Empreendimento de energia solar em Assu pretende ocupar mais de 2.500 hectares de Caatinga
Uma empresa catarinense de energia solar pretende criar na região Oeste do Rio Grande do Norte o Conjunto Fotovoltaico Assú (CF Assú), um empreendimento composto por 19 centrais fotovoltaicas abrangendo 2.523,76 hectares de Caatinga, único bioma brasileiro e um dos mais ameaçados do planeta. A área é localizada na zona rural do município de Assu, nas proximidades do km 99 da BR-304. O pedido de licença ambiental está sendo analisado pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema).
A potência nominal a ser gerada é de 842,68 MW. Para o Ato Declaratório Ambiental (ADA), é considerada a área de 2.219,8392 hectares, pois já foram excluídas as áreas de reserva legal e benfeitorias que se encontram dentro das matrículas, explica o Idema. Os 357,4759 ha restantes estão representados por áreas com elevado grau de ação do ser humano (antropização), como vegetação herbácea-subarbustiva, solo desnudo e/ou cultivos agrícolas, não apresentando rendimento lenhoso nativo significativo.
De acordo com o setor Florestal do Idema, se for identificada sobreposição em reserva legal ou em alguma zona de amortecimento de unidade de conservação, esse número cairá. Além disso, como a caatinga não tem lei própria, o Instituto segue o Código Florestal.
A área em que a vegetação deve ser suprimida é de 1.862,3633 hectares, mas o meio biótico é impactado em uma campo maior, de até 2 mil metros, contados a partir dos limites do empreendimento.
Doutor em Ecologia, João Damasceno alerta que a área é importante para a preservação do bioma. Além disso, contribui para reter gás carbônico, desafio para conter o aquecimento global.
“A área suprimida corresponde a cerca de 23% das áreas naturais desmatadas no estado em 2021, segundo o levantamento do Mapbiomas. E, embora a supressão de áreas de caatinga no estado esteja regulamentada pelo Novo Código Florestal, a supressão de áreas naturais para estabelecimento de empreendimentos impede a retenção de gás carbônico presente na atmosfera pelas plantas, o que dificulta o combate ao aquecimento global no planeta”, diz o especialista, ao apontar alternativas.
“A solução poderia ser simples: utilizar áreas já degradadas, tetos de residências ou ainda a criação de programas de restauração ou implementação de unidades de conservação com área similar a área impactada por esses empreendimentos”.
Biodiversidade
A região afetada possui 110 espécies da flora, das quais quatro estão ameaçadas: pau-d`arco ou ipê-roxo (Handroanthus impetiginosus), pelo (Tacinga subcylindrica), umburana-de-cheiro (Amburana cearensis) e sabiá (Mimosa caesalpiniifolia).
Outras 20 espécies presentes no espaço são exclusivas do bioma, entre elas pau-branco (Cordia oncocalyx), macambira (Bromelia laciniosa), faveleira (Cnidoscolus quercifolius), rompe-gibão (Erythroxylum pungens), brinco-de-sauim (Pithecellobium diversifolium) e buquê-de-noiva (Varronia leucocephala).
Há ainda 11 espécies de mamíferos terrestres, o que corresponde a apenas 17% das espécies esperadas para a região. Entre os registros, uma se destaca por ser considerada ameaçada de extinção: gato-do-mato (Leopardus tigrinus).
Três encontradas lá são genuinamente brasileiras: preá (Galea spixii), sagui (Callithrix jacchus) e rabudo (Thrichomys laurentiu). E uma é endêmica da região, ou seja, própria do local: cutia (Dasyprocta prymnolopha).
Cento e três espécies de aves foram registradas durante atividades de campo na região, o que representa 26,3% das espécies com ocorrência para o Rio Grande do Norte. Nenhuma delas está ameaçada de extinção.
As informações são do Relatório de Impacto Ambiental (Rima) contratado pela empresa proponente. A realização é da Prima Ambiental, de acordo com as diretrizes do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema). O documento conclui que “o projeto se apresenta bem concebido em termos técnicos, econômicos e ambientais, bem como atende às condicionantes legais para sua instalação na área pleiteada, sendo considerada viável a sua implantação e operação”.
Ao todo foram identificados vinte e dois impactos ambientais, mas o relatório considera que diversificar a matriz energética nacional tem benefícios que são mais relevantes, na medida em que “permite a geração de energia limpa e renovável”.
O Rima descreve os impactos e sugere medidas de controle, tais como instalação de drenagem pluvial, construção de sistema de tratamento para efluentes se necessário, reposição florestal e compensação ambiental, além de executar programas de recuperação de áreas degradadas, de controle da supressão vegetal, de controle e monitoramento de processos erosivos e dos sistemas de drenagem e de educação ambiental com os trabalhadores da obra.
Durante a implantação do empreendimento, estima-se que sejam gerados 2 mil empregos diretos, distribuídos ao longo dos meses desse trabalho. Os relatórios da empresa também destacam como vantagem para o local, a arrecadação de impostos e tributos.