Casa, rua e escola são ambientes onde mais ocorre LGBTfobia em Natal, aponta relatório do Centro LGBT
Natal, RN 25 de abr 2024

Casa, rua e escola são ambientes onde mais ocorre LGBTfobia em Natal, aponta relatório do Centro LGBT

6 de maio de 2021
Casa, rua e escola são ambientes onde mais ocorre LGBTfobia em Natal, aponta relatório do Centro LGBT

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O Centro LGBT de Natal divulgou, em abril, dados sobre os atendimentos realizados na unidade de outubro a dezembro de 2020. De acordo com o relatório, 34 pessoas buscaram os serviços do órgão municipal no trimestre e 32 foram acompanhados. Desse total, 82% relatou ter sofrido algum tipo de violência em anos anteriores a 2020 e outros 47% foram alvo de alguma forma de agressão no ano passado.

A maioria delas relata experiências de violência psicológica, 24% (17) antes de 2020 e 28% (9) no ano passado, e discriminação, com 16 (23%)  e outros períodos e 8 (24%) de 2020.

Tanto nos casos relatados de antes de 2020 e no ano passado, mais da metade das situações foi motivada por LGBTfobia (61% e 73%). Os agressores, na maioria das situações, são desconhecidos (23% dos casos antes de 2020 e 48% no ano passado), a mãe (17% dos casos antes de 2020 e 16% em 2020), e pessoas com relação institucional (14% antes desse ano e 5% nesse ano).

Residência (26% em anos anteriores e 32% nesse ano), rua (20% antes de 2020 e 21% nesse ano), e escola (20% dos registros anteriores a 2020) são os locais com mais incidência de violência contra pessoas LGBTQIA+.

Dos 32 acompanhados pelo Centro LGBT de Natal entre outubro e dezembro de 2020, 8 pessoas tiveram ideação suicida (25%) e 3 atentaram contra a própria vida (9%).

No aspecto apoio familiar, 11 indivíduos (34%) responderam positivamente sobre serem acompanhados por parentes, 4 (13%) afirmaram não ter proximidade e 17 (53%) não souberam informar.

Mulheres e homens transexuais foram os que mais relataram terem sofrido violência (41% e 38%, respectivamente). Três mulheres cis também reclamaram algum tipo de violação (9%), além de uma travesti (3%).

Homens trans descreveram situações de violência física, psicológica, uma tentativa de homicídio, discriminação, violência verbal e institucional. Mulheres trans foram alvo de assédio sexual, violência psicológica, assédio moral discriminação, violência verbal e urbana.

Mulheres cis denunciaram violência psicológica, verbal e urbana e a travesti foi vítima de violência psicológica e verbal.

"O Centro LGBT atua na proteção, garantia de direitos e acompanhamento às situações de violências. Nem todas as pessoas acompanhadas pelo Centro buscam o Serviço em decorrência de uma situação de violência, alguns procuram para obter orientações a respeito da documentação, no entanto, de acordo com os dados apresentados, é possível perceber que a violência é transversal ao cotidiano dessas pessoas. No caso das que procuram após a ocorrência de algum tipo de violência, recebem orientações e apoio do serviço para as providências cabíveis", explica Yara Costa, secretária municipal de Igualdade Racial, Direitos Humanos, Minorias e Pessoas com Deficiência.

O órgão é vinculado à Secretaria Municipal de Segurança Pública e Defesa Social (SEMDES), no âmbito do Departamento de Direitos Humanos. No entanto, após a criação da Secretaria Municipal de Igualdade Racial, Direitos Humanos, Minorias e Pessoas com Deficiência (SEMIDH), o equipamento está em processo de transição para esta, mantendo a sua administração compartilhada com a Secretaria Municipal de Assistência Social (SEMTAS) e com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

Yara Costa é a secretária municipal de Direitos Humanos / foto: divulgação

Foram acompanhados 12 usuários ou famílias em outubro, 13 em novembro e 23 em dezembro, totalizando uma média de 22,3 usuários acompanhados por mês.

Em 76% dos casos, o perfil do usuário atendido era de pessoa em situação LGBTfóbica (19 casos). Outros três atendimentos se tratavam de indivíduos em situação de prostituição (12%) e outros 12% de família cuja situação de violência esteve associada ao abuso de substâncias psicoativas.

A maioria dos atendidos (28 pessoas, 88%) chegou ao Centro espontaneamente. Houve dois encaminhamentos  pela rede socioassistencial, outro do Ambulatório Municipal LGBT e mais um vindo de uma Unidade Básica de Saúde (UBS).

Readequação de nome ao gênero é principal motivação de busca por atendimento

Em 36% dos casos, a motivação para procura do Centro foi alteração de pronome e gênero, representando 36% das buscas. Outros 17% (7 pessoas) queriam a hormonização. Um total de 9% (4 atendidos) também apresentavam demanda por serviços de saúde mental. Outros 29% não informaram, de acordo com o relatório.

A maioria dos usuários são transexuais homens (12) e mulheres (13), representando 38% e 41% das situações, respectivamente. Três mulheres cisgênero também buscaram atendimento, sendo 9% dos casos, além de uma travesti (3%). Três (9%) pessoas não informaram a identidade de gênero.

Desses, 19 eram heterossexuais, 6 pansexuais, 3 bissexuais e uma lésbica. Lembrando que a orientação de gênero refere-se as características que o indivíduo se identifica, independentemente dos fatores biológicos. Portanto, um homem trans que se relaciona com mulheres é entendido como heterossexual.

A alteração de prenome e gênero no Registro Civil de Nascimento de pessoas trans é regulamentada desde 28 de junho de 2018, a partir do Provimento nº 73 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Com a normativa, pessoas transexuais e travestis podem realizar a alteração de prenome e gênero diretamente nos cartórios, apresentando uma série de documentos e sem a necessidade de um processo judicial.

Apesar de ser um direito, há cobranças de taxas cartoriais no processo de mudança de prenome e gênero para a emissão de certidões de protestos e averbação de certidão de nascimento. De acordo com o relatório do órgão municipal, muitas pessoas trans não têm condições financeiras de arcar com essas taxas cartoriais e procuram o Centro LGBT visando obter gratuidade. Isso é feito por meio de articulação com a Defensoria Pública do RN.

Maioria dos que buscaram atendimentos são jovens, escolarizados e que estão sem emprego

Nos três meses, 12 (38%) dos atendidos se reconhecem como pessoas brancas, 9 (28%) são pardos, 6 (19%) pretos e 2 são amarelos. Nenhuma das pessoas atendidas se reconhece como indígena e outras 3 não informaram cor ou raça.

Do total de atendidos, 21 (66%) tem idades entre 18 e 29 anos. Outros 5 (16%) pertencem a faixa etária de 30 a 59 anos e houve ainda 3 usuários (9%) entre 15 e 17 anos. Três pessoas não informaram a idade (9%).

Dez usuários tem ensino médio completo (32%), outros 7 (22%) tem ensino médio não concluído e 5  (16%) tem ensino superior completo. Nenhuma das pessoas que buscaram o centro entre outubro e dezembro do ano passado nunca frequentou a escola. Outros 3 tem ensino fundamental incompleto (9%) e duas tem tanto ensino médio como curso técnico concluídos (6%).

Mesmo assim, 18 deles e delas estão desempregados (56%) e outros 5 (16%) realizam trabalhos informais. Apenas 5 (16%) trabalham formalmente e 4 (12%) não informaram.

Do total de atendimentos, 13 (42%) são de pessoas residentes na Zona Norte de Natal. Outras 6 (18%) vieram da Zona Oeste, 5 (15%) da Zona Sula e 4 (12%) da Leste. Um dos usuários mora em Extremoz (3%) e outros 3 não informaram endereço.

Dos 32 atendidos, 4 (13%) apresentam algum tipo de deficiência, sendo um caso de surdez e outros 3 de transtorno ou doença mental.

O Centro LGBT de Natal foi inaugurado em 30 de setembro de 2020, e é formado por uma equipe técnica composta por assistentes sociais, psicólogas, estatista, duas coordenações, e apoio administrativo, que realiza serviços de atendimento psicossocial e o Observatório LGBT.

A criação do órgão faz parte de uma reivindicação histórica dos movimentos LGBT da capital potiguar, a partir do Conselho Municipal dos Direitos da População de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais de Natal. O serviço é previsto no Programa Nacional de Direitos Humanos (2009), através do fomento da criação de redes de proteção dos Direitos Humanos do segmento LGBT, especialmente a partir do apoio à implementação de Centros de Referência em Direitos Humanos e Combate à Homofobia.

Rose Serafim é repórter do Programa de Diversidade nas Redações realizado pela Énois – Laboratório de Jornalismo, com o apoio do Google News Initiative”.

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