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Racha do PCB chega ao RN e leva 90% do partido, dizem dissidentes; comitê regional contesta
3 de outubro de 2023
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Enfrentando uma crise pública desde julho, o racha do Partido Comunista Brasileiro (PCB) chegou ao Rio Grande do Norte e levou 90% do complexo partidário, cerca de 70 pessoas, segundo os militantes envolvidos na saída. Eles agora se intitulam como Partido Comunista Brasileiro - Reconstrução Revolucionária (PCR-RR).
Os integrantes do PCB-RR participaram de uma plenária estadual no último sábado (30). Em uma nota, afirmaram que foi discutido os rumos do movimento comunista no RN, tomando a decisão de romper com os Comitês Central e Regional do PCB. Uma nova direção estadual provisória deve ser eleita nos próximos dias.
Entre os cerca de 70 militantes, nem todos são oficialmente filiados ou militantes orgânicos do PCB, segundo o estudante secundarista Juan Pablo, um dos quadros da nova organização, embora reivindiquem o partido. Ainda assim, são militantes do complexo partidário da sigla, que envolve o movimento de juventude (União da Juventude Comunista-UJC), de negros e negras (Coletivo Minervino de Oliveira) e LGBT (LGBT Comunista.
Juan diz que ele próprio não era formalmente militante do PCB, ainda que estivesse na direção nacional da juventude:
“Eu estou na Coordenação Nacional da UJC desde o final de 2021. Era para eu estar no partido já há algum tempo e nunca me recrutaram, nunca colocaram qualquer esforço em fazer isso. Nem eu e nenhum outro dirigente estadual da UJC, assim como dezenas de outras pessoas que entravam em contato conosco no estado e jamais foram absorvidas”, critica ele.
“Era uma situação em que a gente já vinha há algum tempo protestando internamente, buscando ser integrado, mas aqui há uma casta burocrática que não consegue levar nada para frente. Chegou ao ponto de eu ser expulso do partido sem estar nele", diz.
Agora, os membros recém-saídos continuam a pleitear um 17º Congresso Extraordinário do PCB, ação já negada pela direção nacional.
A crise que levou à divisão interna teve como estopim a publicização da participação de membros do Comitê Central em eventos da Plataforma Mundial Antiimperialista (PMAI) e se desdobra em distintas leituras das realidades internacional e brasileira e qual deve ser o papel do partido nelas.
Nacionalmente, o grupo tem nomes como o historiador Jones Manoel e o dirigente Ivan Pinheiro, que virá ao Rio Grande do Norte no final de outubro para participar de uma atividade pública com os dissidentes. Eles dizem que a PMAI promove uma desidratação do Movimento Comunista Internacional, com siglas e grupos a qual o PCB tem formalmente relações, além de outras consequências políticas para o partido expressas no "Manifesto em defesa da reconstrução revolucionária do PCB". Também criticam uma suposta inércia das direções da sigla em “subir” os militantes dos coletivos partidários e da juventude para as instâncias do “Partidão”, como a sigla também é conhecida.
Direção do PCB-RN reage
Em nota na noite deste domingo (1º), a atual direção do Partido no Rio Grande do Norte reagiu e comunicou o desligamento de toda a direção da juventude no estado.
“Tomamos esta medida de desligamento após a ex-direção da UJC/RN concretizar o início do processo de construção de uma nova organização política, sem vínculo com o PCB. O fato que subsidiou este acontecimento foi a realização de uma ‘Plenária’ (que não é uma prática organizativa nossa), e que foi convocada publicamente (por meios estranhos à nossa prática) ‘à revelia do CR [Comitê Regional] e do CC [Comitê Central]’ (segundo a sua convocatória)”, diz trecho da nota.
“De forma direta, trata-se de uma posição independente e de afrontamento às instâncias organizativas do PCB. Ressaltamos que a realização dessa "Plenária" (30.09) ocorreu mesmo após conhecimento da sua condição de ilegitimidade e que, ao ser realizada, se configuraria como a construção de uma nova organização política”, aponta o documento.
Procuramos dois dirigentes do Comitê Regional do PCB para comentar o racha, mas não obtivemos retorno até o fechamento desta matéria.
Segundo Rodrigo Albuquerque, do comitê regional, o percentual de saída de 90% da sigla é “completamente fantasioso”. Ele atribuiu à nova organização um papel de “desonestidade, a manipulação e desinformação” como prática recorrente. De acordo com ele, se fosse levado em conta apenas a quantidade de militantes na direção estadual do PCB, já não daria a porcentagem propagandeada.
“A agitação em torno desse percentual até pode fazer sentido se considerarmos a adesão apenas entre os e as militantes da UJC - ainda assim, embora certamente seja um volume importante, temos dúvidas do percentual”, frisou.
Ele lamentou o racha e disse que o prejuízo transcende a organização; atinge de modo mais amplo o campo da esquerda.
“Há muitas pessoas que estão ou ficarão desanimadas, frustradas e esgotadas com a dinâmica da militância”, lamentou.
“Outra preocupação que temos a partir de agora é com a possibilidade dessa nova organização tentar utilizar-se de nossa história, símbolos, etc, tentando se passar por nós (confundindo a classe trabalhadora, os/as estudantes e outras organizações políticas). Esta tem sido uma prática recorrente em diversos estados e, corrobora com essa preocupação, o fato de que, antes de avançarem na construção do RR, estiveram no nosso espaço e apropriaram-se indevidamente dos nossos materiais de agitação, como bandeiras, faixas e instrumentos musicais”, disse.
Legalidade
As mudanças na sigla não devem afetar o PCB nas eleições de 2024, já que o partido se encontra sem regularização na Justiça Eleitoral e até o momento não pode lançar candidatos no Estado. O último registro foi em 2020 e deveria ter encerrado em agosto deste ano, mas antes disso os comunistas já estavam suspensos por falta de prestação de contas.
Em 2018, outros dois cadastros do partido foram feitos, mas também suspensos. Um por decisão do partido, e outro por não informar o número do CNPJ no prazo de 30 dias.
Enquanto não podem disputar as eleições no Estado, o “Partidão” costuma apoiar outros candidatos. No ano passado, por exemplo, apoiou nomes do PSOL e da UP no primeiro turno, além de ter lançado Sofia Manzano como candidata própria à presidência. No segundo turno, depositou voto em Lula. A última vez que o PCB participou das eleições no RN com candidatos foi em 2012.