A violência contra a mulher não é um fenômeno brasileiro, mas mundial, aponta a psicopedagoga e escritora Patrícia Almeida, que lançou o livro “Mulheres correm perigo! Gaslighting: o que você tem de saber sobre esse tipo de manipulação psicológica na relação afetiva”. Ela foi a entrevistada do Balbúrdia desta terça (13).
A publicação, escrita a partir de experiências pessoais da autora, foi a forma que Patrícia Almeida encontrou de ajudar mulheres a identificar os vários tipos de violência pelos quais podem passar numa relação amorosa.
“Dados da Organização Mundial da Saúde apontam que uma a cada três mulheres sofreu violência sexual ou física. O dado não mostra as violências psicológicas, nem daquelas mulheres que não denunciam. Aquelas que denunciam são apenas a ponta do iceberg. No Brasil, em 2022, tivemos 18,5 milhões de mulheres que sofreram algum tipo de violência. No Distrito Federal, em 2020, 94% das mulheres que foram vítimas de feminicídio, não prestaram boletim de ocorrência. Apenas 6% fizeram a denúncia. Então, se olharmos para esses dados de que 18,5 milhões de mulheres sofreram violência doméstica em 2022, temos também os dados daquelas que não denunciam. E onde estão essas mulheres? Não estão nas pesquisas. Então, a violência contra a mulher tem proporções estrondosas e a gente ainda nem sabe”, alerta Patrícia Almeida.
A escritora pontua que muitas mulheres sequer percebem que são vítimas de violência.
“A violência psicológica é sorrateira porque não deixa marcas nos corpos femininos, mas deixa feridas profundas e, muitas vezes, irreversíveis. É uma violência muito difícil de se provar porque ela acontece dentro do ambiente doméstico, ou seja, sem testemunhas, e sem marcas no corpo. As mulheres que conseguem identificar – porque muitas nem percebem por serem violências muito sutis, elas passam por etapas de violência e quando percebem já estão muito envolvidas na relação – quando chegam na polícia ou judiciário e conseguem falar, porque a fala delas é descredibilizada desde o seio da família e amigos, elas não conseguem provar”, lamenta Patrícia.
O que é gaslighting?
“Ele surgiu, aproximadamente, em 1938 e foi criado pelo dramaturgo e romancista inglês chamado Patrick Hamilton. Ele elaborou uma peça de teatro que tinha o título de gaslighting, que seria luz a gás…meia luz, e denunciava a masculinidade tóxica no ambiente doméstico. Consistia num homem manipulador que tentava o tempo inteiro confundir a sua esposa. Ele movia objetos d=que estavam na casa de lugar, escondia objetos e perguntava à esposa onde estavam… e ele manipulava a iluminação a gás da casa, deixava mais ou menos intensa e depois perguntava à mulher se ela tinha percebido. Então ara confundir essa mulher, para manipulá-la e depois roubá-la, porque ela rica e ele estava naquela relação para tirar algum benefício, ele manipulava para que ela fosse para o sanatório e ele ficasse com sua herança”, relata a psicopedagoga.
A escritora ainda ressalta que esse é um tipo de violência que pode ocorrer com qualquer gênero, mas predomina entre as mulheres. Uma pesquisa realizada pela universidade de Cambridge, no Reino Unido, mostra que por causa de características como a empatia e a capacidade de acreditar no outro, mais presente entre as mulheres, elas também estão mais sujeitas à manipulação.
Violências psicológicas
“Eu me aprofundei no gaslighting porque, posso dizer a você, que é a forma de manipulação mais cruel e sórdida que possa existir. Eu cheguei a esse tema porque fui vítima de duas relações abusivas. Passei por uma, foram quase dez anos, consegui sobreviver e depois passei muito tempo sozinha. Tentei reconstruir minha vida com outra pessoa e passei por uma muito pior, que quase me destruiu. Quando tudo acabou, eu passei a achar que havia algo de muito errado comigo e fiquei muito angustiada porque eu pensei: como é que eu passo por duas relações assim? O problema sou eu. E é interessante porque é exatamente assim que a sociedade pensa… quando você passa por duas, três ou algumas relações que não dão certo, e essas culpas incidem muito sobre as mulheres, as pessoas questionam. No primeiro eu recebi apoio, no segundo já não recebi. Fiquei tão amargurada que fui pesquisar, não para escrever um livro, mas para entender o que tinha acontecido”, alerta Patrícia Almeida.