve nos unir, o foco para onde devemos concentrar as nossas energias é cuidar da saúde do povo do RN e garantir a eles o direito de sobreviver. Parece chavão, mas não é. Tem hora que o óbvio precisa ser repetido: ninguém tem o direito, nesse momento, de se deixar levar por outras questões, seja lá de que natureza for. Pelo amor de Deus !

Não tenho dúvida de que a história será implacável. A história vai julgar o gesto, a atitude, daqueles que não se omitiram. Lembro de uma frase: “as gerações presentes serão julgadas pelas gerações futuras pelo que fizeram ou deixaram de fazer”. E esse julgamento não será longe, não. A história do lockdown ou de medidas mais duras não é fruto de um desejo, é preciso que você tenha bases concretas pra levar adiante aquelas medidas. Não estamos aqui para fazer espetáculo midiático. Algumas pessoas têm uma visão muito romântica das coisas. Como se bastasse apenas o meu desejo, a minha ou a sua vontade. Não. Tem uma série de fatores que interferem nisso tudo. De modo que temos que ser assertivos: então vamos sim endurecendo as medidas e endurecemos mais quanto for necessário para conter a agressividade do vírus e essa alta transmissibilidade, todos unidos, com todos os Poderes e a sociedade.

"Ninguém, nem a governadora, o prefeito nem nenhuma liderança tem o direito de colocar qualquer outro assunto em pauta porque o que deve nos unir, o foco para onde devemos concentrar as nossas energias é cuidar da saúde do povo do RN e garantir a eles o direito de sobreviver"

A senhora citou que, para haver lockdown, seria necessário uma proteção social. Não é segredo para ninguém a situação de solvência financeira do Estado, quando o PT assumiu o Governo em 2019. Só com o funcionalismo, segundo sua equipe econômica, a dívida herdada da gestão foi passada foi de quase R$ 1 bilhão, referente a quatro folhas atrasadas. Alguns estados do país estão anunciando complementos financeiros para pessoas de baixa renda, como o renda básica, uma ampliação no bolsa família e até uma espécie de auxílio-emergencial estadual. É possível pensar em algo do tipo no Rio Grande do Norte ?

Não temos condições. Uma coisa é você comparar a situação do ponto de vista fiscal financeira e orçamentário na Bahia, do Ceará, de Pernambuco, mas pegamos o Rio Grande do Norte totalmente destroçado. Não sei como em meio a uma crise sanitária sem precedentes, com impacto na economia, temos conseguido cumprir com as funções básicas do Estado. Não só pagando dentro do mês os servidores, inclusive quitando os atrasados, como estamos nesse processo e fazendo os investimentos que estamos fazendo. No campo da saúde, não brinque não, foram mais de 600 leitos. O maior número de leitos em toda a história em 30 anos de SUS. Agora nesse segundo pico já vamos instalando 330 leitos de UTI, tínhamos um processo de judicialização, com o Estado tendo uma despesa de mais de R$ 40 milhões.

Poderia explicar melhor ?

As pessoas vão em busca de leito, o Estado não tinha em sua estrutura e a Justiça dava ganho de causa. Você tinha 20 leitos do Tarcísio Maia, 10 no Maria Alice, um absurdo o único hospital de atendimento à criança que estivesse fechado há 3 anos, aqui no João Machado... conseguimos abrir esses leitos que estão com um legado. O Rio Grande do Norte, do ponto de vista fiscal financeiro, estava destroçado. Quem me dera ter condições de ter um bolsa família em nível estadual... temos o Programa do Leite, um programa social de grande alcance, os Restaurantes Populares, bem com outras ações. O que fizemos nesse período foi chegar junto. Através da agência de fomento estadual conseguimos incluir os autônomos, os pessoal sem carteira assinada, foram mais de 30 milhões de crédito para esse segmento. Criamos um programa específico para a Juventude, agricultura familiar, turismo, que é um dos setores mais afetado. O RN não tem indústria, a maioria dos empregos é gerado pelo setor de serviços e o turismo é nossa ponta de lança.

Esse é um dos setores mais afetados e de onde vem boa parte das críticas às medidas de restrição...

Não vamos desconhecer que o toque de recolher tem um impacto grande na área de entretenimento, que geram centenas, milhares de empregos aqui no RN. Temos chegado junto com liberação de crédito no plano local, aqui através da AGN, o programa de Nota Potiguar para o turismo, todas as iniciativas para fomentar o turismo regional, funcionou bem, e tivemos a sensibilidade para reduzir em 50% ICMS da energia nessa área. Solicitaram no final do ano para que a gente prorrogasse para 2021 e nós prorrogamos, o que significa que o Estado está arcando com isso. Até porque o custo da energia é bastante alto.

Outra coisa que precisa ser resolvida é transporte publico. A sociedade fazendo o sacrifício que está fazendo, pessoas imprensadas feito sardinhas em latas, e a prefeitura de Natal limitando a frota em 70%. Pelo amor de Deus, não tem como limitar a frota agora, você precisa é reorganizar os horários.

Então pela luta que houve, o auxílio emergencial, o auxílio federativo, programas em nível nacional pra liberar crédito, do ponto de vista de socorro, isso tudo tem que ser visto como direito da população, e não favor. Ao ponto do presidente da República e o ministro das Comunicações, fazer politicagem daquela ordem, coisa mais feia.

Queria abordar essa questão na sequência. O ministro Fábio Faria endossou uma informação distorcida divulgada pelo Bolsonaro de que o Rio Grande do Norte teria recebido R$ 18 bilhões durante a pandemia. E mentiu também sobre a verba enviada aos outros Estado. Houve uma reação em bloco dos governadores. Num momento em que o país precisa de unidade, como a senhora viu esse episódio ?

Veja, a reação foi imensa. Porque é um escândalo aquilo ali. Como é que o Presidente da República e o Ministro de Comunicações do país fazem um ato abominável daquele. Abominável. Com o intuito unicamente de querer confundir a população. Chegaram ao desatino, ao desplante de divulgar ali um conjunto de receitas, como se aquilo fosse um favor de governo A, B ou C. Aquilo é pacto federativo. Aquilo é ditame constitucional. Coisa feia, muito feia. Às vezes fico pensando o que é isso que está acontecendo exatamente com nosso país? Veja, no caso do Rio Grande do Norte disseram que o Estado teria recebido R$ 18 bilhões. Ora, o orçamento da gente não chega a R$ 12 bilhões. Ele mistura ali as contas, porque ali estão as transferências constitucionais como o FPE, o FPM, que é fruto inclusive do imposto que eu, que você pagamos, mas quem arrecada esse tributo é a União, que é quem reorganiza essa distribuição. Assim como o ICMS. O ICMS quem arrecada é o Governo do Estado, mas é minha obrigação, é mandamento constitucional distribuir para os municípios. O Fundeb, por exemplo. O Fundeb, inclusive, o fundo formado pela vinculação da Educação... quem sustenta o Fundeb somos nós, são os Estados. Muito mais que os municípios. E a maioria dos recursos do Fundeb vai para os municípios. Enfim, é deplorável, deplorável. Eu não quero nem perder tempo com isso porque, eu acho uma coisa tão atrasada, mas tão atrasada quando insiste nessa coisa... como se aquilo que o governo faz com o Estado B, C, fosse uma benesse. Ei, acabe com isso. Vem aquela visão da casa grande e da senzala. Como se fosse essa filosofia de casa grande e senzala. Pelo amor de Deus, isso é direito da população e, portanto, dever do Estado. Não se trata aqui de favor A, B nem C. Muito feio. Agora, os que advogam esse modelo, infelizmente, são aqueles que foram formados na escola do patrimonialismo, na escola do fisiologismo, a escola, por exemplo, de ver a gestão do Estado como algo impessoal. Isso são os resquícios ainda do coronelismo.

Voltando um pouco na questão dos leitos, essa semana o secretário municipal de saúde, George Antunes, fez um elogio público do trabalho do Estado na ampliação de leitos. Quando o Governo do Estado desistiu de fazer o hospital de campanha, que levou muitas críticas na época, era pensando nesse cenário, essa interiorização dos leitos?

É preciso lembrar aqui que, naquele momento, quando o Governo buscou uma das alternativas, que era o chamado hospital de Campanha, dada a emergência que a gente vivia e vários estados estavam fazendo isso. Mas você lembra, né, que nós fomos vítimas de um ataque virulento, virulento mesmo, movido por essa fábrica criminosa que se chama as fake News. Uma coisa horrível. Aproveitando aqui para pedir as pessoas que não se deixem levar por essa fábrica criminosa de plantar inverdades, de plantar calúnias, que são as fake news. Que as pessoas chequem as informações. Então houve um ataque ao Governo, como se o Governo não tivesse ali agindo com todo o rigor como o Governo age. Mas, na verdade, essa tese de fazer o investimento na própria rede nossa foi da nossa equipe. A nossa equipe é muito boa. Dr. Cipriano, contando com Petrônio naquele momento, hoje com o brilhantismo de dra. Maura na secretaria adjunta e, também, com Liane na subsecretaria, e aqui, repito, a colaboração imensa que dr. Petrônio teve. Mas a tese, sim, foi deles de que nós deveríamos centrar esforços em fortalecer a nossa rede estadual. E foi aí que surgiu exatamente a ideia do Pacto pela Vida.

Não se arrepende de ter desistido do hospital de Campanha ?

Acho que foi a decisão mais acertada que nós tomamos. E buscamos um suporte que foi a Liga. A Liga foi maravilhosa, porque em 30, 40 dias colocamos 20 leitos de UTI para funcionar. O hospital de Campanha de Natal, se não me engano, levou quase três meses. E aquele modelo que a gente fez com a Liga, com um detalhe, é que todos os equipamentos que iam para lá eram revertidos para o Governo do Estado, para a gente levar para nossos hospitais. Então a tese foi isso. Surgiu da nossa própria secretaria, que já tinha isso no nosso programa de governo, de reorganizar nossa média e alta complexidade, recuperando o papel dos hospitais regionais. E esse será um dos grandes legados que vamos deixar no nosso primeiro mandato. Uma coisa, por exemplo, era o hospital de Pau dos Ferros há três anos, outra coisa é o hospital de Pau dos Ferros agora. O próprio Tarcísio Maia. É aquela história, são os fatos que nós estamos apresentando com os argumentos concretos. Tarcísio Maia com 20 leitos de UTI judicializados desde 2012, vinha da gestão anterior, da anterior. Hoje todos abertos. Outro exemplo: Assu, o hospital Nelson Inácio, 20 anos de hospital em Assu e o sonho daquela região era ter um hospital com leito de UTI. E fico imaginando como é que, até hoje, um hospital para aquela região daquele porte não tinha UTI, mas nós levamos. E aí podem dizer, "ah ela está fazendo para depois tirar." Não. A UTI veio, e veio para ficar. Imagine quanta gente pode ter ido embora dessa região porque não deu tempo de chegar até Mossoró por um leito de UTI. O hospital lá de Pau dos Ferros, hoje nós temos tomógrafo, raio-x,  equipamentos de última geração. Nós estamos, inclusive, fazendo cirurgias lá que há muito tempo não eram feitas. Caicó. Eu sugiro que vão lá olhar o hospital regional de Caicó. O Mariano Coelho, lá em Mossoró. O quanto a gente avançou do ponto de vista de qualificar a assistência à saúde nessas regiões. As pessoas não precisam ficar mais balançando os carros, enfrentando os catavios pelas pistas a fora atrás de um exame em Mossoró ou Natal. Não precisa mais passar por essa humilhação porque chegou agora na sua região, com esses tomógrafos, com esses equipamentos que estão chegando. João Câmara: iam fechar. Pelo contrário, a governadora disse que não ia fechar. Não tem como. E nós estamos investindo lá no hospital de João Câmara. No caso de Canguaretama teve uma situação difícil porque o hospital de lá já tinha sido fechado por determinação da vigilância sanitária, bem como também da recomendação do Ministério Público. Lá não teve como a gente reverter a situação, mas, em compensação, será a primeira região a receber a primeira policlínica. Isso com aquele centro de atendimento especializado, que já era para estarmos bem avançado com isso, mas com a pandemia não foi possível. E agora também em Canguaretama, com o prefeito atual, Wellinson, nós estamos inclusive fazendo uma parceria lá com relação ao hospital municipal. Mas é isso, isso estava em meu projeto de governo, e nossa equipe de saúde, competente como é, com a visão de planejamento, de quem entende muito bem do sistema SUS, foram eles quem tiveram essa proposta e que foi o caminho mais acertado.

Governadora, o STF definiu que os Estados e municípios podem adquirir vacinas por conta própria, mas a senhora mesmo  já falou publicamente que defende que a compra seja feita pelo Governo Federal através do Plano Nacional de Imunização, via Ministério da Saúde. O Governo do Estado também já anunciou publicamente que tem interesse na compra, via Consórcio do Nordeste, daquela vacina Russa, a Sputnik. O que tem de verdade nisso tudo, como está a questão das vacinas, o que tem para chegar mais, como está essa relação das vacinas aqui no Estado?

Primeiro vamos dar os dados aqui no plano local. Infelizmente no Rio Grande do Norte, a exemplo dos demais Estados do país, a nossa cobertura vacinal ainda é muito pequena. Nós estamos agora, acho que até esta última quinta-feira, com cerca de 154 mil pessoas vacinadas no Estado para uma população de 3,513 milhões. Segundo, eu confesso que comecei o mês de janeiro com esperança muito forte que foi a chegada da vacina. Um dos momentos de maior alegria depois de todo aquele sofrimento do ano de 2020, vendo tantos irmãos indo embora aqui no Rio Grande do Norte. Um dos momentos assim de alegria no meu coração, de esperança renovada foi quando eu cheguei com as vacinas aqui no Rio Grande do Norte. Chega eu me emociono ao falar sobre isso. Quando eu fui a são Paulo naquele dia, naquela caravana com os governadores, me abracei ali com a bandeira do Rio Grande do Norte, era literalmente o abraço com a vida, o abraço com a esperança, a esperança de dias melhores para o povo potiguar. Claro que todos nós sabemos que o remédio mais eficaz mesmo para conter essa pandemia é a vacina. Mas quero dizer que a esperança em pouco tempo se tornou frustração, quando o governo federal mais uma vez não demonstrou de maneira nenhuma agilidade, a celeridade necessária para a gente avançar no processo de vacinação.

Aí volta toda aquela discussão que a gente já fez, não é só a falta de uma coordenação, não é só a falta de uma estratégia nacional unificada, é falha mesmo. Como é que o Brasil, um país como o Brasil, não se preparou para que essas vacinas chegassem aqui o quanto antes. Você vê um país como o Chile, vizinho, está vacinando quase 20% da população. Essa semana eu fiquei vendo aquilo, o Chile simplesmente retomou as atividades presenciais na educação nessa semana porque vacinou os profissionais de educação. Do porteiro da escola ao professor. E aqui nós estamos ainda, depois dos profissionais de saúde, que são os guerreiros, linha de frente, ainda estamos na faixa de vacinar os 80 anos de idade. Por que? Lentidão, lentidão, lentidão. A gente fica se perguntando: meu Deus, como é que o governo federal, o Presidente da República, não tem um mínimo sentimento de compaixão, de entender a importância, a agenda mais importante do país que é exatamente o processo de vacinação. Sete meses para fechar o contrato com a Pfizer e com a Jansen, que podia ter sido fechado desde o ano passado. Aí vem também as trapalhadas da Anvisa, com todo respeito que eu tenho à instituição, mas o fato é que nós estamos pagando esse preço. Ainda bem que o cenário tá mudando, e aí a importância da carta que nós enviamos ao Presidente da República nesta última quinta-feira, onde a gente coloca que os governadores do Brasil pedem, clamam, reivindicam a imediata adoção das providências necessárias para que possamos acelerar o processo de vacinação em nosso país.

"Um dos momentos assim de alegria no meu coração, de esperança renovada foi quando eu cheguei com as vacinas aqui no Rio Grande do Norte. Chega eu me emociono ao falar sobre isso. Quando eu fui a são Paulo naquele dia, naquela caravana com os governadores, me abracei ali com a bandeira do Rio Grande do Norte, era literalmente o abraço com a vida, o abraço com a esperança, a esperança de dias melhores para o povo potiguar".

A gente pede ao Presidente da República para, enfim, o Governo Federal fazer a interlocução junto aos organismos internacionais como a OMS, as entidades estrangeiras, as nossas forças diplomáticas, porque não basta apenas dizer agora que o estoque de vacina vai aumentar consideravelmente em março, em abril. Não basta dizer que até o meio do ano ele quer chegar a 50% da população vacinada no Brasil. Isso tem que chegar. Na carta, os Estados pedem que possa acelerar a entrega dessas vacinas. É disso que se trata nosso apelo, nosso chamamento. Então a gente pede aqui que o Governo Federal, especialmente através do Ministério da Saúde, das Relações Exteriores, a Organização Mundial de Saúde, que nos procurem. É isso. Nós queremos não apenas o anúncio que tem tantas doses. Nós queremos que acelere essa escala de vacinação para chegar mais vacinas. Para quê? Para que a gente, aí sim, possa preservar a vida do povo dos nossos Estados, para que a gente possa retomar a nossa normalidade, inclusive o funcionamento das atividades econômicas, com todas as medidas de segurança sanitária que isso exige. Então a mensagem que quero deixar é que a esperança está renascendo, e eu espero que no mês de março essa escala de vacinação amplie. Aquilo que cabe aos Estados e municípios nós estamos fazendo, que também não é nenhum favor, é nosso dever. O sistema é tripartite: o plano nacional de imunização, de quem é a coordenação? É do Governo Federal. Quem adquire vacina? É o Governo Federal. Quem paga a vacina? O Governo federal. O Estado recebe a vacina e rapidamente redistribui aos municípios que vai fazer a vacina chegar no braço do povo. Então essa parte que cabe aos Estados, graças a Deus, chegou aqui, as vacinas estão indo embora para os municípios, em 24h exatamente a gente começa a distribuir com toda segurança sanitária que isso requer. Do ponto de vista da temperatura, há toda aquela logística. E os municípios estão aplicando, tem salas de vacinação abertas em todo o Estado do Rio Grande do Norte. Agora, a gente precisa de mais doses, mais doses e mais doses de vacinas. Então, quando a gente comemorou a decisão do Supremo de permitir que os Estados possam adquirir vacinas, e é verdade que o Consócio está conversando com a Sputnik, bem como também, por exemplo, eu tenho o protocolo do Estado do Rio Grande do Norte com o Butantan, nós temos também conversas com a União Química, então nós celebramos isso como forma de mais atores entrarem nesse cenário, até para ajudar o Governo Federal.

"A gente fica se perguntando: meu Deus, como é que o governo federal, o Presidente da República, não tem um mínimo sentimento de compaixão, de entender a importância, a agenda mais importante do país que é exatamente o processo de vacinação".

Quando a senhora fala temos um protocolo com o Butantan, o que isso que isso significa na prática?

Significa que se o plano nacional de imunização não assegurar a todos os Estados brasileiros a quantidade de doses de vacinas suficiente, e espero que isso não aconteça, e o Butantan resolver o processo de venda com os Estados, o Rio Grande do Norte já está ali na fila. Agora eu quero deixar aqui muito claro que me somo literalmente à maioria dos governadores, inclusive o governador do Piauí Wellington (Dias), que é nosso coordenador da estratégia da saúde e que vem fazendo um belíssimo trabalho, eu me somo literalmente a ele que todas as vacinas que por acaso os Estados vierem a adquirir sejam todas entregues ao PNI, Plano Nacional de Imunização. Nós não podemos abrir mão disso. Seria o maior retrocesso. Basta os retrocessos que nós já estamos vivendo. Mais esse, não. Um dos maiores legados do SUS é exatamente as políticas públicas na área de imunização. O Brasil tem sido referência para vários países pelo mundo a fora. Então eu coloco isso aqui porque acho importante deixar muito claro aqui a minha posição perante a sociedade potiguar. Nós estamos aqui imbuídos da luta porque eu moverei montanhas em busca de mais vacinas para o povo do Rio Grande do Norte, mas dentro da lógica via plano nacional de imunização.

Segunda-feira é 8 de março. Nesses dois primeiros anos, seu governo criou uma delegacia 24 horas e instituiu uma delegacia virtual para auxiliar registros de B.Os durante a pandemia. Já é possível sentir os benefícios dessas ações para as mulheres?

A partir do momento que o nosso governo criou a Secretaria de Mulheres, onde temos uma equipe, além da competência, que tem toda uma história, uma trajetória de vida legitimada pela luta em defesa das mulheres, a gente vem nesse esforço grande para fazer com que a SEMJIDH possa cumprir o seu papel em articulação com as demais secretarias e garantir a implementação de políticas públicas que venham na direção de respeitar os direitos das Mulheres. Então vamos pegar aqui a questão da violência. Essa é uma chaga mundial. Na verdade, o feminicídio não quer saber de família, de classe social, de cidade, ele atinge as mulheres indistintamente. Claro que as mulheres mais pobres, de periferia, elas sofrem mais ainda. Mas é uma coisa abominável e que a gente que defende, que acredita num mundo civilizado, não pode se acomodar com isso, a gente não pode deixar essa coisa se naturalizar. Evidentemente que um governo com perfil popular como o meu, uma professora à frente do governo, eu tenho que destinar um olhar muito especial. E eu tenho cobrado muito da nossa equipe. Nesse contexto de pandemia, as mulheres têm sofrido muito mais, principalmente mulheres de classes sociais mais difíceis, até porque o agressor ficou dentro de casa, e a violência doméstica, infelizmente, a fotografia dela é exatamente dentro de casa. Então, com a questão do isolamento social, ela ficou refém do próprio agressor. Por isso que nós tomamos essas iniciativas todas. Você falou da delegacia virtual que nós instalamos, e eu vou aqui citar para você o comitê estadual para o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra as mulheres, que a gente instalou em 2019. Ainda em 2019, criamos um núcleo de combate ao feminicídio, dentro da Polícia Civil. Instituímos a Patrulha Maria da Penha que existia só no nome, que acompanha as medidas protetivas das mulheres em situação e violência doméstica e familiar. Sancionamos uma lei o ano passado que dispõe sobre a obrigatoriedade aos síndicos de denunciar aos órgãos de segurança casos de violência doméstica e familiar contra as mulheres, idosos e crianças. E a delegacia virtual para aumentar a acessibilidade e acolhimento das mulheres vítimas de violência. Até porque a delegacia virtual ela veio para ficar, mas surgiu exatamente nesse contexto de pandemia, de isolamento social. Nós também realizamos o programa Maria da Penha para as escolas, que é o PROMAR, e eu estou cobrando muito. Maria da Penha tem que estar na escola, a escola é um espaço fundamental de reflexão, da gente difundir os valores da solidariedade, da tolerância, do respeito e, portanto, a escola tem lugar sagrado, tem que dizer que discriminação é crime, violência é crime, machismo é crime, homofobia é crime. Enfim, a gente nasceu foi para proclamar os valores da cidadania, da solidariedade e do respeito. E isso é conteúdo da escola. A escola tem que exercer esse papel. Porque todos nós sabemos a carga de preconceito que até hoje a gente enfrenta por conta de todo esse processo histórico da sociedade patriarcal.

"Nesse contexto de pandemia, as mulheres têm sofrido muito mais, principalmente mulheres de classes sociais mais difíceis, até porque o agressor ficou dentro de casa, e a violência doméstica, infelizmente, a fotografia dela é exatamente dentro de casa. Então, com a questão do isolamento social, ela ficou refém do próprio agressor. Por isso que nós tomamos essas iniciativas todas".

Então eu coloco muito a Secretaria de Mulheres de mãos dadas com a Secretaria de Educação e com a Secretaria de Cultura, porque você há de convir que a Secretaria do ponto de vista de valores... é evidente que a intersetorialidade com a Educação e Cultura é fundamental para fortalecer esse papel da Secretaria de Mulheres, que é o de combate sem tréguas à violência contra as Mulheres. Nós também lançamos um botão de pânico, ainda dentro das medidas que nós tomamos dentro desses dois anos, que alerta a proximidade da tornozeleira eletrônica em casos de medidas protetivas envolvendo mulheres vítimas de violência.

A novidade que quero trazer é que, apesar das dificuldades, estamos ampliando as delegacias especializadas em atendimento a mulheres vítimas de violência e vamos começar por Caicó, que era um sonho antigo lá. Uma luta liderada pelo Movimento de Mulheres e ela vai abrir na nova Central do Cidadão que vai ser inaugurada em Caicó. Nós temos também uma luta para implementar uma em Assu e por aí vai. O fato é que eu quero aqui celebrar que, fruto de todas as ações que a gente tem adotado, ou seja, desse combate sem tréguas à violência contra as mulheres e pensando nas políticas que tragam inclusive a autonomia econômica delas, é por isso que a agência de fomento tem um programa de crédito especial para as mulheres, ou seja, com mais atratividade, inclusive para as mulheres da agricultura familiar, um crédito mais desburocratizado e com melhores condições para ela acessar. Nossa gestão conseguiu com essas políticas públicas de proteção e combate à violência contra a mulher reduzir em 52,9% os casos de feminicídio no Rio Grande do Norte no último ano em comparação a 2015 e 2016. Mas nós temos que trabalhar para reduzir essa violência a zero. Um desafio muito grande. Nós temos que fazer o combate sem tréguas à violência contra as mulheres. As mulheres merecem viver uma vida com dignidade e sem violência junto, inclusive, com os homens.

Como única mulher a governar um Estado no Brasil, a senhora sente a diferença de tratamento nas reuniões com os demais chefes de Estado ? Houve algum episódio que a senhora se viu vítima de machismo no exercício do cargo de governadora ?

Ah, o machismo infelizmente está impregnado na cultura brasileira e evidente que nesses tempos que estamos vivendo, com o ministério das Mulheres e Direitos Humanos em nível nacional, as políticas adotadas por esse ministério, no geral, não ... luta diuturna, cotidiano, mas a gente não baixa a cabeça e assumimos um papel de atrevidas sempre. Mas infelizmente esse cenário permanece.

Algum episódio específico de que a senhora se recorde ?

Uma coisa que me irrita muito é que muitas vezes, nós mulheres, para sermos escutadas, precisamos levantar a voz. E isso é muito ruim. Queremos ser ouvidas. Do mesmo jeito que o homem não precisaria gritar, a gente também não. Minha própria formação, sempre me trouxe uma convicção forte da luta por direitos, da luta por igualdade de oportunidades. Nunca levei desaforo para casa, seja na época como dirigente sindical, como parlamentar e depois no Governo. Na função pública que eu exerço não faço nenhuma concessão em nome do interesse público. Não quero ser melhor que ninguém, apenas cumpro meu dever. Encaro como uma missão, como no parlamento, ou na época do Sinte, que trago até hoje na minha identidade. Aliás, celebrei essa semana que o Ministério da Educação, depois de uma letargia imensa, incluiu os profissionais de educação  entre os grupos prioritários para tomar vacina. E sem falsa modéstia, eu liderei esse movimento. Mandei carta para o presidente, cobrei em todas as reuniões com o ministro Pazuello e até com o novo presidente da Câmara Federal. Isso é fundamental, não estamos tratando de uma agenda qualquer, mas de algo estruturante. No caso da luta das mulheres, ninguém vai levar desaforo pra casa, é levantar a cabeça sempre. Queremos liberdade, direitos. Nem mais, nem menos. Queremos oportunidades, ser tratadas com o respeito que merecemos e que cada um seja feliz da forma como escolher. Não temos ingenuidade de ver que na sociedade patriarcal, com os vícios do machismo, com a violência, precisamos estar atentas, mas nossa luta é junto com os homens, com a juventude em geral, só não dá mais para pensar como naquela frase horrível de que “por trás de um grande homem existe uma grande mulher”. Diminuiu, mas ainda ecoa. Mas avançamos e vamos celebrar esses avanços proporcionados pela luta das mulheres no mundo.

"Nunca levei desaforo para casa, seja na época como dirigente sindical, como parlamentar e depois no Governo. Na função pública que eu exerço não faço nenhuma concessão em nome do interesse público. Não quero ser melhor que ninguém, apenas cumpro meu dever".

Para encerrar, o ex-ministro Fernando Haddad disse essas semana a uma rádio local que a senhora pode vir a ser candidata à presidência da República pelo PT... 

(risos) Adoro o professor Fernando Haddad, mas quero dizer que um dos nomes colocados no meu partido para a disputa presidencial é exatamente o nome dele, caso Luiz Inácio Lula da Silva não recupere seus direitos políticos. Mas a despeito de mais nada espero que criemos juízo e sejamos capazes de formar uma frente ampla nesse país, de perfil democrático, de esquerda, progressista para que a gente possa levar o Brasil ao seu verdadeiro destino novamente, que é o de uma nação que acolha seus filhos, garantindo emprego, inclusão social, distribuição de renda. Esse país tem que se encontrar com seu destino, e como o povo do Nordeste deseja, poder se reencontrar tendo Luiz Inácio Lula da Silva presidente do Brasil novamente.

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