Terrorismo: a lógica do ódio contra a sociedade livre e o Estado Democrático de Direito
Natal, RN 19 de abr 2024

Terrorismo: a lógica do ódio contra a sociedade livre e o Estado Democrático de Direito

30 de dezembro de 2022
5min
Terrorismo: a lógica do ódio contra a sociedade livre e o Estado Democrático de Direito

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Por Lázaro Amaro

A ordem e a incolumidade públicas encontram-se gravemente ameaçadas, no Brasil, pelo terrorismo declarado e praticado por grupos de extrema direita, que integram o movimento bolsonarista.

Na atual conjuntura, mais do que em qualquer outro momento de nossa história política, as famílias e as pessoas individualmente encontram-se expostas ao risco potencial de um ataque de extremistas. Não se trata de “profecia do terror” ou de “espalhamento de medo''. É a constatação de um fato real evoluído do fundamentalismo político e religioso que contaminou parte significativa de nossa sociedade, e que precisa ser enfrentado e banido de seu seio, com a máxima urgência, através de medidas institucionais firmes e historicamente marcantes.

A recente prisão de um terrorista que se preparava para explodir uma bomba, no aeroporto de Brasília, em pleno Natal, somada aos ataques havidos também na Capital Federal, dias antes, em decorrência da prisão de uma pretendida liderança indígena, e a um sem-número de ameaças abertas, distribuídas pelas redes sociais, evidenciam que a situação de terror não se encerra na pessoa do fanático detido e de seus eventuais cúmplices, os quais são desconhecidos, ainda, de nomes e de quantidade.

Essa situação evapora os pruridos que normalmente intimidam a discussão em torno da liberdade de expressão, da liberdade política e, mais ainda, da liberdade religiosa, no Brasil.

No estado democrático de direito, todas as liberdades precisam ser inegociavelmente limitadas, por estarem sujeitas aos ditames da Constituição e das Leis, que servem para garantir a própria existência desse estado e da sociedade que o mantém, enquanto se constrói a si mesma.

Noutros termos, no estado democrático de direito, não se podem admitir, na dimensão política, mormente na eleitoral, afirmações como “Oxalá acima de tudo!”, “Deus acima de tudo!”, “Alá acima de tudo!” ou “Brama acima de tudo!”, as quais já denotam e denunciam fanatismo religioso, que, em nosso caso, se confunde com o fanatismo político.
As experiências históricas, tão caras ao processo civilizatório, registram que a mistura de estado com religião sempre resultou em desgraças para a humanidade

Não importa, de nenhum modo, que a maioria da população possua essa ou aquela orientação religiosa. Para a Constituição, o ateu e o sacerdote possuem os mesmos direitos.

Então, os princípios constitucionais, entre os quais o da vida e o da liberdade, representam os maiores valores para o estado e para a sociedade brasileiros, acima de todos os demais, doa em quem doer.

O limite do princípio da vida é sua indisponibilidade. Afinal, ninguém tem o direito de eliminar a própria vida ou a vida de outra pessoa. Nem ao estado é concedido o poder de vida e morte sobre as pessoas, salvo em estado de guerra declarada, sem prejuízo da legítima defesa, pelo ente estatal ou pelos cidadãos.

O limite da liberdade, por sua vez, deve ser compreendido na reciprocidade desse direito, ou, usando uma expressão popularizada, a liberdade de uma pessoa termina onde começa a liberdade das demais. Isto quer dizer que ninguém pode ter a liberdade de impedir a liberdade de outrem. O fanatismo caracteriza-se exatamente pelo preconceito, pelo ódio e pela intolerância dirigidos contra quem não aceita as ideias dos fanáticos.

No Brasil, o fanatismo político e o fanatismo religioso caminham de mãos dadas e estão em pleno movimento.

É preciso iniciar um corajoso combate ao terrorismo e ao fanatismo e promover o enfrentamento ao fundamentalismo. O combate aos dois primeiros deve ser feito através de intervenções processuais, enquanto o fundamentalismo deve ser desconstruído por meio de uma intensa campanha educativa, pelos meios jornalísticos, nas redes sociais, nas escolas, principalmente, e, especialmente, nas escolas administradas por entidades religiosas, com inafastável obediência dos conteúdos programático aos objetivos fundamentais de liberdade, solidariedade e justiça social, consoante determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
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A cultura brasileira precisa avançar das perspectivas meramente religiosas do termo e compreender que alma é sinônimo de mente, de psique, para, em seguida, reconhecer que assim como existem as almas individuais, há também a mente coletiva, e ambas adoecem.

Enfim, recorrendo, outra vez, às expressões populares, é seguro afirmar que a salvação da alma social brasileira exige a erradicação do fanatismo, em todas as suas formas.

Se não devemos nem podemos admitir a prática do canibalismo, com ou sem justificativa religiosa, por exemplo, não podemos aceitar inertes o preconceito, o ódio e a intolerância que juntos conduzem ao fanatismo e, portanto, à disposição de eliminar o diferente.

Lázaro Amaro é advogado e membro fundador da AJPDC.

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