Quase 80% das mulheres mortas por arma de fogo no RN nos últimos 9 anos eram negras
Natal, RN 25 de abr 2024

Quase 80% das mulheres mortas por arma de fogo no RN nos últimos 9 anos eram negras

21 de agosto de 2021
Quase 80% das mulheres mortas por arma de fogo no RN nos últimos 9 anos eram negras

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Nos últimos 20 anos, a maioria das mortes de mulheres por agressão no Brasil tiveram a arma de fogo como principal meio empregado. Dentro desse representativo, recai sobre mulheres negras o maior número das agressões fatais com uso de revólver ou instrumento do tipo.

A estimativa foi feita pelo Instituto Sou da Paz que analisou a violência armada no Brasil, de 2012 a 2019, a partir dos dados da Saúde e com enfoque na participação da arma de fogo na violência letal e não letal contra mulheres no Brasil.

De acordo com o levantamento, em 2019, a arma de fogo esteve presente em 49% dos assassinatos de mulheres. O Nordeste é a região com maior predominância do meio letal, com 61% dos casos em 2019.

Imagem: O papel da arma de fogo na violência contra a mulher/ Instituto Sou da Paz

Negras jovens são maioria dos alvos

Segundo a base avaliada, mulheres negras são historicamente a maioria das vítimas letais de arma de fogo no país. Em 2019, de acordo com o relatório, esse percentual foi de 70,5%, uma taxa de mortalidade duas vezes maior que a de não negras. O perfil racial também predomina nos casos de morte por agressão com uso de armas, sendo 52% dos casos contra mulheres negras e 42% contra não negras.

Adultas jovens, de 20 a 29 anos, são maioria das vítimas de arma de fogo (33%), seguidas por mulheres de 30 a 39 anos, revela a estatística. Quando observada a distribuição por faixa segunda raça/cor, há predominância de morte de adolescentes (15 a 19) negras (68%), e de meninas de até 14 anos negras (47%). As mesmas faixas etárias, não negras são 52% e 22% das mortes, respectivamente.

A discrepância diminui entre adultas negras e não negras, mas volta a ser marcante nas mortes de mulheres idosas negras, estando a arma presente em 31% dos casos fatais. Entre idosas não negras, predominam agressões por arma branca (34%).

Dentro de casa

Tanto com homens quando com mulheres, as mortes por arma de fogo ocorrem majoritariamente na rua, indica a pesquisa. Contudo, quando observado o número de agressões fatais por arma dentro das residências, a diferença é muito maior entre os gêneros.

Dentro de casa, armas vitimam 11% dos homens. Enquanto isso, 1/4 das mulheres (26%) morre no ambiente doméstica vítima de tiro, indica o levantamento.

77% das mulheres mortas por arma de fogo no RN eram negras

Seguindo a proposta do levantamento feito pelo Instituto Sou da Paz, a agência Saiba Mais buscou dados sobre perfil de morte de mulheres por arma de fogo no estado potiguar entre 2012 e 2020. ­­­

Dados obtidos com o Observatório da Violência do Rio Grande do Norte mostram que nesse período houve 763 óbitos de mulheres por arma de fogo no RN. Dessas vítimas, 77% era mulheres negras, o equivalente a 586 casos.

As não negras representam 23% dos registros, um total de 172 mortes. Apenas cincos casos, dentro do período, tiveram raça/cor não registrados ou ignorados, representando 1% das ocorrências.

Em cinco anos, 64 feminicídios registrados

A Lei nº 13.104/15 entrou em vigor em março de 2015 e trata sobre o assassinato de mulheres pela condição de gênero. A Agência Câmara de Notícias destaca que a legislação considera feminicídio quando o assassinato envolve violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher da vítima.

Para isso, houve alteração do Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) que estabeleceu o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio. Também modificou a Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), para incluir o feminicídio na lista.

Com isso, o crime de homicídio simples tem pena de seis meses a 20 anos de prisão, e o de feminicídio, um homicídio qualificado, de 12 a 30 anos de prisão.

Segundo os dados fornecidos pelo OBVIO, 78% dos casos de mortes de mulheres por arma de fogo no RN foram registrados como homicídios dolosos, e 8% (64 óbitos), estão caracterizados como feminicídio, o que já é o segunda maior proporção, principalmente considerando que o tipo de crime só foi especificado há cinco anos e os dados contemplam os últimos 10 anos de registros.

2017 foi o ano com mais registros no Brasil e no RN

No intervalo entre 2012 e 2019, avaliado pelo relatório do Instituto Sou da Paz, 2017 consta como o ano com maior incidência de morte de mulheres por arma de fogo no país: 54%.

No Rio Grande do Norte, de acordo com os dados apresentados pelo OBVIO, o estado registrou 126 óbitos de mulheres por arma de fogo em 2017, o equivalente a 17% de todos casos do período de 2012 a 2020. Contudo, a tendência de queda acompanha os registros do país e, nos três anos seguintes, chegando a 62 registros em 2020, o menor valor registrado após 2012.

Armas nas mãos de cidadãos comuns e a proibição para agressores 

Na última quarta-feira, 18, o Senado aprovou por unanimidade, projeto de lei que proíbe a aquisição de arma de fogo por quem praticar violência contra mulher, idoso ou criança. A proposta também determina a perda da validade dos registros de armas já existentes em nome do agressor e prevê a apreensão imediata de armas de fogo na posse do agressor, mesmo que não tenham sido usadas na agressão.

O texto altera o Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826, de 2003) e segue para a Câmara dos Deputados. A medida já é prevista na Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 2006) que determina a suspensão da posse ou do porte de arma de fogo e a apreensão da arma como medidas protetivas de urgência.

Contudo, essa medida é restrita a situações ocorridas em ambiente doméstico e o novo projeto pretende ampliar a proibição após episódios de violência, independentemente do local da agressão.

O projeto cita o relatório do Instituto Sou da Paz como base de argumentação para mostrar que as armas de fogo são o principal instrumento utilizado na morte de mulheres.

Também foi publicado em julho os dados do 15º Anuário Brasileiro de Segurança Pública que utiliza dados do Sistema Nacional de Armas (Sinarm). De acordo com o relatório, mais da metade das armas de fogo do RN estão nas mãos de cidadãos comuns.

Havia 8.903 registros de arma de fogo no estado em 2017, valor que praticamente duplicou até 2020, quando foram registradas 16.791 mil peças. Dessas, 8.685 pertencem a cidadãos comuns, civis, e 1.838 de servidores públicos que têm porte por prerrogativa de função.

Saiba Mais: Metade das armas de fogo do Rio Grande do Norte estão nas mãos de cidadãos comuns

As demais armas são registradas por empresas de segurança privada, empresas comerciais, órgãos públicos, empresas com segurança orgânica, revendedores, fabricantes/importadores, caçadores de subsistência (apenas duas no estado) e “outras categorias”.

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