Em um vídeo que circula nas redes sociais, a professora das redes estadual e municipal de ensino, Rayane Valentim, ironiza a dificuldade do prefeito de Natal, Álvaro Dias (PSDB), em pagar o reajuste de 2020 aos professores da rede pública de ensino depois de ter concedido aumento a si mesmo, a secretários, adjuntos e auxiliares por meio de “jetons indenizatórios” . Os jetons são uma espécie de indenização paga ao funcionário público por participação em atividades de deliberação coletiva que extrapolariam suas funções, de acordo com a justificativa apresentada pela Prefeitura de Natal.
Com os jetons, Álvaro Dias passou a ter o segundo maior salário entre todos os 26 administradores de capitais de Estado de todo o Brasil. Desde janeiro deste ano, quando começou a receber o reajuste de 60% que ele se auto presenteou no dia 23 de dezembro de 2021 (véspera de Natal), o prefeito de Natal passou de um salário de R$ 20.000,00 para R$ 32 mil reais brutos mensais. Além dele, oito titulares de órgãos municipais tiveram aumento de 60% em cima do valor da remuneração, assim como 12 secretários, além de 23 secretários adjuntos, que também foram beneficiados com o reajuste na remuneração, mas cujo valor chegou a ser de 100% sobre o salário.
A professora Rayane também aponta falta de conhecimento de alguns parlamentares ao se posicionarem sobre assuntos ligados ao tema da educação na Câmara Municipal de Natal, como no caso da sessão realizada no último dia 06 deste mês, quando o vereador Aroldo Alves (PSDB) criticou os professores ao comentar a derrubada do veto do prefeito de Natal à implantação do reajuste do ano de 2020. A secretaria de Educação do município havia implantado no início deste ano apenas 6,42% dos 12,84% aos quais os professores têm direito. Com a queda do veto do prefeito, os 6,42% restantes passarão a ser pagos a partir de junho.
“Minha maior revolta é que eles não estudam, não sabem das questões educacionais, reforçam a visão negativa da sociedade sobre os professores e falam como se fosse uma generosidade deles conceder o reajuste do piso. Eu comprei folhas, levei material na porta dos alunos, que podem até comprovar o que estou dizendo. É complicado um parlamentar ir a público e dizer esse tipo de coisa”, avalia Rayane Valentim, ao falar com a agência Saiba Mais por telefone manhã desta sexta (08).
Com três especializações e um mestrado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), além de um doutorado em andamento pelo Instituto federal do Rio Grande do Norte (IFRN), Rayane desafia vereadores e secretários a trocarem de rotina por um mês, recebendo o salário pago aos professores.
“Poderia trocar de rotina por um mês! Seja na secretaria de Educação ou na Câmara Municipal, eles não enfrentam esses momentos de falta de falta de merenda, por exemplo. Além disso, aposto que minha graduação é maior do que qualquer um ali! Tive que botar na justiça para o município reconhecer as especializações, mas ainda falta o mestrado, que continua lá esperando. Sou professora nível A, mas não adianta ser um bom profissional, porque o município não reconhece. Na minha escola falta merenda, gás, papel e até papel higiênico. Nós que juntamos o açúcar e o café! As escolas estão paradas não apenas pela greve, mas também pela falta de condições de trabalho”, desabafa a professora que no vídeo que circula nas redes sociais, faz um breve cálculo:
“O meu salário, vereador, não corresponde a 12% do seu salário! Tenha cuidado com o que o senhor fala, é preciso estudar o que se diz, principalmente, para ocupar a cadeira que o senhor ocupa e pra ganhar o dinheiro que o senhor ganha!”, comenta se referir ao discurso do vereador Aroldo Alves (PSDB), que criticou a categoria.
Os professores da rede municipal de Natal estão em greve desde o dia 28 de março por causa da falta de acordo na negociação do reajuste de 33,24% referente ao piso nacional de 2022, anunciado pelo governo federal no mês de janeiro. Apenas no fim de março a Secretaria Municipal de Educação de Natal fechou um acordo com a direção do Sindicato dos professores (Sinte/RN) quanto aos 6,42% restantes da atualização do piso de 12,84% referente ao ano de 2020.
“A prefeitura [de Natal] faz propaganda dizendo que paga melhor do que o Estado, mas não é verdade. Recebo muito melhor pelo Estado do que pelo município. Eles divulgam isso como se fôssemos militantes, mas não é sobre partidos, é sobre realidades, sobre a situação de calamidade!”, denuncia a professora.
Confira os vídeos:
Rayane Valentim é professora na Escola Municipal José de Andrade Frazão, na avenida Boa Sorte, no bairro de Nossa Senhora da Apresentação, na Comunidade do Vale Dourado. Ela também alerta para a falta de concurso e aumento de professores celetistas, que não concursados, mas contratados temporariamente por meio da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas).
“Não querem concurso para ter mais professores temporários, dependentes deles. Durante a greve, chegou a haver ameaças e a produção de um documento intimidando os professores celetistas”, denuncia.
Na tarde de hoje, os professores anunciaram a realização de um protesto, a partir das 15h, na calçada do shopping Midway Mall, para denunciar a má qualidade da merenda oferecida na capital.