DEMOCRACIA

OAB/RN alerta governadora que tensão entre sindicato de agentes e gestão penitenciária dificulta combate à tortura

Após repercussão do relatório que revela tortura dentro da Cadeira Pública de Ceará-Mirim, a Ordem dos Advogados do Brasil do Rio Grande do Norte (OAB/RN) emitiu uma carta nesta segunda-feira (30) endereçada à governadora Fátima Bezerra.

A nota reconhece o trabalho realizado pelo secretário de Administração Penitenciária, Pedro Florêncio Filho, mas expressa preocupação com a tensão entre o gestor e o sindicato que representa os agentes, bem como os posicionamentos da presidente sindical.

A OAB lembra declaração violenta da presidente do Sindicato dos Policiais Penais do RN (Sindpen), Vilma Batista, ao comentar a fuga de 12 presos de Alcaçuz: que “o que segura preso é bala”.

O documento pede que a governadora assegure Secretaria de Administração Penitenciária “todo o instrumental necessário para que possa cumprir com suas atribuições. O momento de agora exige oferecer expresso suporte à pasta. A tortura é um crime hediondo e não deve passar impune”.

De acordo com fontes ouvidas pela agência Saiba Mais, o Sindicato busca o desgaste de Florêncio. Uma das iniciativas que têm desagradado a entidade é justamente a abertura de procedimentos para investigar crimes de tortura dentro dos presídios.

A atual administração passou a adotar novos procedimentos de apuração. Assim que a gestão recebe a denúncia de um interno torturado nas dependências de algum presidio, encaminha o detento para a realização de exames de corpo de delito para averiguar também de quem partiu os maus-tratos.

Outra medida que estaria desagradando parte dos policiais penais é a aquisição de um scanner de corpo inteiro para a revista de familiares de presos, acabando assim com as cenas humilhantes, especialmente para mulheres, de revista íntima.

Confira a nota da OAB/RN:

CARTA À GOVERNADORA DO ESTADO

Por: Comissão de Direitos Humanos e Comissão de Segurança Pública e Política Carcerária

A Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Estado do Rio Grande do Norte, com expressa manifestação de apoio vinda de sua Comissão de Direitos Humanos e de sua Comissão de Segurança Pública e Política Carcerária, vem, por meio do presente documento, manifestar profunda preocupação com a situação do sistema prisional norte-riograndense.

Nos últimos dias, a Comissão de Direitos Humanos da OAB/RN recebeu dezenas de denúncias reportando violações gravíssimas aos direitos daqueles que cumprem pena privativa de liberdade no nosso Estado. Bombas de gás, balas de borracha e lesões corporais são apenas alguns dos fatos reportados através de mensagens que já foram devidamente encaminhadas ao Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura para fins de apuração e inspeção local.

Em meio a essa caótica e preocupante situação, através de notícia veiculada na mídia local, foi possível observar manifestação proferida pela liderança do sindicato policial expondo que “o que segura preso é bala.”

Não há como receber a missão institucional de prezar pela legalidade e respeito aos direitos sem agir diante de uma conjuntura tão delicada e preocupante. A OAB/RN jamais poderia ser omissa diante de tão grave situação colocada diante dela.

O sistema penitenciário brasileiro vive uma terrível conjuntura de estado de coisas inconstitucional já reconhecida, inclusive, pelo Supremo Tribunal Federal. O Estado do Rio Grande do Norte, pelo que se descreve aqui, parece não fugir à regra.

Esse fato de constante irregularidade, ilegalidade e inconstitucionalidade é muito bem delineado no último relatório produzido pelo Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura. Após inspecionar unidades prisionais do Estado do RN, o Comitê demonstrou mediante dados, fatos e ilustrações inúmeras e recorrentes violações à lei de execuções penais.
Através dessa carta, a OAB/RN demonstra a sua profunda preocupação com a atual situação de ilegalidade e violação de direitos nas unidades prisionais do RN.

A situação em questão, marcada por aspectos históricos e estruturantes que dificultam a sua imediata resolução, precisa ser analisada pelo governo com urgência e olhar atento à complexidade que a envolve.

Tensões entre membros do sindicato e a administração penitenciária podem dificultar o adequado enfrentamento do caso. É fundamental que o Governo do Estado assegure todo apoio e suporte necessários à eficiente atuação da administração penitenciária. É preciso reconhecer aqui a qualidade do relevante e criterioso trabalho realizado pelo Secretário de Administração Penitenciária, o senhor Pedro Florêncio Filho. Ele, ao longo de sua atuação, tem realizado esforços para ser combativo no sentido de tentar garantir o absoluto respeito à legalidade no sistema prisional potiguar. A legalidade, especialmente no que diz respeito ao cumprimento do conteúdo da lei de execução penal, é imprescindível ao regular e harmonioso funcionamento do sistema prisional.

Reivindicamos, portanto, da Governadora do Estado do Rio Grande do Norte, que assegure à pasta da administração penitenciária todo o instrumental necessário para que possa cumprir com suas atribuições. O momento de agora exige oferecer expresso suporte à pasta.

A tortura é um crime hediondo e não deve passar impune.

Não é porque a solução do atual estado de coisas inconstitucional não é simples que é digno e adequado se conformar diante dessa conjuntura. A defesa da legalidade, dos direitos fundamentais e do Estado Democrático de Direito não pode jamais ser abandonada.

Ordem dos Advogados do Brasil/RN
Comissão de Direitos Humanos da OAB/RN
Comissão de Segurança Pública da OAB/RN

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Isabela Santos é jornalista e repórter da agência Saiba Mais