CIDADANIA

No mês da amamentação, conheça os direitos que protegem lactantes na volta ao trabalho

amamentação I Foto: cedida Maternidade Escola Januário Cicco

O recomendado é que todo recém-nascido seja alimentado exclusivamente com leite materno, no mínimo, até os seis meses de vida. O leite que sai do peito da mãe é tão rico em nutrientes que não há sequer necessidade de dar água ao bebê nesse período. Mas, na aventura que é a maternidade, amamentar não é uma tarefa tão simples quanto pode parecer.

O início da amamentação para mim foi doloroso, até ela se acostumar a mamar, pegar o peito, deu muito trabalho. O auxílio da equipe foi fundamental para que hoje a gente possa estar aqui bem e esperando ir para casa”, conta Vicência Monalisa, que é mãe de primeira viagem e está internada na Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC), depois de ter uma bebê pré-matura.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) ainda recomenda que os bebês sejam amamentados até, pelo menos, os dois anos de idade, e até existe uma legislação que protege lactantes no Brasil. Porém, em muitas situações, o processo de amamentação também é dificultado por fatores externos, como a necessidade de voltar ao mercado de trabalho.

Clara Araújo é personal trainer e apenas dois meses depois de parir o pequeno Noah, precisou retomar os compromissos profissionais.

Eu tinha rede de apoio, mas morava longe dos locais de atendimento, então não dava tempo de voltar em casa. Somado a isso, eu não conseguia extrair leite por causa do ritmo de trabalho. Resultado: o meu bebê ficou muito tempo na mamadeira e meu fluxo de leite diminuiu”, lamenta Clara, que se sentiu frustrada por não ter amamentado o filho por mais tempo.

Clara Araújo, personal trainer
Clara Araújo, personal trainer

A personal conta que ainda conseguiu alimentar o filho exclusivamente com leite materno até os seis meses, fazendo a retirada do leite do peito, que era dado para a criança na mamadeira por outra pessoa quando ela não estava em casa.

A enfermeira e consultora em amamentação, Larissa Cotrim, enfatiza que é a amamentação que protege a criança de muitas doenças crônicas, alergias ou alterações orgânicas, que podem ser evitadas ou terem os riscos reduzidos pelo leite do peito.

Sabendo disso, é muito comum sermos procuradas por mulheres muito preocupadas com a queda na produção de leite e com o fim precoce da amamentação por causa da volta à rotina de trabalho”, reforça Larissa.

E apesar das leis que estabelecem um mínimo de segurança para garantir a alimentação do bebê com leite materno, na prática, elas nem sempre são cumpridas. Uma situação que é agravada pelas novas formas de trabalho, nas quais não há carteira assinada ou espaços físicos, como no caso das mulheres que trabalham como Microempreendedoras Individuais (MEI), por exemplo.

Ainda tem muito o que melhorar para que essa mulher de fato tenha apoio para seguir amamentando mesmo após a volta ao trabalho. Na maioria dos casos, falta estrutura das empresas para a ordenha do leite, para o armazenamento ideal e o mais grave: falta apoio da instituição”, avalia Monalisa Soares, enfermeira e consultora em amamentação.

O assunto tem sido ainda mais discutido neste mês por causa da campanha Agosto Dourado, de incentivo à amamentação, e da Semana Mundial do Aleitamento Materno (SMAM), uma iniciativa internacional que em 2023 traz o tema “Apoie a amamentação: faça a diferença para mães e pais que trabalham”.

Direitos garantidos

INTERVALOS ESPECIAIS

Toda lactante tem direito a dois descansos, de meia hora cada, durante o expediente para garantir a amamentação, segundo o artigo 396 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

“Mas, como esses são períodos curtos, o próprio artigo já possibilita um acordo entre a mãe e o empregador. Geralmente, o que acontece na prática é que a mãe soma esses dois períodos e pedem a saída uma hora antes do final de sua jornada. Também acontece de algumas crianças precisarem prolongar a amamentação após os seis meses, por questão de saúde. Nesses casos, a mãe também pode solicitar essa saída uma hora antes, mas tudo tem que ser documentado, com base em laudos médicos e relatórios demonstrando essa necessidade do bebê”, acrescenta a advogada Gabriela Pires.

Os descansos são garantidos até os seis meses de idade da criança, podendo ser estendido em casos de problemas de saúde. Os horários devem ser pré-acordados entre a funcionária e o empregador.

A mãe que não tiver esse direito garantido deve procurar a Defensoria, Ministério Público ou seu sindicato“, orienta a advogada.

Gabriela Pires, advogada

ESTABILIDADE NO EMPREGO

Desde o momento da concepção até cinco meses pós‐parto, quando a amamentação ainda está ocorrendo, é garantida à mulher estabilidade em seu emprego. No artigo 10, inciso II, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição, tal estabilidade é reconhecida ainda que o empregador não tenha conhecimento da gravidez e em contratos de prazo determinado.

MÃES ESTUDANTES

A lei 6.202/1979 estipula que as mães estudantes realizem trabalhos escolares em suas residências para terem notas, incluindo no período da amamentação. Além disso, devem ser assegurados às gestantes e às lactantes o direito a prestarem as provas finais. O direito se inicia no oitavo mês de gravidez e tem duração de três meses, podendo ser aumentado antes e depois do parto por recomendação médica.

AFASTAMENTO POR INSALUBRIDADE

De acordo com o artigo 394-A, III, da CLT, é garantido o afastamento da funcionária que amamenta em atividades insalubres, ou seja, aquelas que podem provocar doenças. Isso, porém, sem prejudicar o salário da empregada e incluindo o valor do adicional de insalubridade. Por força do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN 5938), o afastamento das atividades insalubres em qualquer grau durante a lactação não exige a apresentação de atestado médico. Se não for possível que a lactante afastada exerça suas atividades em local adequado na empresa, ela pode permanecer afastada e solicitar o salário-maternidade durante o período de afastamento.

CONCURSO PÚBLICO

A lei nº 13.872/2019 estabelece o direito das mães amamentarem seus filhos de até seis meses de idade durante a realização de concursos públicos na administração pública direta e indireta dos Poderes da União (legislativo, executivo e judiciário).

ASSENTOS PRIORITÁRIOS

Os artigos 1º a 3º da Lei Federal nº 10.048/2000 asseguram às lactantes atendimento prioritário nas repartições públicas, instituições financeiras e empresas concessionárias de serviços públicos. O texto também garante assentos reservados em transportes públicos.

LOCAL PARA OS FILHOS NO TRABALHO OU REEMBOLSO-CRECHE

O artigo 389 da CLT determina que estabelecimentos nos quais haja, pelo menos, 30 mulheres trabalhando com mais de 16 anos de idade, devem ter um local apropriado para que as empregadas guardem, sob vigilância e assistência, seus filhos durante o período da amamentação. Esses espaços devem ter no mínimo um berçário, sala de amamentação, cozinha e banheiro.

MÃES PRIVADAS DE LIBERDADE

Tanto a Lei de Execuções Penais nos artigos 82 e 89, quanto o artigo 9º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), asseguram às mulheres privadas de liberdade permanecerem com seus bebês até o 4º mês de idade para amamentarem.

No julgamento do Habeas Corpus Coletivo 143.641, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a substituição da prisão preventiva pela domiciliar de todas as mulheres presas que estivessem gestantes, puérperas ou fossem mães de crianças e/ou tivessem pessoas com deficiência sob sua guarda, exceto na hipótese de crimes praticados mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes. Ou, ainda, em outras situações excepcionalíssimas, justificadas com fundamentação judicial.

A Resolução nº 252/2018, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), também determina a adequação dos estabelecimentos prisionais femininos na sua arquitetura e rotina para assegurar a amamentação dos bebês.

CASOS DE ADOÇÃO OU DE MÃES QUE NÃO PRODUZEM LEITE MATERNO

A legislação abrange, também, a amamentação por meio de mamadeira, uma vez que o sentido da palavra ‘amamentar’ é o de ‘alimentar’ a criança.

Metas

Para 2023, as metas da Aliança Mundial para Ação de Aleitamento Materno (WABA, em inglês) para a campanha do Agosto Dourado é de também informar as pessoas sobre as perspectivas dos pais trabalhadores com relação à amamentação e paternidade; fundamentar a licença remunerada e o suporte no local de trabalho com ferramentas para facilitar a amamentação; envolver as pessoas e organizações para melhorar a colaboração e o apoio à amamentação no trabalho; e conscientizar sobre ações de melhoria das condições de trabalho e apoio ao aleitamento materno.

A luta de quem trabalha no setor é pela aprovação de uma licença-maternidade de 180 dias; incentivo à implantação de salas de apoio à amamentação nos locais de trabalho; além da disponibilização de creches nas empresas ou próximas ao local de trabalho.

Amamentar é preciso

O ato de mamar também estimula o desenvolvimento motor, neurológico e afetivo do recém-nascido e o vínculo dele com a mãe. Já há evidências científicas de que, mesmo quando administrado pela mãe por via de sondas, nos casos em que o bebê não consegue sugar ou deglutir ainda, a evolução terapêutica e nutricional para o bebê é bastante significativa.

Durante o Agosto Dourado, mês temático de incentivo à amamentação, e a Semana Mundial do Aleitamento Materno (SMAM), iniciativa internacional que, em 2023, tem como tema “Apoie a amamentação: faça a diferença para mães e pais que trabalham”, a Maternidade Escola Januário Cicco e o Hospital Universitário Ana Bezerra, unidades da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), vinculadas à Rede Ebserh, desenvolverão atividades direcionadas às mães pacientes e acompanhantes, pais, puérperas, mães colaboradoras e gestantes e profissionais da atenção básica.

Na Maternidade Escola Januário Cicco, serão realizadas, de 1º a 07 de agosto, rodas de conversa nos setores com profissionais, pacientes e acompanhantes, abordando o tema da Semana Mundial de Aleitamento Materno de 2023. Também haverá reunião cientifica sobre “Amamentação e mães que trabalham: reflexão sobre o retorno às atividades laborais”, marcada para esta quinta (03), às 7h30, no Anfiteatro Prof. Leide Morais.

Já no dia 09, às 10 horas, ocorre a solenidade de lançamento do Selo Comemorativo ao Aleitamento Materno dos Correios em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Em seguida, palestra sobre “Os 10 passos para o sucesso do aleitamento materno”, com Ana Zelia Pristo, da coordenação do Banco de Leite Humano da MEJC.

Também serão realizadas atividades educativas com os profissionais sobre “Os 10 passos para o sucesso do aleitamento materno” por iniciativa do Hospital Amigo da Criança (IHAC), além do registro de elogios direcionados aos profissionais que apoiam o aleitamento materno.

Já no Hospital Universitário Ana Bezerra, a programação começa com a realização da roda de conversa “Rede de Apoio: com Foco na Participação Paterna”, uma iniciativa do projeto de extensão Maternar. A atividade ocorre de 1º a 11 de agosto, tendo como público-alvo gestantes do pré-natal de alto risco.

De 14 a 18 de agosto será realizado o “Game Incentivando o Aleitamento Materno”, numa iniciativa da Residência Multiprofissional e do Comitê de Aleitamento Materno, tendo como público-alvo profissionais da unidade hospitalar. Nesse mesmo período, serão realizadas ações de aconselhamento sobre os riscos decorrentes do uso de bicos, chupetas e mamadeiras, iniciativa de profissionais odontólogos do hospital direcionada a profissionais da UTIN do HUAB.

De 14 a 25 de agosto tem a roda de conversa “Amamentação X Volta ao Trabalho”, por meio do projeto de extensão Maternar, voltada para gestantes do pré-natal de alto risco. Já de 14 a 31 de agosto, está marcada a ação “Aplicação Prática dos Métodos de Transição: Favorecendo o Aleitamento Materno”, da equipe do Posto de Coleta de Leite Humano e de fonoaudiólogas do hospital, tendo como público-alvo profissionais do HUAB.

A unidade terá, ainda, entre os dias 14 e 31 de agosto, a roda de conversa “Manejo em Favorecimento ao Aleitamento Materno”, pelo projeto de extensão AMAR, voltada para puérperas, e a ação “Direitos das Mães que Amamentam”, direcionada para gestantes e profissionais da atenção básica. Já de 21 a 31 de agosto ocorrerá o evento “Aconselhamento em Aleitamento Materno”, realizado pelas psicólogas do hospital, voltado para profissionais do HUAB.

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