Um ano depois, a família de Ray Evangelista do Nascimento Otávio, de 26 anos, segue sem uma explicação para sua morte. Junto com amigos e conhecidos, eles se reuniram na calçada da igrejinha da Vila de Ponta Negra, Zona Sul de Natal, para cobrar o resultado da investigação. Ray foi visto com vida pela última vez no dia 14 de fevereiro no ano passado, ao entrar numa viatura da Polícia Militar, chamada por moradores do bairro, depois que o jovem teve um surto psicótico e saiu pulando o muro de algumas casas, assustando moradores.
“Ele tinha uma vida normal. Trabalhava, deixava a filha na escola e a mulher no trabalho. A gente sabia que ele fumava maconha, mas era dentro da casa dele, não incomodava ninguém. Não sabemos o que aconteceu nesse dia que, depois de deixar a mulher, ele passou no mercadinho para comprar água, se assustou com um carro que ia passando na rua e pulou no telhado da venda e saiu pulando o telhado das casas. Nesse dia, ele tinha combinado com o pai de tirar a carteira de habilitação, não sei se ele pensou que poderia ser o pai no carro… Ele acabou caindo no quintal de uma das casas e o pessoal conhecia a gente. Eles imobilizaram meu irmão e chamaram a polícia”, conta Rayla Nascimento, irmã de Ray.

Ray morreu no dia seguinte à entrada na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Cidade Satélite. O laudo da perícia apontou que Ray havia feito uso de cocaína e que ele morreu por asfixia mecânica da região cervical e torácica, além de uma elevada hemorragia digestiva. Na última foto tirada com vida, Ray aparece de pé, com os olhos abertos, já algemado para ser colocado dentro da viatura da PM.
A família alega que ele entrou na viatura sem qualquer marca de agressão ou hematoma, porém, chegou à UPA com o grau 3 de traumatismo, o mais grave de uma escala que vai até 15.
“Eles saíram do local às 12h40, mas só chegaram na UPA à 13h45! Esse caminho, dependendo do motorista, leva nó máximo 20 minutos. Estavam fazendo o que durante todo esse tempo?”, questiona a irmã da vítima.
No inquérito instalado inicialmente, a Polícia Civil registrou o caso como lesão corporal seguida de morte. No relatório de atendimento da UPA Satélite, há o registro de que Ray foi levado pela polícia depois de ser espancado por populares no bairro de Ponta Negra. A família contesta essa versão.
“O pessoal que imobilizou meu irmão conhece a gente, todo mundo sabe quem somos, eles não bateram em Ray. Meu irmão não roubou nada! Nas filmagens e fotos que fizeram dele antes de entrar na viatura da PM, dá pra ver que não tinha marca nenhuma de agressão, como é que ele chega na UPA com traumatismo? Se você der uma olhada numa foto que fizemos do braço dele, vai ver que está cmo se tivesse sido quebrado, tinha um buraco que cabia um dedo dentro. É uma coisa horrível, que não gosto nem de olhar”, desabafa Rayla.


O caso de Ray Nascimento, de acordo com a família, chegou a ser transferido da Divisão de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), que investiga casos de homicídios, para a 15ª Delegacia de Polícia Civil, no bairro de Ponta Negra. Mas, acabou retornando à DHPP. Segundo informações não oficiais, o processo disciplinar aberto para investigar a conduta dos policiais que atuaram no caso foi arquivado.
A Agência Saiba Mais entrou em contato com a assessoria de imprensa da Polícia Militar que ficou de apurar o andamento do processo disciplinar aberto contra os policiais. Nós também procuramos a Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social (Sesed), mas não obtivemos retorno até a publicação da matéria porque, inicialmente, procuramos a Ouvidoria da Secretaria de Estado das Mulheres, da Juventude, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos (Semjidh), até sermos informados de que essa apuração é feita pela Sesed.
A família de Ray Evangelista criou uma conta no instagram (@justiçaporray) para que as pessoas possam acompanhar o resultado das investigações e cobrar punição para os culpados pela morte do jovem.
“Nós só queremos justiça. Minha mãe foi na frente com meu padrasto e quando chegaram lá ele já estava com traumatismo. Minha mãe ficou sem entender, perguntou se ele tinha roubado alguma coisa e o próprio policial disse que não, que ele tinha sido espancado, mas isso não é verdade. Todo mundo sabia quem era ele, não iam bater nele sabendo que era a gente. Além disso, os vídeos e fotos mostram que meu irmão não tinha marca de agressão quando entrou na viatura”, denuncia Rayla Nascimento, irmã da vítima.