DEMOCRACIA

Professor da UFRN condenado por assédio moral reverte decisão

Por Kamila Tuênia e Rafael Duarte

Uma ação de assédio moral ajuizada pelo professor de Ciências Sociais da UFRN, Alípio de Sousa Filho, contra o chefe do departamento do curso César Sanson, foi julgada improcedente, por 2 votos a 1, pela Turma Recursal do Juizado Especial. O processo surgiu a partir do caso que ganhou repercussão nacional, às vésperas do Dia das Mães de 2018, em que a estudante Waleska Maria Lopes acusou Alípio Filho de expulsá-la de sala em razão da presença da filha de 5 anos. A aluna alegou à época que não tinha com quem deixar a criança enquanto assistia aula. O professor negou que tenha expulsado a estudante, mas admitiu que proibiu a presença da pequena nas aulas futuras sob a justificativa de que ela tirava o foco da turma e que o conteúdo da disciplina era impróprio para uma criança daquela idade.

Além do conflito entre professor e aluna, os juízes que julgaram a ação analisaram ainda acusações feitas por Alípio contra Sanson de homofobia e também de tentativa de fraude de um concurso para professor do Departamento de Ciências Sociais da instituição.

No acordão publicado pelo juiz federal Almiro Lemos, a conclusão é de que Alípio “não comprovou a existência de assédio moral na forma averbada na petição inicial, não sendo possível outrossim reconhecer a procedência do pedido por possível “assédio coletivo” ou mesmo a existência de “erro administrativo”, circunstâncias não articuladas como causa de pedir”.

Essa nova decisão muda o entendimento da 1ª instância, expedida em dezembro de 2019, na qual o juiz federal Adrian Soares de Freitas reconhecia o crime de assédio moral e determinava ainda o pagamento, a título de danos morais a Alípio Filho, de R$ 40 mil, sendo R$ 36 mil pela UFRN e R$ 4 mil por César Sanson.

Para o professor César Sanson, a Justiça restabeleceu a verdade dos fatos, reconhecendo que ele e a UFRN agiram de acordo com as prerrogativas legais diante das polêmicas envolvendo Alípio.

“Os argumentos do professor Alípio de Sousa foram rejeitados por absoluta falta de fundamentação e ausência de provas. A decisão da Justiça fez eco às decisões tomadas pela UFRN nos processos administrativos e sindicâncias internas movidos dentro da instituição que puniram o referido professor por comportamento anti-ético e anti-acadêmico. Neles, o professor Alípio foi responsabilizado pelas suas reiteradas práticas de intimidação, desqualificação de colegas e estudantes, agressões verbais, assédio moral e misoginia. A alegação em que se coloca como vítima de uma grande perseguição é uma farsa e, como tal, foi desmontada”, disse Sanson.

César Sanson foi condenado em 1ª instância, mas reverteu a decisão na Turma do Juizado Especial (foto: Matheus Mendes)

Leia o acórdão completo da decisão aqui

Acórdão

Os juízes desconsideram a acusação de homofobia contra Sanson não apenas por insuficiência de provas, mas por um “descompasso entre as provas e as alegações”. 

No caso envolvendo a estudante Waleska Lopes, Alípio responsabiliza a postura adotada por César Sanson, como chefe do Departamento, pelo linchamento nas redes sociais posterior que sofreu em razão do conflito. O professor alega que não teve direito à defesa e que não foi chamado para contar sua versão tão logo ocorreu o fato. Sobre essa acusação, o juiz Almiro Lemos, que assina o acórdão, também não viu elementos que configurem assédio:

– Embora notável o exagero das redes sociais e mesmo dos alunos, com a habitual contaminação por ideologias políticas rasas, é certo que o próprio autor esteve por demais envolvido em toda a problemática que lhe afetou, seja pela forma como conduziu a situação com a estudante no momento do infortúnio seja pela postura agressiva que permaneceu assumindo posteriormente.Já no que concerne à atuação do réu, não se vislumbra nos autos qualquer elemento seguro capaz de demonstrar que ele passou a praticar assédio moral contra o autor”, diz o magistrado no acórdão.

Outro aspecto detalhado por Alípio Filho foi o fato de Sanson ter autorizado a criação de uma nova turma de sua disciplina no mesmo horário para, segundo ele, esvaziar suas aulas na esteira da repercussão do episódio. O juiz admite a legalidade do questionamento do ponto de vista acadêmico, mas também não considerou assédio:

– Verifica-se claramente que a constituição de nova turma, por mais que possa ser questionada do ponto de vista acadêmico, como feito pela testemunha à qual se referiu a sentença não pode ser havida como um ato de assédio praticado pelo réu – essa a única tese do autor – por estar fora de sua alçada e ter envolvido, mesmo a consultoria profissional, mediante psicólogas que avaliaram o relacionamento do professor com a turma, demonstrando que constatou-se uma situação bastante excepcional”, disse.

Em relação à acusação de assédio moral em meio à fraude no concurso para professor do departamento de Ciências Sociais, Almiro Lemos também descarta. Na peça, Alípio Filho afirma que um grupo professores tentou afastá-lo da banca examinadora e, não obtendo sucesso, tentou-se “fragilizar o concurso” designando um relator que não fazia parte da banca. Esse relator teria pedido a não homologação do resultado do certame, além de sugerir a reclassificação dos candidatos e alterações de pontuações concedidas pelos avaliadores. O Ministério Público Federal chegou a ser acionado e recomendou a não homologação do concurso. Contudo, o resultado, com as respectivas notas, foi mantido.

“Diante deste contexto não há qualquer elemento seguro para apontar o assédio moral que o autor atribui ao réu em relação ao fato em questão, no que não andou bem a sentença no registro que fez, com a devida vênia”, diz a decisão.

Outras duas ações internas movidas por Alípio contra César na UFRN foram arquivadas.

Alípio mantém acusações e avalia recorrer ao STJ

Por 2 votos 1, Turma Recursal do Juizado Especial não viu elementos que comprovassem o assédio moral (foto: acervo pessoal)

Procurado pela agência Saiba Mais, o professor Alípio Souza Filho afirmou que seus advogados ainda estão avaliando se recorrerão da decisão junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ainda há prazo, diz.

Sobre a decisão da Turma Recursal, que torna sem efeito a sentença favorável a ele, o professor destaca que a vitória de Sanson não foi por unanimidade e que “não é porque a maioria dos juízes decide que os fatos não são verdadeiros. Há casos de sentença de morte, nos Estados Unidos, em que o réu é morto e só depois a verdade vem à tona. Há muitos casos assim nos EUA“, compara.

Alípio Filho reitera todas as acusações que fez à Justiça, enfatizando a tentativa de um grupo de professores do departamento de Ciências Sociais em fraudar um concurso, citando nominalmente os professores César Sanson e Gabriel Vitulo, hoje morando fora do país.

“Gabriel Vitullo, em concurso de 2015, pediu ao Chefe do Departamento, Cesar Sanson (e confirmado a mim pelo próprio César) a letra de Daniel Menezes para reprová-lo na prova escrita. Quando foi em 2018, no concurso que presidi, como GV e CS não puderam pilotar nada, e viram no resultado que Daniel foi aprovado, tentaram anular o concurso. Essa é a verdade sobre tudo o que ocorreu. O resto é mentira”, pontuou.

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Jornalista potiguar em formação pela UFRN, repórter e assessora de comunicação.