CIDADANIA

Apesar de lei federal proibindo despejos, famílias quilombolas têm casas destruídas no Pará

Em 8 de outubro, foi promulgada a lei federal nº 14.216/2021, que proíbe o despejo ou a desocupação de imóveis comerciais ou residenciais, privados ou públicos, até o fim de 2021, em razão da pandemia de covid-19. Mas uma semana depois, quatro famílias que vivem no território quilombola Sítio Conceição, em Barcarena (PA), foram despejadas e tiveram suas casas destruídas.

O projeto de lei – que teve autoria das deputadas Natália Bonavides (PT-RN) e Professora Rosa Neide (PT-MT) e do deputado André Janones (Avante-MG) – havia sido vetado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), em agosto, mas a decisão foi derrubada pelo Congresso em setembro.

As famílias de Barcarena estavam sob ameaça de despejo desde o dia 27 de setembro, quando a 1ª Vara Federal Cível e Empresarial da Comarca de Barcarena acatou um pedido de posse do território feito pela Prefeitura. Os moradores teriam, a partir de então, 48h para deixar o local. Nessa quinta-feira (14), Polícia Civil, Polícia Militar e representantes da Prefeitura forçaram a saída.

O Ministério Público Federal (MPF) enviou manifestação à Vara Cível e Empresarial, responsável pela ordem de despejo, pedindo sua imediata revogação e o envio do processo para a Justiça Federal, por se tratar de uma área quilombola reconhecida e em processo de titulação pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Nas redes sociais, Natália Bonavides chamou atenção para o caso: “Absurdo! A prefeitura de Barcarena (PA) expulsou e destruiu casas de quilombolas do Sítio Conceição, mesmo com as decisões suspendendo despejos e a área sendo reconhecida e em processo de titulação pelo INCRA. O MPF está pedindo imediata revogação. Que seja urgentemente revogado!”.

A ação viola a nova legislação federal, mas também norma estadual. Em 14 de janeiro foi sancionada pelo governador Helder Barbalho (MDB), a Lei Nº 9.212, que resguarda o direito à moradia durante a pandemia. Além disso, recentes decisões do Supremo Tribunal Federal determinaram a suspensão da tramitação de processos que tenham risco de reintegração de posse de comunidades quilombolas – que faz parte da Arguição de Descumprimento Fundamental (ADPF) 742 – e processos com ordens ou medidas judiciais de desocupação de áreas urbanas e rurais habitadas antes da pandemia da covid-19, ementa cautelar da ADPF 828.

A Prefeitura de Barcarena emitiu nota alegando que as famílias, na verdade, não residem no lugar. A uma área pertencente à Administração Pública e abriga uma Estação de Tratamento de Esgoto.

“A ETE, que será reativada pela atual gestão, está sendo reclamada por um grupo de pessoas que não habitam o local, portanto nenhuma família foi removida, uma vez que no terreno não há habitações”, justificou.

De acordo com a Prefeitura, uma estrutura de alvenaria foi construída para bloquear o acesso das máquinas e trabalhadores ao local, por isso foi removida, para garantir a continuação do projeto de extensão da rede de saneamento básico.

A disputa pela área é antiga. Localizado em uma região agora urbana, o Quilombo Sítio Conceição é visado para especulação imobiliária.

Os quilombolas já foram expropriados da terra na década de 1980, em um processo de urbanização. Com o conhecimento do direito ao território tradicional, as famílias voltaram ao local em 2008. Um ano depois, foram novamente despejadas, mas retornaram em poucos meses, após acordo judicial.

RN
O Rio Grande do Norte também possui lei estadual contra os despejos. A governadora Fátima Bezerra (PT) sancionou a lei Nº 11.000, de 29 de setembro de 2021, que suspende o cumprimento de mandados de reintegração de posse; despejos e remoções judiciais ou extrajudiciais; cobranças de multas contratuais e juros de mora em casos de não pagamento do aluguel, prestação de quitação do imóvel residencial e da taxa condominial, enquanto medida temporária durante a pandemia de covid-19.
O texto, de autoria do deputado Ubaldo Fernandes (PL), também dialoga com o movimento nacional Despejo Zero e foi subscrita pelos parlamentares petistas Isolda Dantas e Francisco do PT.

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Isabela Santos é jornalista e repórter da agência Saiba Mais