Quando a tristeza é sinal de depressão; UFRN desenvolve programa com diferentes tratamentos
Natal, RN 19 de abr 2024

Quando a tristeza é sinal de depressão; UFRN desenvolve programa com diferentes tratamentos

30 de maio de 2023
Quando a tristeza é sinal de depressão; UFRN desenvolve programa com diferentes tratamentos

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Sentir tristeza é normal, mas até certo ponto. Se não há uma causa específica, como uma separação ou luto pela perda de um parente, e esse sentimento se prolonga por muito tempo, por mais de 15 dias seguidos, pode ser sinal de depressão e é preciso procurar ajuda.

A orientação é da professora do Programa de Pós-graduação em Psicobiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Nicole Leite Galvão Coelho:

Não é toda tristeza que é patológica. Esse é um sentimento que foi selecionado evolutivamente e é muito importante para redirecionar comportamentos, planejamentos... ela se torna um problema quando ela é permanente, associada a uma perda de energia, perda de prazer em fazer atividades que a pessoa costumava ter prazer, trabalhar, ter sua higiene pessoal, sair com os amigos ou encontrar a família”, esclarece.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que haja, pelo menos, 330 milhões de pessoas com depressão no mundo. Na América Latina, o Brasil é o país com o maior número de casos, uma quantidade que aumentou na pandemia da covid-19, iniciada em 2020.

Foi nesse contexto que o Programa de Enfrentamento à Tristeza, criado por professores da UFRN passou por um processo de expansão. Em sua primeira edição, ainda em 2018, as atividades eram realizadas no formato presencial e havia apenas um tipo de tratamento, que era voltado apenas para alunos.

Depois de uma remodelação em 2020, com a parceria de uma plataforma digital, os atendimentos foram retomados em 2021 com um maior número de vagas, incluindo os servidores da universidade, e tipos de tratamentos. A meta é de também realizar atendimento do público externo.

Nicole Leite Galvão Coelho, professora do Programa de Pós-graduação em Psicobiologia da UFRN
Nicole Leite Galvão Coelho, professora do Programa de Pós-graduação em Psicobiologia da UFRN

Cada tratamento desse é um trabalho de um aluno de doutorado do programa de pós-graduação em Psicobiologia. Conseguimos integrar a pesquisa com o atendimento clínico, com esse suporte como forma de extensão. São estudos clínicos e a base é a pesquisa. A pandemia disparou a procura pelo serviço e, depois de uma adaptação tecnológica, o atendimento passou de um grupo de 20 pessoas para quatro grupos de 20, simultaneamente. Em 2022 foram quase 100 pacientes e, agora, queremos expandir também a patologia. Nos próximos anos também queremos abrir o atendimento para o público externo, para isso, precisamos de parcerias com empresas privadas e investimentos. A logística já está sendo testada”, revela Nicole Leite, que tem pós-graduação no Programa de Saúde Mental da Usp (São Paulo) e é professora adjunta no NICM Health Research Institute na Western Sydney University, na Austrália.

A patologia é o tipo de doença tratada. Atualmente, os pesquisadores que atuam no Programa tratam apenas um tipo de depressão, a unipolar, caracterizada por uma tristeza permanente. Porém, cerca de 70% das pessoas que procuram tratamento possuem a depressão bipolar. A direção do Programa de Pós-graduação em Psicobiologia já solicitou à Comitê de Ética da UFRN essa ampliação.

Enquanto na depressão unipolar o paciente sofre com uma tristeza permanente e falta de energia, na bipolar há uma alternância de humor. Em alguns períodos o paciente está com um aumento de energia muito grande, desenvolve atividades e faz muitos planos, mas não de uma forma positiva, é excessiva e atrapalha, intercalando com períodos de episódios depressivos. Aguardamos a resposta do Comitê de Ética para julho e, caso o pedido seja aprovado, o número de pacientes deve passar de 100 para 300”, calcula Nicole.

Com as vagas de maio já preenchidas, uma nova agenda será aberta em julho.

A dificuldade do diagnóstico

Um dos objetivos do Programa de Enfrentamento à Tristeza é conseguir identificar alterações físicas que ajudem no diagnóstico de doenças mentais.

Não tem um exame que mostre as desordens mentais. Que o médico possa dizer ‘ah, você tem essa doença porque tem uma área do seu cérebro que...’. Ao longo da história da psiquiatria, de uma maneira geral, a sociedade diz: ‘ah, você está doente porque você é fraco, porque você quer’... o indivíduo é culpado nessa crença, diferentemente de muitas outras doenças em que esse mesmo indivíduo não é culpado, como quando há alterações biológicas.  Uma das coisas que trabalhamos no combate à tristeza é identificar alterações biológicas relacionadas à patologia para auxiliar, no futuro, a psiquiatria a identificar a doença, além de toda a sintomatologia que já é trabalhada hoje, a ter instrumentos que facilitem essa rotina. Seria até mais fácil de reduzir esse estigma em torno das doenças mentais, ainda bem que há mais acesso à informação, mais pessoas falando e quebrando essa barreira. Isso tem ajudado muito as pessoas a não se sentirem incomodadas a buscar tratamento”, avalia a pesquisadora da UFRN.

Sem energia

Pessoas com depressão, seja do tipo uni ou bipolar, não têm energia para trabalhar. Além do prejuízo pessoal, financeiro, tem também o social para a sociedade, porque você falta ao trabalho, seja numa empresa privada ou pública. Falta energia para interação com os familiares e em casos mais graves isso chega até ao suicídio, para entendermos a gravidade que é esse quadro. Então, realmente, a depressão precisa ser diagnosticada e tratada. O ideal seria que os serviços de saúde, no SUS e particular, conseguissem atender a essa demanda. Marcar um psiquiatra em Natal pode demorar meses”, critica Nicole.

Como anda seu sono?

A dificuldade para dormir pode ser um sinal de alerta, um aviso de que a mente pode estar ficando doente.

A disfunção de sono prediz o surgimento de algumas psicopatologias e está presente em algumas. A insônia, a dificuldade de dormir cedo... pode ser um dos gatilhos para se iniciar um quadro depressivo. Digo para meus alunos: não adianta vocês passarem a noite estudando vão dormir para acordar amanhã e fazer exercício físico, tem que ter um equilíbrio. É a hora extra que depois pesa mais”.

Não tem muita explicação

Uma pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde com base em dados de 2021 apontou Natal como a segunda capital do Nordeste com maior número de pessoas com depressão. O número surpreendeu muita gente, acostumada a enxergar a capital potiguar como uma cidade alegre e ensolarada.

Se formos comparar esses dados, o país com maior índice de depressão é a Austrália...que tem um clima favorável. No caso de Natal, e do Rio Grande do Norte como um todo, por que temos um índice tão alto? Pode ter relação com as questões econômicas, mas não existe uma causa. A depressão é multifatorial, há fatores socioeconômicos, biológicos, histórico de vida... há pessoas de boa condição econômica que têm depressão, assim como tem aquelas pessoas muito pobres, que passam por muitas dificuldades na vida, e não desenvolvem depressão. Não há raça, sexo, apesar das mulheres serem mais afetadas, também atinge os homens, não há uma regra! Se fosse um país lá no Norte, que não tem luz solar, poderíamos dizer que é isso... mas, não é o caso de Natal”, pondera a pesquisadora da UFRN.

Via Costeira de Natal I Foto: Alex Régis/ Secom Prefeitura de Natal
Via Costeira de Natal I Foto: Alex Régis/ Secom Prefeitura de Natal

Como é o tratamento?

Atualmente, o Programa de Enfrentamento à Tristeza da UFRN oferece quatro tipos de tratamento

Um grupo é tratado apenas com fármacos, que são dados gratuitamente pelo programa. O segundo é tratado com fármacos e exercícios físicos, o terceiro com yoga e o quarto com meditação. O tratamento é todo online e durante esse período são feitos exames de sangue. Como temos todo esse acompanhamento, é mais fácil do paciente aderir porque é difícil para uma pessoa que está com depressão, sem energia e sozinho, procurar tratamento, uma academia. Já quando ela está num grupo em que há pessoas com problemas semelhantes ao seu, onde há troca de experiências, essa aderência é melhor”, explica Nicole Leite.

Estamos mais doentes ou há mais procura pelo acesso à informação?

As duas coisas. À medida que as pessoas têm mais acesso à informação sobre saúde mental, reconhecem, procuram mais os serviços de saúde, o que não quer dizer que o estigma em torno do tema foi eliminado. Por outro lado, também há um agravamento da situação sim, por diversos motivos: o aumento de agentes estressores, de demandas, o corre-corre do dia, tudo isso faz com que a saúde mental da gente tenda a falhar”.

E a academia...?

O importante é que a gente trabalhe de forma profilática [preventiva] e não espere a doença aparecer para se cuidar. Exercício físico, uma boa alimentação e uma boa noite de sono, são o que chamamos de comportamentos favoráveis de qualidade de vida, é um estilo de vida adequado que vai auxiliar a gente a não adoecer, mas uma vez que estamos doentes, o padrão de tratamento, no caso da depressão continua sendo os antidepressivos. Porém, cada vez mais percebemos que muitos pacientes não respondem ao tratamento ou apresentam muito efeito colateral e que essas terapias complementares auxiliam muito, tanto na potencialização da medicação, quanto na redução dos efeitos colaterais e aderência a um estilo de vida mais favorável”, conclui a pesquisadora.

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