Movimento de mulheres recomenda que CPI da Covid investigue falta de ações para a saúde feminina na pandemia
Natal, RN 19 de abr 2024

Movimento de mulheres recomenda que CPI da Covid investigue falta de ações para a saúde feminina na pandemia

5 de maio de 2021
Movimento de mulheres recomenda que CPI da Covid investigue falta de ações para a saúde feminina na pandemia

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Quem está acompanhando os trabalhados da CPI da Covid, iniciados no dia 27 de abril, no Senado Federal, certamente observou que a comissão é formada exclusivamente por homens. Isso ocorre porque os partidos não indicaram senadoras para nenhuma das 18 vagas (entre titulares e suplentes) na comissão.

Tendo em vista a falta de representação feminina na CPI que apura os procedimentos adotados e omissões do governo federal durante a pandemia de coronavirus, o Levante das Mulheres Brasileiras fez uma relatório com recomendações aos senadores que participam da investigação e também para as senadoras que conseguiram o direito de fazer perguntas aos convocados e convidados a prestar depoimento na Casa.

O Levante recomenda que os trabalhos da CPI considerem o peso da pandemia e do que denominam como necropolítica praticada pelo Estado contra a vida de mulheres. Para isso, senadores devem observar se foi cumprido o papel institucional de proteção às populações mais vulneráveis e execução plena dos serviços do SUS.

O relatório pede ainda que representantes de organizações de mulheres da sociedade civil organizada sejam convidadas para apresentar os resultados das pesquisas sobre os impactos da pandemia e da ausência de políticas públicas na vida e na saúde das mulheres.

As recomendações são feitas após apresentação de dados dos diversos efeitos da pandemia na vida de mulheres cis e trans do país, incluindo violência de gênero, aumento da jornada de trabalho e da taxa de mortalidade entre grávidas e puérperas.

Segundo o 14ª Anuário Brasileiro de Segurança Pública, houve alta de 1,9% nos feminicídios e de 3,8% nos chamados para atendimento de violência doméstica feitos ao 190 no primeiro semestre de 2020.

O documento do Levante traz informações do relatório da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) de janeiro de 2021, indicando aumento da violência e de assassinato de pessoas trans durante a pandemia. Dados da Antra também revelam que cerca de 70% da população de travestis e mulheres transexuais não conseguiram acesso às políticas emergenciais do Estado.

De acordo com dados apresentados no relatório do Levante, mais de 800 mortes maternas já ocorreram em decorrência da COVID-19 no Brasil. Segundo a Organização Pan-americana de Saúde, a taxa de letalidade de mulheres grávidas e puérperas por Covid-19 no Brasil é nove vezes maior que a média das Américas.

O Levante ainda lembra que são elas que compõem maioria da população brasileira, sendo 52,8% da população de acordo com o PNAD ( Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2019. Sendo também as mulheres que chefiam 90,3% das famílias no país.

"A falta de representação feminina que é um reflexo da nossa representação nos espaços de poder na sociedade como um todo", adianta a ativista Michele Galvão, membro do Levante. De acordo com a humanista, o relatório foi pensado antes da instalação da CPI. A ideia era cobrar o início da investigação e que os trabalhos também tratassem sobre o impacto da pandemia na saúde das mulheres e falta de políticas públicas voltadas a isso. Todavia, segundo Galvão, o movimento não imaginava que não fosse haver representação feminina na comissão.

"Imaginávamos que haveria pouca representatividade, mas não a total ausência de mulheres", explica.

"Queremos ser ouvidas na CPI a fim de que estes senadores, em sua maioria homens brancos, ricos e privilegiados, se sensibilizem com o sofrimento das mulheres brasileiras, negras, indígenas, quilombolas, ribeirinhas, pobres periféricas que, em nenhum momento neste "enfrentamento da pandemia" não foram consideradas em suas políticas", argumenta a ativista.

Bate-boca na CPI e concessão à bancada feminina

Mesmo sem vagas na comissão, a bancada feminina instituída no Senado Federal conseguiu um acordo que permite, em rodízio, que uma representante do grupo possa fazer perguntas aos convidados e convocados durante a investigação. Todavia, senadores governistas questionaram a concessão pois as mulheres acabam sendo as primeiras a falar, passando a frente dos titulares.

Mesmo com a concessão, as senadoras não poderão apresentar requerimentos nem votar, o que só é permitido aos integrantes da CPI.

Na manhã desta quarta-feira, 5, durante o depoimento do ex-ministro da saúde Nelson Teich, a participação feminina foi motivo de discussão entre os senadores. Assim que o senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da comissão, autorizou o início das perguntas, O senador Ciro Nogueira (PP-PI) questionou a concessão à bancada e interrompeu a pergunta da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA).

Nogueira alegou não ter havido acordo para que a representante da bancada feminina desse início as perguntas e o presidente da CPI precisou intervir, reafirmando o acordo estabelecido.

"Não é uma concessão porque elas são mulheres, é uma concessão porque elas têm uma representatividade igual à nossa”, disse Aziz durante a sessão. O senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, também reforçou que o acordo é uma compensação à falta de representação de mulheres na comissão. Contudo, a sessão precisou ser suspensa após o desentendimento.

A ativista Michele Galvão afirma que além de não terem representação, as mulheres estão sendo impedidas de falar na CPI. "Basta ver a misoginia como as mulheres que estavam presentes foram tratadas por dois deles, da tropa de choque do governo, trataram a senadora Eliziane Gama quando ela iria começar a falar. (...) Não tem nenhuma mulher naquele espaço. As que lá estão não terão direito a voto. E quando vão falar, são interrompidas", reclama Galvão.

De acordo com Michele, as recomendações feitas pelo Levante Popular das Mulheres Brasileiras, movimento composto por mais de 11 mil pessoas de todo o país, foi enviado a todos os integrantes da comissão na segunda-feira, 3, incluindo suplentes da CPI.

Atualmente, o Senado Federal tem apenas 12 das 81 cadeiras ocupadas por senadoras, o equivalente a cerca de 15% de representação.

O Levante Popular das Mulheres Brasileiras foi lançado em 14 de junho de 2020 como uma articulação suprapartidária que reúne diferentes organizações, movimentos, coletivos e ativistas individuais de todo o país. O movimento surgiu durante a pandemia e tem atividades virtuais que abrangem cerca de 157 organizações nacionais.

Rose Serafim é repórter do Programa de Diversidade nas Redações realizado pela Énois – Laboratório de Jornalismo, com o apoio do Google News Initiative”.

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