Violações aos direitos humanos entre pessoas que moram na mesma casa aumentam 43% no RN
Natal, RN 28 de mar 2024

Violações aos direitos humanos entre pessoas que moram na mesma casa aumentam 43% no RN

22 de fevereiro de 2023
6min
Violações aos direitos humanos entre pessoas que moram na mesma casa aumentam 43% no RN

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O número de violações entre pessoas que residem em um mesmo lar aumentou 43% entre 2021 e 2022 no Rio Grande do Norte. Os dados são do painel da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos.

Em 2021, foram 14.629 violações registradas; no ano seguinte, subiram para 21.060. Já as denúncias passaram de 3.313 para 3.773, aumento de 13%. 

Na maioria dos casos, as maiores agressoras são as próprias mães. Em 2021, foram 312 violações deste tipo cometidas por genitoras. Em 2022, passou para 552. As violações feitas pelos filhos vêm em sequência, indo de 145 para 168 registros. Outros altos casos envolvem o pai, padrasto ou madrasta e irmão(ã). 

Em agressões feitas pelo pai contra filhas mulheres, estão registrados 196 casos em 2022. Contra filhos homens, 191.

O machismo mostra que as mulheres permanecem como alvos em potencial dos seus companheiros. Em 2022, por exemplo, 314 mulheres no Estado relataram violência do homem dentro de casa. Já entre um homem que denunciou uma violência cometida pela mulher, aparecem 14 casos.

Já nos tipos de grupos vulneráveis, o painel mostra que as principais violências atingem crianças e adolescentes, com destaque também para a violência contra a pessoa idosa e violência doméstica/familiar contra a mulher. Do total de denúncias, foram 65% relatadas por mulheres em 2021 e 62% no ano seguinte.

A maioria dos suspeitos são homens de 40 a 44 anos, que praticam os crimes há mais de um ano e, em geral, buscam atacar a integridade - seja ela física, psíquica ou patrimonial - da vítima. 

Estes ataques psíquicos são a maior parte dos casos, com 6.945 violações em 2021 e 9.699 no ano seguinte. Eles vão desde a insubsistência afetiva (a omissão de cuidado e afeto entre pais e filhos menores, ou adultos com os pais na velhice), tortura psíquica, ameaça ou coação, constrangimento, dentre outros. 

Os perigos à integridade física envolvem maus tratos; agressões; exposição de risco à saúde; situação de rua ou abandono material, etc. Já a integridade patrimonial é o direito à preservação dos seus bens.

O painel dos Direitos Humanos no RN levanta ainda outros casos, como ataques às liberdades individuais, aos direitos sociais (como alimentação) e à segurança.

Responsabilidade sobre denúncia é da sociedade, diz professor

Para o sociólogo Paulo Victor Leite Lopes, do Departamento de Antropologia da UFRN, os números do painel ministerial apontam para uma fuga do senso comum.

“Em geral, a gente pode pensar que o lugar do lar é o espaço de acolhida, de cuidado, de proteção. E de fato esse espaço pode ser esse lugar, só que os dados revelam que a casa não está fora de outras estruturas sociais e também dentro de casa ocorrem violências que estruturam a nossa sociedade”, afirma.

Lopes, que também é coordenador do Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio (CRDHMD/UFRN), alerta que, embora a violência contra a mulher no contexto do lar seja a mais divulgada, outros públicos estão vulneráveis, como idosos, crianças e adolescentes e pessoas LGBTQIA+. Para ele, a opressão a esses grupos está relacionada a diferentes fatores. 

“Envolvem desde aspectos mais amplos, como machismo, LGBTfobia, uma consideração que criança e adolescente ainda não tem condições de autonomia e portanto as pessoas devem exercer poder sobre elas, assim como isso também é muito forte com relação a pessoas idosas e pessoas com deficiência”, enfatiza.

O antropólogo ainda levanta a hipótese de subnotificação.

“Essas pessoas que são vítimas nem sempre estão fortalecidas ou conhecem os canais de denúncia. Porque, por exemplo, alguém pode estar numa situação muito desigual em casa e a denúncia pode significar a sua expulsão de casa, não ter onde viver. Então a pessoa pode não dispor dos meios de fazer a denúncia, dos conhecimentos, de fazer a denúncia, ou estar fortalecida ou empoderada o suficiente”, diz Lopes.

Segundo ele, um passo importante é que a própria comunidade fique atenta a sinais de violência.

“Uma coisa que poderia ajudar com relação a isso seria um vizinho, uma pessoa passando, um profissional da saúde, um profissional da assistência, um profissional da educação fazer uma denúncia ao identificar esses sinais. Mas, infelizmente ainda hoje, há uma grande adesão a essa ideia que aquilo que ocorre dentro de quatro paredes é da responsabilidade das quatro paredes e por isso eu não devo meter”, lamenta.

Violência contra a mulher é estrutural, diz delegada

Para Helena de Paula, responsável pela Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher de Natal – zonas leste, oeste e sul (DEAM/ZLOS), a violência contra a mulher, no ambiente em que vive com o agressor, faz parte de um contexto estrutural. 

“Por mais que a polícia seja o órgão mais acessível para as mulheres quando elas precisam informar essa situação de violência e pedir ajuda, a segurança pública sozinha não vai ser a responsável por eliminar a violência contra a mulher. A gente precisa de outras parcerias, uma situação mais intersetorial, com juizado da violência doméstica, com Ministério Público, Defensoria, os Centros de Referência, Casas-abrigo”, aponta.

Sobre o aumento de 43% da violação aos direitos humanos entre pessoas que moram na mesma casa, ela acredita que não necessariamente houveram mais casos de agressões, mas sim que subiu o número de notificações.

“O que está acontecendo agora é que foram desenvolvidas políticas públicas incentivando a notificação. As pessoas, além de estarem notificando, esse número não parte só da polícia. São notificações dos hospitais, das unidades de saúde, notificações de outros setores, de ONGs, e isso vem trazendo o alarme para que haja mais incentivo, mais políticas voltadas ao combate a esse tipo de violência. Não necessariamente revela que houve um aumento na violência. Acredito que tenha havido um aumento nas notificações”, afirma a delegada.

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