Sem regulamentação ambiental, ribeirinhos denunciam novas ocupações no estuário do Potengi
Natal, RN 19 de abr 2024

Sem regulamentação ambiental, ribeirinhos denunciam novas ocupações no estuário do Potengi

10 de dezembro de 2022
6min
Sem regulamentação ambiental, ribeirinhos denunciam novas ocupações no estuário do Potengi

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Comunidades ribeirinhas que atuam no estuário do Rio Potengi, na zona Norte de Natal, denunciam ocupações irregulares em área de mangue protegida por uma decisão judicial transitada em julgado. A área, de quase 300 hectares, que deve ser transformada em parque estadual e também está contemplada no projeto de regulamentação da Zona de Proteção Ambiental 8, é alvo da ação de carcinicultores, conforme denunciam os ribeirinhos.

Aproveitando o período de final de ano, Copa do Mundo e o afrouxamento nas fiscalizações, eles voltaram com tudo e à luz do dia, porque confiam na impunidade. Enquanto isso, a comunidade está assustada e os pescadores sem poder trabalhar”, disse com exclusividade à Agência SAIBA MAIS a ativista ambiental Joane Batista, da Rede MangueMar e ONG Oceânica.


Segundo ela, a região vem há anos sofrendo os efeitos da ocupação predatória, que devasta o ecossistema e impede as atividades de subsistência por parte das populações ribeirinhas tradicionais. Além da carcinicultura, a área de manguezal estaria sendo utilizada para criação de gado, duas atividades que contrariam uma sentença judicial de 2004 (transitada em julgado em 2009), fruto de uma Ação Civil Pública impetrada pelo Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte (MPF/RN).

Ademais, em 2010, foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre os Ministérios Públicos Federal e Estadual, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama), Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema) e os carcinicultores que atuam na região. O acordo visava à suspensão das atividades nos viveiros, demolição das instalações e recuperação imediata da área, com reflorestamento.

Essa última parte, inclusive, que deveria ser competência do Poder Público, está na verdade sendo executada pelo trabalho importantíssimo realizado Gamboa do Jaguaribe, que há cinco anos faz o replantio dessa área para resgatar o ecossistema do manguezal - já tão devastado em anos anteriores. Porém, tudo isso está sendo colocado abaixo por tratores clandestinos de carcinicultores que insistem na ilegalidade”, lamenta Joane.

A área recebe um projeto de replantio realizada pelo Gamboa do Jaguaribe, um sítio ambiental e histórico da zona Norte de Natal. | Foto: Cedida

Entenda o caso

A Fazenda Camarão do Povo, à época de responsabilidade da Cooperativa dos Pescadores e Carcinicultores do Potengi (CPCP), foi alvo de uma Ação Civil Pública, do MPF. A sentença de 2004 determinou o fim das atividades e a recuperação ambiental. Contudo, os carcinicultores recorreram até o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve o reconhecimento da ilegalidade da exploração da área. O processo transitou em julgado em 2009.

Durante a execução da sentença, a alternativa encontrada pelo MPF e pelo Ministério Público do Estado (MPE/RN) foi celebrar um TAC concedendo novos prazos para uma desocupação gradativa, mas sem mudar o teor da decisão. O termo foi assinado em 20 de maio de 2010 e homologado judicialmente. Todas as áreas deveriam ser desativados no prazo máximo de até 20 de maio de 2015.

Essa área deveria ser transformada em uma unidade de conservação, inclusive já existe no Idema o processo para criação de um parque estadual. Mas infelizmente a burocracia é grande e esse processo se arrasta há anos, sem uma resolução por parte do Governo do Estado”, cobra a ativista da ONG Oceânica.

Registro de um viveiro flagrado em fiscalização do Idema. | Foto: Cedida

Zona de Proteção

Além do projeto do Parque Estadual Mangues do Potengi, citado por Joane, a área alvo dos carcinicultores clandestinos é contemplada pela ZPA-8, que está em fase de regulamentação. A matéria foi aprovada, com 22 emendas encartadas, pela Câmara Municipal de Natal, no dia 6 de setembro. De lá, foi devolvido à Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb), de onde seguiria direto para sanção do prefeito Álvaro Dias (PSDB).

Contudo, o projeto até hoje não foi sancionado e ainda é objeto de críticas por parte de populações ribeirinhas, ativistas, pesquisadores e estudiosos. Isso porque a proposta inclui uma possível expansão da área do Porto de Natal, a criação de um parque ecológico com equipamentos públicos de esporte, lazer e turismo e a permissão da continuidade  da carcinicultura em áreas de conservação já ocupadas pela atividade.

É um retrocesso que fragiliza ainda mais a região e deixa a ZPA completamente vulnerável. Não houve nenhuma consulta pública e eles não sabem nem que existem comunidades ali”, contesta Joane Batista.

A ZPA-8 compreende parte dos bairros da Redinha, Salinas e Potengi (zona Norte) e parte dos bairros de Quintas, Nordeste, Bom Pastor e Felipe Camarão (região Oeste).

Em resposta à SAIBA MAIS, o Idema disse que já está acompanhando essa situação. Em vistoria realizada no dia 9 de novembro, foi constatado que a Associação dos Carcinicultores e Piscicultores do RN (ACAPERN) está realizando a atividade de carcinicultura (8 viveiros e 12 berçários) sem a devida Licença Ambiental. O órgão notificou a entidade.

Localização dos viveiros sob responsabilidade da ACAPERN. | Imagem/Cedida

Sobre o projeto de criação do Parque Estadual Mangues do Potengi, o Idema ainda não enviou informações.

A SAIBA MAIS também contatou a Semurb para checar a tramitação do projeto de regulamentação da ZPA-8, mas a assessoria informou que só consegue essa informação na segunda-feira (12). Também tentamos contato com a ACAPERN, mas não obtivemos retorno.

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