Os pescadores que trabalham com pesca artesanal e ficam alocados no Canto do Mangue, no bairro das Rocas, em Natal (RN), denunciaram estar recebendo pressão da Prefeitura de Natal para que deixem o local para a realização de obras de urbanização e reestruturação. O relato foi feito nesta quinta (09) ao grupo formado por representantes de diversos setores de todo o país que está em Natal para uma missão-denúncia de averiguação de violações de direitos relacionados ao contexto da falta de moradia e ameaças de despejo.
A área portuária do Canto do Mangue acolhe, aproximadamente, 800 pescadores, envolvendo 200 barcos e 40 canoas. A Colônia de Pescadores Z4, instalada no local, foi fundada em 1922 para atuar na garantia dos direitos dos pescadores e pescadoras da pesca de praias, estuarinas e rios. Mas, atualmente, a Colônia está cercada por tapumes e dois portões colocados pela prefeitura de Natal e pela Superintendência do Patrimônio da União, por causa de obras de urbanização que estão sendo realizadas na região.


Os pescadores argumentam que a sede da Colônia Z4 é um local simbólico para a cultura da pesca artesanal na cidade. A sede foi construída pelos próprios pescadores e pescadoras depois de receber autorização de uso da área nos anos de 1920. A produção da pesca artesanal é responsável pela segurança alimentar das populações litorâneas, por dinamizar economias locais e manter o equilíbrio ambiental, paisagístico e cultural da orla. Mas, apesar de sua importância, a pesca artesanal vem sendo ameaçada pelo processo de uso e ocupação do espaço litorâneo, com a expansão de grandes empreendimentos econômicos, com destaque para a atividade do turismo.
Segundo a Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes (Seharpe), o isolamento é necessário para evitar novas ocupações irregulares no local enquanto é dado andamento às obras de urbanização e reestruturação. De acordo com a Seharpe, o projeto prevê que a nova sede da Colônia seja construída num terreno doado pela União localizado quase em frente ao Museu da Rampa, no entanto, a obra deve ser paga não pela prefeitura de Natal, mas pela própria Colônia de Pescadores que, para isso, deve receber uma indenização pela desocupação do local.
Além do Canto do Mangue, o grupo também visitou o bairro de Brasília Teimosa e a área do Viaduto do Baldo. Todas as questões levantadas durantes as visitas serão discutidas em audiência pública que será realizada na tarde de hoje, a partir das 14h, no Auditório da Cecafes (Central de Comercialização da Agricultura Familiar e Economia Solidária), localizada Rua Jaguarari, na esquina com a Avenida Capitão-Mor Gouveia.


Enxu Queimado

No primeiro dia de visitas, na última quarta (08), o grupo de monitoramento foi à Comunidade de Enxu Queimado, no município de Pedra Grande, onde recebeu denúncias de avanço das empresas de energia eólica sobre os terrenos da região.
“Há uma grande especulação imobiliária hoje em Enxu Queimado, uma violação dos direitos de nossos povos tradicionais”, comentou Hélio Souza, que mora na Comunidade de Diogo Lopes, na Ponta do Tubarão, e faz parte da pastoral dos Pescadores.
“A dor de uma qualquer comunidade é a mesma da minha, só muda o endereço. Nós, da comunidade, estamos sendo despejados por causa desses parques eólicos. Repudio a atitude dos governos e estou decepcionada com a nossa governadora por assinar e liberar a instalação desse parque off shore [no mar]. O que vai ser de nós? Como vai ser o sustento da nossa família? Estou com o coração bastante magoado”, lamenta Rita de Cássia, pescadora artesanal que faz parte da Colônia Z9, do município de Macau.
“Fizemos o levantamento para ver o tamanho da situação com o pessoal da universidade, junto com os promotores e advogados da cidade, para ver a situação da posse de terras”, revela Beto, que mora em Ponta Negra e faz parte do movimento de pescadores (as) artesanais.
De acordo com levantamento feito pelo grupo, houve no interior um agravamento dos conflitos envolvendo comunidades tradicionais da pesca artesanal, resultante da pressão imobiliária, da atividade turística na região, além dos impactos gerados pelas implantações de usinas eólicas no litoral norte do estado. Nessas áreas, os casos de ameaças de despejo se estenderam ao período da pandemia, registando-se cerca de 1.702 famílias ameaçadas de remoção no RN.