“O isolamento político de Bolsonaro se amplia cada vez mais.” Entrevista com o cientista social João Emanuel Evangelista
Natal, RN 28 de mar 2024

“O isolamento político de Bolsonaro se amplia cada vez mais.” Entrevista com o cientista social João Emanuel Evangelista

7 de agosto de 2022
20min
“O isolamento político de Bolsonaro se amplia cada vez mais.” Entrevista com o cientista social João Emanuel Evangelista

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O lançamento da candidatura à reeleição de Jair Bolsonaro (PL), no último dia 25 de julho, no Rio de Janeiro, foi marcado pela repetição das falas golpistas do presidente da República. No evento, o chefe do Executivo mais uma vez se colocou contra as urnas eletrônicas, contra o Supremo Tribunal Federal e conclamou os seguidores a irem às ruas no Sete de Setembro.

Em entrevista à Agência Saiba Mais, o cientista social João Emanuel Evangelista, professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) avalia que “o isolamento político de Bolsonaro se amplia cada vez mais, tanto em relação às forças políticas e sociais constitutivas da sociedade brasileira, bem como em relação à comunidade internacional”.

Para ele, além das tradicionais organizações democráticas e populares da sociedade civil brasileira - como as representações do movimento sindical e dos movimentos populares, há inúmeras personalidades do mundo jurídico, da cultura e do chamado “mercado”, como a FEBRABAN e a FIERN, em apoio à defesa do Estado Democrático de Direito e do sistema eleitoral e das urnas eletrônicas.

E um elemento decisivo para o isolamento da candidatura Bolsonaro, segundo Evangelista, “foi a estratégia adotada pelo presidente Lula em reunir uma frente ampla de forças políticas e sociais em defesa da democracia e contra o fascismo”.

Leia entrevista na íntegra.

No lançamento da candidatura, Jair Bolsonaro voltou a colocar em dúvida as urnas eletrônicas e atacar o STF, e afirmou que "todo mundo" vai para as ruas no dia 7 de setembro, num sentido de pressão às instituições. Esse golpismo explícito vem sendo reiterado todo dia, inclusive nesses eventos oficiais. Ele vai dar o golpe? Está na hora de pararmos de fingir que não vai acontecer nada?

Os militares e as Forças Armadas foram responsáveis por muitas experiências autoritárias ao longo da história brasileira.

A tutela militar sobre a vida política é um dos grandes obstáculos à existência de uma democracia consolidada no Brasil.

 Essa tutela, inclusive foi reiterada e introduzida de contrabando com o artigo 142 da Constituição de 1988. Esse fato é muito ilustrativo das limitações da implantação e da consolidação da democracia no Brasil na transição limitada e conservadora que a sociedade brasileira experimentou depois da ditadura militar de 1964.

As Forças Armadas, todavia, não podem intervir no processo político sem o apoio das classes dominantes brasileiras e sem o apoio, principalmente, dos Estados Unidos, que exercem sua hegemonia na América Latina e em escala global.

Os golpes políticos realizados pelos militares contra a democracia sempre aconteceram com a concordância e a participação ativa desses atores políticos internos e externos, que atuam sempre de forma coordenada.

Os exemplos mais recentes disso foram o golpe militar, que derrubou o governo de João Goulart em 1964, e a operação organizada para impedir a continuidade dos governos liderados pelo PT, que culminaram no impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, e os processos judiciais forjados para resultarem na prisão e na impugnação da candidatura do presidente Lula em 2018. No primeiro caso, os militares assumiram o protagonismo do golpe político; no segundo, os militares pressionaram o poder judiciário para impedir a candidatura do presidente Lula e favorecer eleitoralmente o candidato da extrema-direita. Duas formas diferentes de exercício da tutela militar sobre o poder civil no Brasil.

Apesar do envolvimento de alguns generais de alta patente, sobretudo os que ocupam cargos ministeriais, no projeto golpista de questionar a lisura das eleições e as acusações infundadas e irresponsáveis sobre supostas “fraudes” das urnas eletrônicas, é cada vez mais visível o isolamento político do governo Bolsonaro e sua candidatura à reeleição.

A repercussão negativa dessas ameaças golpistas e a abrangência e a intensidade da reação dos mais diferentes segmentos da sociedade civil brasileira em defesa do sistema eleitoral e da democracia no Brasil podem ser consideradas como uma indicação muito positiva sobre a superação das incertezas que pairavam nos últimos meses sobre o futuro político imediato da democracia em nosso país.

Depois da reunião de Bolsonaro com os embaixadores estrangeiros e da convenção do lançamento da sua candidatura, felizmente houve uma impressionante convergência de manifestações públicas contrárias às pretensões golpistas. Com uma razoável margem de segurança, podemos dizer que, hoje, o projeto político de extrema-direita de Bolsonaro está sofrendo um processo de crescente isolamento nas variadas classes sociais e nos diversos segmentos da sociedade brasileira.

A defesa da democracia e do sistema eleitoral brasileiro tem mobilizado um amplo leque de forças políticas e sociais.

 São muitas as manifestações públicas contra as reiteradas ameaças golpistas, que contam com a participação de segmentos importantes que deram, inclusive, sustentação política e eleitoral à eleição e ao governo de Bolsonaro.

Além das tradicionais organizações democráticas e populares da sociedade civil brasileira - como as representações do movimento sindical e dos movimentos populares, há inúmeras personalidades do mundo jurídico e da cultura - como grandes intelectuais e artistas, e muitas celebridades das redes sociais que se posicionaram em favor da democracia e do sistema eleitoral.

Os principais grupos de mídia – o grupo Globo, a Folha de S. Paulo e o Estado de São Paulo – publicaram editoriais criticando e condenando as ameaças golpistas e fazendo a defesa da democracia e da necessidade do respeito às instituições que formam o sistema eleitoral no Brasil.

Um ponto de destaque são as manifestações públicas dos representantes de algumas das mais importantes organizações e os intelectuais orgânicos do chamado “mercado”, como a FEBRABAN e a FIERN, em apoio à defesa do Estado Democrático de Direito e do sistema eleitoral e das urnas eletrônicas contra as descabidas ameaças de Bolsonaro e seus ministros às instituições da justiça brasileira, representadas pelo STF e pelo TSE, e à Constituição.

Recentemente, vieram também a público representações da Polícia Federal, da ABIN e do TCU para defenderam a integridade das urnas eletrônicas e a lisura do nosso sistema eleitoral.

Há poucos dias, a embaixada norte-americana e um porta-voz do Departamento de Estado do governo norte-americano manifestaram sua confiança no sistema eleitoral brasileiro em contraposição ao pronunciamento de Bolsonaro na reunião com os embaixadores para criticar o sistema eleitoral brasileiro.

De forma mais explícita, o Secretário de Defesa General Lloyd Austin, durante a 15º Conferência de Ministros da Defesa das Américas, realizada em Brasília nos dias 26 e 27 de julho, afirmou que os países americanos tem compromisso com o Estado Democrático de Direito e com a democracia e que militares devem ser controlados pelo poder civil, manifestando sua discordância em relação às ameaças golpistas do governo Bolsonaro, salientando que sua expectativa é que os militares brasileiros respeitarão o resultado das eleições presidenciais.

Depois de atuar como linha de frente do bolsarismo nas críticas ao TSE e às urnas eletrônicas, o general Paulo Sérgio de Nogueira, ministro da Defesa do governo Bolsonaro, a contragosto teve que assinar a “Declaração de Brasília” em apoio à “Carta Democrática Interamericana”, em conjunto com outros países da América Latina.

Apesar de algum crescimento eleitoral da extrema-direita na Europa, com a derrota de Trump nas eleições presidenciais norte-americanas o bolsonarismo não possui apoios substantivos na comunidade internacional.

O isolamento político de Bolsonaro se amplia cada vez mais, tanto em relação às forças políticas e sociais constitutivas da sociedade brasileira, bem como em relação à comunidade internacional.

Um elemento decisivo para o isolamento da candidatura Bolsonaro foi a estratégia adotada pelo presidente Lula em reunir uma frente ampla de forças políticas e sociais em defesa da democracia e contra o fascismo. A constituição da sua candidatura a presidente da República, tendo como vice-presidente o ex-governador Geraldo Alkmin, foi muito importante para selar uma aliança política com a participação de lideranças e partidos do centro e da centro-direita no espectro ideológico da sociedade brasileira. Com isso, temos um quadro para entender o atual processo de desgaste e isolamento político-eleitoral de Bolsonaro.

Além do Lira, estavam lá outras figuras, como o Marco Feliciano, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro... Quem apoia Bolsonaro?

A eleição de Bolsonaro foi o resultado não desejado pelas classes dominantes brasileiras na sua luta para restaurar o neoliberalismo e impedir a continuidade dos governos liderados pelo PT e suas políticas públicas que melhoraram a vida da maioria dos brasileiros e das brasileiras, são os trabalhadores, os desempregados e as populações pobres que vivem a realidade da miséria, da fome e da exclusão social.

Desde o primeiro governo do presidente Lula, montou-se uma operação de guerra para destruir a esquerda no Brasil, com o envolvimento direto de setores do empresariado, das grandes empresas de mídia, de parlamentares conservadores e de segmentos do poder judiciário, com a incorporação crescente das chamadas classes médias. Houve uma campanha massiva e ininterrupta para associar a corrupção e os governos e os políticos do PT e da esquerda brasileira.

Os governos do PT na presidência da República trouxeram crescimento econômico, aumento do trabalho de carteira assinada, distribuição de renda, aumento do poder de compra das classes populares e a implementação de muitas novas políticas públicas que ampliaram o acesso a muitos serviços públicos para a maioria da população. Isso neutralizou momentaneamente as ações das forças liberais e conservadoras contra os governos progressistas da esquerda.

O presidente Lula foi reeleito em 2006 e terminou seu segundo governo com impressionante aprovação popular.

A popularidade e liderança política de Lula foram o principal suporte para a eleição da presidente Dilma Rousseff em 2010 e também para sua reeleição em 2014, num contexto político, econômico e social muito problemático para a continuidade dos governos progressistas.

Como diz a sabedoria popular, “a água mole em pedra dura tanto bate até que fura.” As forças liberais e conservadoras, além de manter a propaganda de guerra diariamente em todas as formas de mídia contra os governos do PT, voltaram à carga total. Na chamada “Operação Lava Jato”, com a participação ativa de órgãos do governo dos Estados Unidos, organizaram uma operação para destruir as lideranças petistas e o legado dos governos liderados pelo PT, recorrendo-se ao uso político-eleitoral da lei e das instituições do poder judiciário.

As “apurações” dessa ação policial-judiciária, hoje desmascarada junto à sociedade brasileira e à comunidade internacional, municiaram ainda mais a campanha publicitária movida pela mídia conservadora brasileira. Para o êxito do projeto das forças liberais e conservadoras faltava o povo nas ruas protestando contra os governos do PT.

As chamadas “Jornadas de Junho de 2013” produziram imensas mobilizações populares com reivindicações inicialmente dirigidas para a melhoria de serviços públicos nas grandes cidades brasileiras. Essas manifestações serviram como estopim para desaguar nas ruas do país todo tipo de protesto e insatisfação, com a participação de manifestantes de todos os segmentos sociais. Essa foi uma oportunidade para a direita e a extrema-direita mobilizarem segmentos expressivos das classes médias e também os ressentidos com a redemocratização e os saudosos da ditadura militar.

O resultado geral desse processo foi a criminalização da política – incluindo os representantes parlamentares em geral e as instituições políticas surgidas com a Constituição de 1988 –, e a disseminação do antipetismo como sentimento coletivo de grande alcance.

A crise política foi agravada com as eleições presidenciais de 2014 com o questionamento do resultado eleitoral por Aécio Neves, candidato derrotado do PSDB, como representante do bloco de forças liberais e conservadoras. O sistema político brasileiro entrou em grave crise de legitimidade.

Estavam criadas as condições para que esse sentimento antipolítica generalizado, que foi sistematicamente produzido, propiciasse o surgimento de uma liderança que aparecesse para a maioria da sociedade brasileira como um “candidato contra o sistema”.

O objetivo das forças liberais e conservadoras era levar o PSDB de volta à presidência da República, com o fim dos governos do PT, para retomar a hegemonia das políticas neoliberais no governo federal. A crise do sistema político atingiu em cheio também o PSDB.

Um político medíocre, que ganhou notoriedade por suas posições e propostas consideradas absurdas, há 28 anos atuando como um deputado federal fisiológico que defendia as reivindicações corporativistas dos militares e se distinguia pela defesa da tortura, da morte, da violência e da ditadura militar, foi o principal beneficiário da crise do sistema político brasileiro.

Bolsonaro foi eleito pela exploração do ódio e do ressentimento criados contra a política e o PT e a esquerda brasileira. Teve um apoio político de uma base social com interesses e expectativas muito heterogêneos.

Sob a liderança do capital financeiro e do agronegócio, os empresários de todos os portes e setores da economia tinham interesses na radicalização da política neoliberal para aumentar seus lucros com a privatização de empresas públicas e a precarização e a supressão de direitos dos trabalhadores.

Uma parcela majoritária das classes médias foi mobilizada por ressentimentos causados com os resultados das políticas sociais que reduziram as desigualdades sociais e promoveram a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e da população mais pobre. A redução das desigualdades sociais promoveu a democratização do acesso a espaços de prestígio social antes monopolizados pelas classes médias e pelas classes dominantes.

Expressivos segmentos dos militares das Forças Armadas, dos policiais militares e dos profissionais de segurança privada foram seduzidos com a retórica da militarização da vida social e a defesa da violência e da morte para combater a criminalidade, as promessas de legalização do acesso a armas antes de uso restrito das Forças Armadas, e a defesa da truculência policial como forma ilusória de solução dos problemas da segurança pública.

Muitos segmentos das classes populares queriam “mudanças” e estavam revoltados com os escândalos de corrupção, com o desemprego, a perda de direitos e a falta de perspectiva de melhoria imediata das suas condições de vida.

Além disso, com finalidade eleitoral, junto, por exemplo, às igrejas neopentecostais, foram explorados valores conservadores contra as conquistas de mulheres, negros, movimentos LGBTQIA+ e povos originários, reforçando os preconceitos que orientam as práticas do machismo, da misoginia, do racismo, da homofobia e do genocídio das populações pobres e periféricas e comunidades indígenas.

O que a confirmação do general Braga Netto como vice do Bolsonaro representa? O que essa chapa diz simbolicamente sobre os rumos que o Brasil tomar?

O general Braga Neto é um típico representante na chapa de Bolsonaro do chamado Partido Militar. Essa é a denominação que alguns estudiosos da questão militar no Brasil têm usado para explicar a participação e a interferência dos militares nos processos políticos nacionais. Fazem uma analogia entre a estrutura do Alto Comando das Forças Armadas e a direção central de um partido político. Além disso, os militares sempre possuem um “programa político” que orienta suas ações junto ao governo e às instituições do Estado e da sociedade civil brasileira.

A ideia da existência de um Partido Militar procura também destacar que as ações dos militares não são atos isolados e decisões individuais.

Recentemente foi dada publicidade a um documento intitulado “Projeto de Nação – O Brasil em 2035”, que é um verdadeiro programa político desse Partido Militar. Trata-se de um conjunto de propostas que constituiria um projeto estratégico para a permanência dos militares no poder até 2035 com a criação de um suposto “centro de governo”, formado por organizações militares e civis.

Como já dissemos, a participação dos militares na política é uma das características da história política brasileira. Na verdade, os militares acham-se dotados de legitimidade para atuarem como uma espécie de poder moderador em nosso sistema político. É isso que configura a tutela militar no Brasil.

Depois da redemocratização nunca tivemos de fato o poder civil controlando poder militar.

Por um momento, pareceu que os militares teriam uma atitude profissional e ficariam limitados às suas atribuições nos quartéis. A partir do momento em que alguns interesses começaram a ser atingidos, o Partido Militar retomou suas ações e iniciativas.

A candidatura de Bolsonaro é o resultado de um projeto do Partido Militar.

A partir de 2014, houve a participação ativa do Partido Militar na viabilização da candidatura de Bolsonaro. Os quartéis foram abertos para a propaganda político-eleitoral de Bolsonaro. O Partido Militar hoje está no governo e ocupa posições estratégicas na direção política do Estado brasileiro.

A militarização do governo Bolsonaro é obra o Partido Militar, pois um militar da ativa apenas pode ocupar um cargo no governo com autorização do Alto Comando. Então é o Alto Comando que está referendando a presença de mais de 6 mil militares em cargos no governo federal.

Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, foi criado o Ministério da Defesa. Antes disso, havia o Ministério do Exército, o Ministério da Marinha e o Ministério da Aeronáutica. Foi algo muito inovador o Ministério da Defesa ser ocupado por um civil. Foi com o governo Bolsonaro que o Ministério da Defesa passou a ser ocupado por um militar. Antes dele, todos os ministros da Defesa foram civis.

A criação do Ministério da Defesa criou um mal-estar entre os militares, porque eles perderam poder. Mas o fato que motivou o retorno do protagonismo político dos militares foram os resultados do trabalho da Comissão Nacional da Verdade, que investigou e comprovou o envolvimento das Forças Armadas nas ações de tortura e assassinatos de muitos opositores à ditadura militar de 1964. Isso criou um grande constrangimento no interior das Forças Armadas.

Outro fato relevante para a retomada do protagonismo político dos militares foi a operação no Haiti numa missão de paz da ONU. Todos os generais que ocupam lugar de comando no governo Bolsonaro passaram pelo Haiti. Foi uma experiência para praticar a chamada defesa da lei e da ordem, uma ação tipicamente policial. Quando retornam, são chamados para fazer no Brasil o que fizeram no Haiti. O general Braga Neto comandou uma intervenção militar nos morros do Rio de Janeiro.

Alguns desses generais foram vinculados à chamada "linha dura" durante a ditadura militar, que era contrária à abertura política proposta pelo general-presidente Ernesto Geisel e pelo general Golbery do Couto e Silva. O general Heleno, quando jovem, foi ajudante de ordens do general Silvio Frota, que era o candidato da extrema direita na disputa interna com o general João Batista Figueiredo para a indicação do último presidente do regime militar.

Esses generais que estão no governo Bolsonaro foram formados na década de 1970, que foi o período mais violento da ditadura militar, quando o terrorismo tornou-se política de Estado. O uso da tortura e do assassinato de opositores passaram a ser política de Estado.

Há pouco tempo, o governo dos Estados Unidos tornou público um documento que revela que os assassinatos de presos políticos e militantes de esquerda tinham autorização da Presidência da República. Isso é extremamente grave, pois antes se imaginava que as torturas e os assassinatos fossem uma espécie de descontrole sobre as ações da chamada "linha dura".

Esse grupo de militares, vinculados à extrema-direita e à "linha dura" durante a ditadura militar, identificou na figura e no carisma popular de Bolsonaro a possibilidade de retornar ao governo por meio do processo eleitoral. Bolsonaro foi um cavalo de Tróia para o retorno dos militares ao poder.

Por intermédio do general Villas-Boas com seus já célebres tuítes, o Alto Comando das Forças Armadas pressionou o STF para não aprovar o habeas corpus que permitiria a liberdade para o presidente Lula e viabilizaria sua candidatura em 2018. Sem o presidente Lula na disputa eleitoral foi viabilizada a eleição de Bolsonaro em 2018.

Bolsonaro até então era considerado uma figura tosca e quase folclórica. Sua candidatura cresceu e se viabilizou em grande medida em consequência da crise da segurança pública no Brasil. O aumento da criminalidade e a falta de segurança das pessoas propiciou que um discurso de extrema-direita tivesse repercussão e apoio de segmentos crescentes da sociedade. As pessoas passaram a acreditar que a solução para o problema da segurança pública estaria no aumento da repressão policial e do encarceramento.

Os militares são educados nas academias para se julgarem superiores em termos morais e em termos de eficiência técnica aos civis. Isso é usado para reforçar sua suposta legitimidade junto à sociedade.

O governo Bolsonaro expôs a falácia disso, ao evidenciar a incompetência técnica e a existência de sinais muito claros de corrupção nas ações do Ministério da Saúde durante a pandemia da covid-19, à época comandado pelo general Pazuello, tido como especialista em logística.

Os militares patrocinaram uma aventura política e estão, hoje, profundamente desgastados com os resultados do governo Bolsonaro.

A imagem das Forças Armadas ficou extremamente vinculada aos desastres do governo Bolsonaro. O governo Bolsonaro é um governo militar. O monstro do fascismo ocupou o governo e as instituições do Estado, correndo por dentro a democracia.

Há um detalhe importante que é necessário lembrar. O general Braga Neto, ao comandar a intervenção militar nos morros do Rio de Janeiro, muito provavelmente obteve informações sobre a organização e a atuação das milícias nos bairros e nas comunidades periféricas.

Alguns analistas especulam que, pelas notórias ligações da família Bolsonaro com as milícias cariocas, o general Braga Neto possuiria informações cruciais que podem ser usadas como moeda de troca política nas disputas internas do bolsonarismo. Desse modo, o general Braga Neto parece ser o melhor representante do Partido Militar nesse momento.

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