OPINIÃO

Plano Brasil Sem Fome do governo Lula

No dia 12 de julho de 2023 foi publicada pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) a edição de 2023 do relatório “O Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo”, no qual há a estimativa de que havia 21 milhões de pessoas que passavam fome em 2022 no Brasil, e 70,3 milhões estavam em insegurança alimentar (quando as pessoas não têm acesso regular e permanente a alimentos em quantidade e qualidade suficiente).

Em relação aos dados de outros países a estimativa era de que havia entre 691 e 783 milhões de pessoas passavam fome em 2022 no mundo, 122 milhões a mais do que em 2019 e 2,3 bilhões se encontravam em situação de insegurança alimentar que segundo o relatório, afeta desproporcionalmente mulheres e pessoas que vivem em áreas rurais. O documento considera entre outros fatores explicativos, as consequências das mudanças climáticas, conflitos armados (guerras entre e também nos próprios países), aumento do preço dos alimentos e o processo de urbanização (mudando a oferta e a demanda de alimentos) e propõe recomendações sobre políticas, investimentos e novas tecnologias.

Em 2003, no início do primeiro governo de Lula foi criado o Programa Fome Zero (que se transformou no Bolsa Família) como umas principais políticas sociais que pretendia acabar com a insegurança alimentar no país. E de fato houve uma melhora significativa, culminando com a saída do país, em 2014, do Mapa da Fome (ferramenta usada por agências das Nações Unidas (ONU), como a FAP e o PMA – Programa Mundial de Alimentos- para monitoramento do acesso adequado a alimentos).

Segundo dados da Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional) no início do primeiro governo Lula, 9,5% da população vivia em condição de insegurança alimentar grave (quando a família declara fazer apenas uma refeição por dia ou informa ficar sem comer um dia inteiro). Essa taxa havia caído para 4,2% em 2013.

No entanto, a melhora contínua constatada desde então entrou em trajetória de reversão a partir de 2014 e especialmente nos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, ou seja, houve retrocesso em relação à segurança alimentar, com a diminuição e desmonte de programas sociais e o resultado foi o crescimento da pobreza e da miséria e, portanto, da fome no país. Os dados da Penssan relativo aos anos de 2021 e 2022 indicam que havia 15,5% da população em insegurança alimentar grave, cerca de 33 milhões de pessoas com fome no país.

O retrocesso que ocorreu no Brasil, especialmente entre 2014 e 2022 é expresso em números. Em 2001 , segundo os dados da FAO, 10,7% da população vivia em condição de desnutrição (significando que a pessoa habitualmente consome menos alimentos do que o suficiente para manter uma vida normal, ativa e saudável) e o número diminuiu sucessivamente até chegar a 2,5% em 2014. Depois, ficou em patamar inferior entre 2015 e se reverteu em 2019, quando a série registrou um crescimento – pela primeira vez em 18 anos —para 2,6% da população em situação de desnutrição. Em 2020 houve nova piora, e o percentual passou de 2,6% para 4%.

A Fundação Getulio Vargas (FGV) também fez um estudo sobre a situação da fome no Brasil com base em informações do Gallup World Poll e segundo o estudo publicado em 2 de junho de 2022 o Brasil ocupava lugar de destaque no tema insegurança alimentar “pelo contraste entre a alta produção agrícola com as dificuldades que os brasileiros têm de lidar com falta de comida”.

O FGV Social realizou um mapeamento dos dados levando em conta o acompanhamento das mudanças no período da pandemia e segundo Marcelo Neri, coordenador da pesquisa e diretor do FGV Social os principais resultados foram o aumento da insegurança alimentar durante a pandemia e o que chamou de “processo de feminização da fome”. “É a primeira vez que o Brasil ultrapassa a média mundial e o aumento foi quatro vezes maior a elevação ocorrida no mundo, entre 2019 e 2021”.

Os dados analisados e processados a partir do Gallup World Poll foram fundamentais porque a base de dados permite comparabilidade entre 160 países (em bases anuais desde 2006) e desta forma possibilita “medir diferenças de prazo mais longo de insegurança alimentar entre o Brasil e o mundo, assim como de seus determinantes próximos como renda, escolaridade, gênero e idade”.

De acordo com os dados, a parcela da população que declara não ter dinheiro para comprar comida passou de 20% em 2006 para 36% em 2021.

E é exatamente a constatação desses dados que agora desafia o governo Lula para reverter esse processo e ao mesmo tempo, rever o legado do programa Fome Zero e a necessidade de novos programas. O foco inicial do Fome Zero era a transferência de renda para que as famílias comprassem alimentos, mas não foi suficiente daí a necessidade de um conjunto integrado de políticas públicas, ou seja, o programa precisa ser ampliado e integrado a outras medidas para o combate a pobreza e a fome e não apenas, como ocorreu, em programa essencialmente voltado para a transferência de renda.

No dia 31 de agosto de 2023 foi lançado em Teresina (PI) o Plano Brasil Sem Fome. Trata-se de um plano a ser desenvolvido pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate a Fome (MDS) e mais 23 ministérios e visa integrar 80 políticas e ações sociais, com 100 metas organizadas em três eixos principais: acesso à renda, redução da pobreza e promoção da cidadania; Segurança Alimentar e Nutricional: Alimentação saudável da produção ao consumo e Mobilização para o combate à fome (que inclui à participação dos estados, municípios e da sociedade civil).
O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, recriado por Lula, recriou o Bolsa Família, inspirado no modelo anterior, mas visando ampliar, fortalecendo políticas que haviam sido criadas, mantendo as chamadas condicionalidades (exigências às famílias para que continuem recebendo a ajuda, como frequência escolar de crianças, vacinação em dia etc.).

O objetivo principal é tirar (novamente) o Brasil do Mapa da Fome e para isso a proposta de ações integradas como os sistemas de segurança alimentar, de assistência social e de saúde, além de um programa de alimentação no Sistema Único de Assistência Social, que a partir de compras da agricultura familiar, visa garantir a oferta de alimentos adequados e saudáveis.

O plano foi construído a partir do aprendizado da trajetória que levou o país a sair do Mapa da Fome em 2014. Programas como o Fome Zero e o Brasil Sem Miséria inspiraram a reativação de políticas públicas que fizeram do Brasil uma referência mundial no combate a fome.

Sua meta principal é o de tirar novamente o Brasil do Mapa da Fome até 2030; reduzir a extrema pobreza e a pobreza, com inclusão socioeconômica e reduzir a insegurança alimentar e nutricional. Fundamentalmente por meio da consolidação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), nos níveis federal, estadual, distrital e municipal possibilitar a efetivação do direito humano à alimentação adequada e saudável.

Nesse sentido o resgate dos conselhos com participação da sociedade civil, desmontado no governo Bolsonaro, é de fundamental importância, como Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) assim como a retomada de parcerias com organismos internacionais, visando à implementação da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN) e das metas do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANSAN).

O combate à fome, com políticas viáveis é certamente um dos programas mais importantes do governo Lula e em poucos meses já mostrou que essa deve ser uma de suas metas, com iniciativas e ações importantes como o reajuste do valor per capta do Programa Nacional de Alimentação Escolar, retomada do Bolsa Família, a valorização do salário mínimo, a retomada de programas como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), assim como o Plano Safra da agricultura familiar.

A erradicação da fome como prioridade para romper o círculo vicioso da pobreza e da fome de uma vez por todas. Como disse o presidente Lula no dia da posse em 1 de janeiro de 2023, ao ressaltar a necessidade de todos os brasileiros tomarem café da manhã, almoçar e jantar “Ter de repetir este compromisso no dia de hoje – diante do avanço da miséria e do regresso da fome, que havíamos superado— é o mais grave sintoma da devastação que se impôs ao país nos anos recentes”.

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