Senado transfere fiscalização sanitária de alimentos para empresários do agronegócio
Natal, RN 20 de abr 2024

Senado transfere fiscalização sanitária de alimentos para empresários do agronegócio

24 de junho de 2022
5min
Senado transfere fiscalização sanitária de alimentos para empresários do agronegócio

Ajude o Portal Saiba Mais a continuar produzindo jornalismo independente! Apoie com qualquer valor e faça parte dessa iniciativa.

Quero Apoiar

Sem precisar passar pelo plenário, os senadores da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) aprovaram nesta quinta (23) o Projeto de Lei (PL) 1.293/2021, que transfere do governo federal para os empresários do agronegócio, a fiscalização sanitária sobre alimentos. Ou seja, os empresários farão a autofiscalização de seus próprios produtos.

A lei permite a aprovação automática de registro para produtos que têm padrões normatizados e prevê a contratação de especialistas da iniciativa privada para avaliar os casos. A medida acaba beneficiando grandes empresários do agronegócio e foi apelidada por ambientalistas de “boiadinha”, numa referência ao ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que numa reunião com autoridades defendeu que era preciso aproveitar que a atenção da mídia estava voltada para a covid-19 para “passar a boiada” e afrouxar regras de controle ambiental.

O senador pelo Rio Grande do Norte Jean Paul Prates (PT), que votou contra o projeto, alerta que a terceirização da fiscalização será um risco para a saúde pública.

Jean Paul I Foto: Alessandro Dantas

Não fica claro como será feita a auditoria desses trabalhos e quais as punições caso eles não sejam realizados a contento. Demos mais um passo atrás nesse governo que não gosta de assumir o seu papel como agente fiscalizador e que, ao invés de estruturar e investir no aparelho de fiscalização do estado, prefere criar um simulacro dele por meio desta terceirização à iniciativa privada", critica o senador potiguar.

A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária é formada por 34 senadores, sendo a maioria da bancada ruralista. Com a mudança, a fiscalização na manipulação de alimentos, como a carne em frigoríficos, por exemplo, ficará apenas com o setor privado. São alimentos  nos quais há adição de produtos químicos como hormônios, antimicrobiano e antiparasitários, que deixam resíduos nas carnes, ovos e leite. Além disso, o Estado abre mão de analisar se a carne tem doenças como a brucelose ou a tuberculose.

O PL 1.293/2021 é de autoria do próprio governo federal, que como justificativa, alega ter dificuldades financeiras para fazer a fiscalização.

Zenaide Maia I Foto: cedida

Se o governo não tem ‘pernas’ para fiscalizar, o que a gente precisa é aumentar a capacidade técnica dos órgãos, aumentar o número de veterinários para poderem auditar e também fiscalizar, gente! Não é obrigado isso ser passado para o agronegócio! Essa responsabilidade tem que ficar com o Estado brasileiro mesmo, como já era. Então, aumentar a capacidade técnica dos órgãos de fiscalização e controle, e não passar essa responsabilidade para o agronegócio”, opinou a senadora potiguar Zenaide Maia (PROS), que participa da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, porém como suplente.

O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (ANFFA) se manifestou e disse já estar em contato com senadores contrários ao projeto para que entrem com recurso para levá-lo à apreciação no plenário.

"É uma porta aberta para a terceirização de nossas atividades. É no mínimo um avanço sobre as competências das carreiras que compõem o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, para não falar em usurpação. Somos os últimos guardiões do consumidor brasileiro. Se abruptamente formos retirados de uma planta frigorífica, por exemplo, isso deixa o consumidor muito indefeso. Precisaríamos de, no mínimo, uma década de transição para chegar a esse modelo", avalia Janus Pablo, presidente do ANFFA.

Fiscalização estatal continua apenas para exportações

Apesar da fiscalização do governo ter sido delegada ao agronegócio dentro do Brasil, os produtos vendidos para fora do país vão continuar passando pela fiscalização estatal. Essa diferença de tratamento entre o consumidor brasileiro e estrangeiro, na visão de Zenaide, que também votou contra o projeto, não se justifica.

É um risco grande tirar essa competência. Agora, o povo brasileiro é quem tem que ficar de olho nos seus frigoríficos, onde compra carne, porque ali, com certeza, não vai ter a presença da vigilância sanitária. Agora, para exportar, vai ter, porque foi o que me foi dito aqui por quem defende esse projeto”, alertou Zenaide.

As mais quentes do dia

Apoiar Saiba Mais

Pra quem deseja ajudar a fortalecer o debate público

QR Code

Ajude-nos a continuar produzindo jornalismo independente! Apoie com qualquer valor e faça parte dessa iniciativa.

Quero Apoiar

Este site utiliza cookies e solicita seus dados pessoais para melhorar sua experiência de navegação.