O PSOL nacional atualmente parece dividido, com um setor que defende candidatura própria à Presidência da República e outra parte que deseja apoiar a candidatura a presidente de Luís Inácio Lula da Silva. Como presidente do partido, como vê esse conflito?
O país vive um momento muito delicado. É natural que o debate sobre as saídas para superar a crise deste momento seja intenso. Acho legítimo que os companheiros e companheiras do PSOL defendam que uma candidatura própria do partido seja importante para apresentar nossas propostas no debate eleitoral. Mas também é legítimo quem considera, como aliás indicou nosso congresso realizado no ano passado, que a tarefa prioritária neste momento é derrotar Jair Bolsonaro. E sabemos que a prioridade é derrotar Bolsonaro. E, portanto, a melhor forma de derrotá-lo é fazendo parte desse amplo movimento que apoia a candidatura de Lula, para fortalecer essa candidatura e conseguir derrotar Bolsonaro. São duas posições legítimas. E é normal que haja debates e reflexões, e como presidente do partido, trato com naturalidade essa discussão em um partido democrático como o PSOL. Mas, espero que, uma vez tomada a decisão, o partido marche unido.
O ativista e ex-candidato a presidente da República Guilherme Boulos seria candidato ao Governo de São Paulo e justamente tomou a decisão de renunciar a essa candidatura e disputar para deputado federal e apoiar Lula. Como isso impactou o PSOL?
A decisão de Boulos vai ajudar o partido. Ele sendo eleito deputado federal, como esperamos, o partido vai superar a cláusula de barreira, vai aumentar a bancada federal e ele vai dar mais visibilidade à nossa bancada federal, que já realiza há muito tempo um trabalho muito forte, com nomes como Sâmia Bomfin, Talita Petrone, Ivan Valente, Luiza Erundina... e já tivemos deputados como Chico Alencar e Jean Wyllis. Então, Boulos como deputado federal qualifica a intervenção de Esquerda no Congresso Nacional e de certa forma tensiona para que a agenda da Esquerda no parlamento se volte mais para questões sociais. O que vai acontecer agora é um debate no partido sobre o que fazer em São Paulo e isso exige cuidado. Vamos construir uma unidade com a candidatura de Fernando Haddad ao Governo? Essa é a nossa questão. Mas quanto à decisão dele, foi um gesto de grandeza que o qualifica ainda mais como político.
No Rio Grande do Norte, o PSOL lançou a pré-candidatura de Danniel Morais. Na sua agenda em Natal, houve encontro com a governadora Fátima Bezerra, do PT, que tentará a reeleição. Há possibilidade de acordo estadual? O PSOL potiguar pode renunciar à candidatura ao Governo?
Quero deixar claro que a decisão da tática eleitoral do PSOL do Rio Grande é a decisão que será mantida. E a decisão do partido aqui foi a de ter candidatura própria e o nome escolhido foi o do companheiro Danniel Morais. Se a militância no Rio Grande do Norte assim decidiu, isso está absolutamente assegurado. Não há nenhuma hipótese de intervenção sobre decisões estaduais do partido aqui ou em qualquer Estado. Quanto ao encontro com Fátima, viemos trazer nossa solidariedade pelos ataques machistas e misóginos que ela vem sofrendo sistematicamente, e manter uma relação política. Já a conheço de diversos congressos, já nos encontramos em um evento político nos Estados Unidos. Então, o encontro também foi para construir pontes, até tendo em vista um possível segundo turno.
Chamou a atenção nas fotos do encontro com Fátima que não havia nenhum membro potiguar do partido, nem mesmo o vereador Robério Paulino, nome de maior destaque do PSOL no Estado e que já foi candidato ao Governo do Estado.
Quero deixar claro que Robério foi convidado para todas as agendas que tivemos e temos em Natal. Se ele não compareceu, é uma questão que deve ser perguntada ao próprio Robério.
Para além da estratégia do Congresso Nacional, o PSOL está focado em eleger governadores e deputados estaduais?
Com certeza. Mas, nossa prioridade, como definido no congresso realizado em setembro do ano passado, é ampliar a bancada do partido no Congresso Nacional. A agenda principal do PSOL, como a revogação das reformas, passa obrigatoriamente pelo Congresso. Nós vamos, para compor com Lula, cobrar que ele revogue o teto de gastos, as reformas trabalhista e previdenciária, mas sabemos que Lula não pode fazer isso de forma antidemocrática, com uma canetada. Essa reconstrução do Brasil passa pelo Congresso e é essa, a ampliação da bancada para lutar por essa agenda, a contribuição que o PSOL quer dar ao país.
Existe uma percepção na opinião pública de que o PSOL é um partido sério e honesto, mas, ao mesmo tempo elitista, que só teria votos em "guetos" intelectuais. Como vencer essa barreira e dialogar com setores mais populares?
É uma boa pergunta. Fazemos ela no partido, Temos consciência que ideias contra hegemônicas, contra o senso comum, são de difícil absorção por parte dos setores mais populares. Há uma cultura hegemônica que impede nossas ideias de circularem a não ser em espaços que possibilitam debate e reflexão. Temos consciência que é impossível fazer a transformação profunda que queremos no país, sem a participação massiva do povo brasileiro. Qualquer partido socialista que queira transformar a realidade precisa estar conectado às lutas sociais e aos movimentos populares. Mas temos ampliado esse movimento. Vou dar exemplos: a vitória de Edmilson Rodrigues para o Governo do Pará e a votação de Boulos, que foi ao segundo turno para a Prefeitura de São Paulo. Se olhar o mapa de Boulos, ele perde em muitos setores de classe média e ganha em muitos bairros periféricos PSOL está se enraizando. Mesmo no Rio onde há esse olhar distorcido, temos, por exemplo, três mulheres negras oriundas da favela na Assembleia Legislativa.