CIDADANIA

Jaguaribe: estação de tratamento soterra mangue e rio na Zona Norte de Natal

Por Isabela Santos e Mirella Lopes

A Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Jaguaribe, em obras desde 2016 e que pretende atender a toda a zona norte de Natal, não suportou as fortes chuvas e entrou em colapso na última semana. Mangue e rio afluente do Potengi foram soterrados, preocupando moradores e ambientalistas.

De acordo com a Caern, o local possui uma tubulação de drenagem provisória; o volume de terra que aparece nas imagens divulgadas é natural da movimentação da obra e a companhia realizou contenções evitando o carreamento de mais material.

No entanto, a Caern confirma que na semana passada um trecho do muro caiu com a força das chuvas e precisou ser refeito. Outro muro, junto de uma rua projetada pela Prefeitura, ainda será reconstruído. Também informa que está sendo realizada a limpeza do excesso de barro.

Já o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema) comunicou em nota que foi realizada vistoria técnica no local com o auxílio de drone para captar imagens áreas e dimensionar o fato. “Não há indicativo da utilização de produtos químicos ou vazamento de esgoto tratado. O que os técnicos do Idema verificaram foi o carreamento de material argiloso no local da obra e no espaço da rua de acesso”, assina o Instituto.

Danos ambientais

Com lama ou dejetos, o efeito do aterramento da área é o mesmo: “o mangue vai morrer”, atesta o professor e pesquisador da UFC Alex Ferreira. Doutor em Ecologia Aquática, ele mora em Natal, integra a ONG Gamboa do Jaguaribe e participou de projetos de restauração do espaço entre 2004 e 2007.

Ferreira destaca que os manguezais são ecossistemas muito importantes e agem como berçários de inúmeras espécies: “Eles têm uma capacidade três vezes maior que a floresta tropical de absorver dióxido de carbono em biomassa e no solo através da fotossíntese. Dióxido de carbono é um dos gases que está ocasionando o efeito estufa e as mudança climáticas. Então, cada árvore de mangue destruída é um tiro no pé para a minimização do impacto da mudança climática e para a sobrevivência da humanidade”, detalha o especialista, concluindo tratar-se de um paradoxo o que aconteceu no Jaguaribe.

“A própria mudança climática que provoca essas chuvas torrenciais e ocasionou a ruptura da estrutura da ETE pode ser minimizada pelos manguezais que a Caern destrói. Falta de conhecimento? Destruição proposital? Avisos não faltaram”, provoca.

O pesquisador segue alertando que o dano se multiplica no Rio Potengi com sucessivos erros. Primeiro foi a construção irregular de viveiros para a criação de camarões, em 2002. Depois foi a morte de cerca de 40 toneladas de peixes, crustáceos, moluscos e outros organismos nas margens do estuário, em 2007, causados por uma empresa que lançou efluentes não tratados.

“Você mata o mangue aqui, você mata o mangue ali, provoca a poluição do rio, arranca mangue acolá. O efeito é acumulativo. Futuramente isso pode ocasionar um grande dano ambiental, com colapso da capacidade do rio de se autorregular, de manter as suas espécies vivas”.

Movimento Mangue Vivo e parceiros como ONGs Gamboa Jaguaribe, ASPOAN, SOS Mangue, ONG Baoba, Rede Eusoudoamor e da articulação #RedeMangueMar e independentes se mobilizam para chamar atenção das autoridades para o fato.

“É uma tragédia anunciada”, continua Alex Ferreira. “A gente quer que a Caern recupere o mangue destruído e indenize os pescadores e as famílias que sofrem com a falta de peixe por causa do prejuízo que a ETE está ocasionando. Eu particularmente penso que a Caern deveria parar essa obra”.

 

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