A Prefeitura de Natal vem atrasando o repasse da verba da merenda escolar destinada às unidades de ensino da capital. Com isso, as escolas de ensino fundamental estão se mantendo com apenas R$ 0,36 por estudante. Para a pré-escola, o valor também é baixo: R$ 0,53. Por outro lado, o prefeito Álvaro Dias (PSDB) doou cestas básicas esta semana, às vésperas da eleição, em nome do seu candidato à presidência, Jair Bolsonaro.
Há casos de unidades pagando os fornecedores até fiado. “Isso é em toda a rede municipal. A gente até o momento recebeu recursos federais, só”, afirmou o diretor financeiro de uma escola, que não quis se identificar. A alternativa, segundo ele, foi adotar a prática de compras fiadas para não faltar nada.
“Até hoje a gente tá mantendo a merenda, só que a gente está comprando fiado. O fornecedor está fornecendo a merenda para a gente fazer o pagamento posterior”, confessa.
“O dinheiro que entrou até o momento, se fosse para comprar só com ele, já teria acabado a merenda. Mas como a gente tem contrato com o fornecedor, ele está prestando o fornecimento e a gente está com merenda em dia na escola”, pontua.
Além da pré-escola e ensino fundamental, o Governo Federal repassa ainda R$ 1,07 para creches e ensino integral, e R$ 0,32 para a Educação de jovens e adultos (EJA). Em Natal, convivendo apenas com esse dinheiro, estão 74 CMEIs e 72 escolas de ensino fundamental.
“É geral. Na rede toda”, também confirmou Sivoneide Martins, do CMEI Nossa Senhora de Santana, no bairro Nordeste, zona Oeste, sobre o atraso no pagamento do município.
O valor de 36 centavos para ensino fundamental e médio é do Pnae (Programa Nacional de Alimentação Escolar), fruto do Governo Federal e enviado mensalmente. Segundo gestores financeiros de CMEIs ouvidos pela reportagem, o problema tem uma longa duração, mas até o momento não está atrasando o fornecimento de merenda aos alunos.
“Não houve o repasse da parte da merenda que vem da Secretaria Municipal de Educação. A gente tá funcionando só com a federal”, disse Alenuska Sátiro, diretora pedagógica do CMEI Evangelina Elita, bairro de Lagoa Azul, zona Norte.
“Os fornecedores estão enviando, até para pagar depois. Até aqui, não houve necessidade de paralisação das aulas”, disse outra diretora, que não quis se identificar.
Em um CMEI do bairro de Nossa Senhora da Apresentação, zona Norte, houve um atraso na entrega há 15 dias. A direção precisou inverter a ordem da merenda e adiantar os alimentos do cardápio dos dias seguintes, para que os alunos não ficassem sem comer. Após dois dias, segundo a gestora financeira, o fornecimento foi feito.
Em uma unidade do conjunto Nova Natal, a direção precisou pedir um complemento à Prefeitura, já que houve um crescimento de alunos na unidade. “Estamos oferecendo [refeição] normalmente. A verba municipal será paga em breve de acordo com as solicitações de complemento”, disse o diretor Pedro Henrique, responsável pelo CMEI Professora Maria Abigail Barros de Azevedo.
“A reserva federal é muito pouca, e o total por criança é mais de R$ 2”, apontou Carmem Oliveira, ex-gestora financeira do CMEI Galdina Barbosa Silveira Guimarães, em Mãe Luíza, zona Leste da capital.
A agência Saiba Mais procurou diferentes unidades de ensino, e pelo menos oito, espalhadas pela cidade, confirmaram o atraso.
De acordo com o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Rio Grande do Norte (SINTE/RN), o problema vem desde o ano passado. Ela [Prefeitura] manda comprar com recurso do Governo Federal e, se faltar, aí ela diz que assume a despesa. Não tem mais contribuição do município”, afirma o coordenador geral da entidade, Bruno Vital.
“Até ano passado existia uma complementação do município, que era um valor superior ao da per capita federal. Esse ano, a Prefeitura não está repassando contrapartida nenhuma. Tem dito às direções que comprem e que depois a Prefeitura vai pagar. Inclusive, isso está criando uma dificuldade para alguns fornecedores, porque eles ficam na expectativa de que podem não receber o pagamento”, revela Vital.
Prefeitura não paga merenda, mas doa cestas básicas em nome do presidente
Enquanto não faz o repasse da verba para a merenda escolar na rede municipal de Natal, o prefeito Álvaro Dias (PSDB) utiliza a estrutura do órgão para fazer campanha em prol de seu candidato, Jair Bolsonaro (PL).
Nesta quarta (26), a Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social (Semtas) foi até o bairro de Nossa Senhora da Apresentação – o mesmo em que houve um atraso na comida dos alunos há duas semanas – para doar kits pessoais e cestas básicas em nome do Governo Federal.
“Essa é uma ajuda que veio do Governo Federal, a pedido do prefeito Álvaro Dias, pra tá ajudando as famílias que sofreram com as fortes chuvas, e as famílias que estão em forte vulnerabilidade social”, disse a servidora da Semtas, dentro da Escola Municipal Nossa Senhora da Apresentação.
O kit foi recheado, composto por duas cestas básicas, dois colchões, um kit de higiene pessoal, um kit dormitório com lençol, toalha e manta, e um kit de limpeza, com balde, detergente, água sanitária e sabão. O anúncio arrancou aplausos.
Valor repassado por aluno por dia pelo Pnae:
Educação de jovens e adultos – R$ 0,32
Ensino fundamental – R$ 0,36
Pré-escola – R$ 0,53
Creches e ensino integral – R$ 1,07
