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Procurador de Natal diz que não se pode levar em conta apenas questão ambiental em votação do Plano Diretor de Natal

O procurador do município, Fernando Benevides, afirmou durante audiência pública na Câmara Municipal de Natal, na manhã desta sexta (22), que “não pode ser um Plano Diretor que tenha um olhar só para a questão ambiental. A gente tem que ter um plano Diretor equilibrado“. O recado foi para os vereadores do legislativo natalense que receberam o Plano da Prefeitura de Natal, com todas as modificações, para que fosse votado em regime de urgência até dezembro deste ano.

Benevides ainda disse que Natal ficou pra trás de João Pessoa, onde ele morou há 15 anos, quando se dizia que a cidade tinha duas coisas boas: “a saída pra Natal e a saída pra Recife”. O avanço do estado vizinho seria, na avaliação do procurador, fruto do Plano Diretor. Fernando Benevides, no entanto, esqueceu de esclarecer que uma das limitações impostas pelo Plano Diretor de João Pessoa, é a de construção de prédios com mais de 12,9 metros de altura na orla da praia. A aprovação do aumento do gabarito de construção em vários pontos de Natal, inclusive em trechos da orla da capital potiguar é, justamente, um dos principais pontos de pressão dos empresários do setor imobiliário.

“O Brasil é um pais montado no ombro do escravo, da segregação. Nos projetos feitos pelos arquitetos nesses prédios de classe média de 250 metros quadrados, são reservados três ou quatro metros para a empregada. Eu tenho medo que estejamos reeditando aqui a mesma ideia com esses estúdios de dez metros quadrados. Nós precisamos de outra proposta de habitação popular, que essa cidade não tem”, criticou o vereador Robério Paulino (Psol), ao se referir a outro ponto discutido durante o encontro. Uma nova audiência sobre Plano Diretor já está agendada para a próxima quarta (27), com a presença do Ministério Público do RN.

Manifestantes criticam ocupação de cadeiras no plenário por empresários

Manifestantes que tentaram acompanhar uma audiência pública iniciada na manhã desta sexta (22), na Câmara Municipal de Natal, para discutir o Plano Diretor da capital, denunciaram que as cadeiras no Plenário estariam sendo ocupadas por vereadores e empresários, o que inviabilizou a presença no mesmo espaço de membros da sociedade civil interessados em acompanhar as discussões.

Outra reclamação foi o controle da fala de populares no microfone do Plenário, que é comum em eventos como audiências públicas, quando o espaço é aberto para discussões mais amplas com a participação da população.

“Eu me inscrevi para falar com minha própria voz o que eu penso do Plano Diretor e como eu posso contribuir. Sou da Urbana e tem a questão da gestão dos resíduos que não está inclusa nesse Plano Diretor, mas estou sendo provado [de falar]”, criticou um dos participantes que conseguiu entrar na galeria, espaço destinado ao público que assiste às sessões.

Movimentos sociais já tinham feito um protesto na manhã desta sexta (22), em frente à Câmara de Vereadores por causa da maneira atropelada com que a votação do Plano Diretor de Natal, prevista para dezembro, tem sido conduzida. Os parlamentares terão menos de dois meses para analisar a proposta e uma Comissão Especial foi criada para sistematizar as discussões em audiências públicas, como a de hoje. Ficou acertado que as audiências sobre o Plano devem ser realizadas todas as sextas. A assessoria de imprensa do vereador Aldo Clemente (PDT), que preside a Comissão Especial, negou problemas em participação do público na audiência.

O Plano Diretor de Natal foi revisado em meio à pandemia de covid-19 pela prefeitura, num processo marcado por críticas de diversos setores da sociedade, inclusive do Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN), ao formato virtual e à falta de transparência.

O atual Projeto que está na Câmara traz várias modificações em relação ao plano atual, que é de 2007, e é um contrassenso em relação a tudo que vinha sendo construído na pauta ambiental na cidade. Segundo o MPRN, Natal já vive um processo de erosão da orla, problema que pode ser agravado com a proposta de verticalização da beira-mar prevista no projeto alterado enquanto estava com a Prefeitura de Natal. Além disso, as propostas contidas no Plano Diretor sugerem mudanças que podem elevar a temperatura na cidade sem a realização de qualquer estudo de impacto ambiental.

As mudanças que chegaram à Câmara Municipal foram votadas nos dias 14 e 16 de junho, durante a Conferência Final de Revisão do Plano Diretor de Natal. Em maio de 2020, o MPRN entrou com uma ação civil pedindo a suspensão da pré-Conferência do Plano Diretor que foi realizada de maneira virtual, além da publicação no site da Prefeitura da minuta final com as modificações votadas durante o Concidades, ainda em março de 2020. A ação está sub judice em segunda instância.

Manifestantes protestam próximo à Câmara Municipal de Natal I Foto: cedida

Principais mudanças no Plano Diretor de Natal:

Altura dos prédios

A altura máxima dos prédios permitida hoje, de acordo com Plano Diretor em vigor desde 2007 é de 65 metros (22 pavimentos) em alguns bairros e de 90 metros (30 pavimentos) em outros. Mas, a proposta atual é permitir a construção de prédios com até 140 metros (46 pavimentos) em toda a cidade, independentemente de qual região esteja localizado o imóvel.

Imagem: MPRN

Praia da Redinha

Para a região que abrange a Praia da Redinha e o Rio Potengi, a zona especial de interesse turístico 04, a proposta é que a autorização de construção passe dos atuais 7,5 metros (2 pavimentos) para 30 metros de altura nas construções (30 pavimentos). Com isso, seria possível a construção de prédios mais altos em toda essa região da orla, o que modificaria o sistema de circulação de ventos na cidade e poderia ampliar a área de sombra na beira-mar, um problema já vivenciado por outras cidades do litoral.

A proposta ainda prevê uma regulamentação futura, mas já permite a construção imediata na beira-mar sem qualquer metodologia ou estudo de impacto paisagístico. O Ministério Público sugere um Plano de Intervenção específico para a orla que seja discutido com toda sociedade e lembra da degradação já sofrida com a erosão costeira.

Imagem: MPRN

Modificações diminuem áreas de proteção

Com as modificações, o novo Plano Diretor diminuiria as Zonas de Proteção Ambiental (ZPA’s), que são áreas demarcadas dentro da cidade por causa de sua importância ecológica, paisagística ou de sua fragilidade e que, por lei, precisam ser preservadas e recuperadas.

Nessas áreas, há restrição total ou parcial para uso e ocupação do solo, são áreas de dunas, manguezais, lagoas e vegetação, por exemplo. Natal tem, ao todo, dez Zonas de Proteção Ambiental e pela proposta, retira a proteção das ZPA’s 1, 8 e 10.

A ZPA 1 abrange a região do aquífero do San Vale, utilizado para abastecer a população de quase toda a Natal já que possui menor grau de contaminação da cidade. É de lá que sai a água que vai para as zonas sul, leste e oeste da capital.

Já a ZPA 8 diz respeito ao estuário dos rios Potengi e Jundiaí. A área abrange os frágeis ambientes naturais, tanto terrestres quanto aquáticos. A vegetação local é importante para conter os processos erosivos do solo, além do potencial paisagístico e ambiental. A ZPA 8 foi delimitada no Plano Diretor de 1994.

As modificações propostas para a ZPA 10 permite a verticalização daquela região da Via Costeira, semelhante àquela ocorrida na Praia de Areia Preta.

Imagem: MPRN

Verticalização na área do Parque das Dunas

Pelo atual Plano Diretor, o limite para construções no entorno do Parque das Dunas varia de seis metros (2 pavimentos) a 30 metros (10 pavimentos). Mas, pela proposta de modificação, o limite máximo sobe para 140 metros (46 pavimentos). No caso do Parque das Dunas, a altura permitida das construções passaria dos atuais seis a 12 metros para 140 metros. A mudança também afetaria regiões como Potilândia, que passaria de seis para 140 metros. O mesmo pode acontecer no Conjunto dos Professores (construções passarão de seis para 140 metros), na região do Campus Universitário da UFRN (seis a 12 metros para 140 metros), em Lagoa Nova (de 15 metros para 140) e no Tirol (de 30 metros para 140).

O gabarito de construção para a região no entorno do Parque das Dunas existe desde 1994, como forma de garantir o equilíbrio climático da cidade e algo que muitas capitais sofrem hoje por terem devastado no passado: o bem-estar, a qualidade de vida de seus habitantes e o valor paisagístico.

Houve uma tentativa de modificar essa regra em 2007, mas ela acabou sendo derrubada. Segundo as promotoras do MPRN que estudam as mudanças sugeridas, as atuais propostas são ainda mais agressivas. Uma das principais preocupações com as construções nessa região é a diminuição da ventilação na cidade. Além disso, os prédios também impediriam a visualização do cordão de Dunas do Parque.

Imagem: MPRN

Vegetação próxima a rios desprotegida

As faixas de vegetação próximas a rios são consideradas Áreas de Preservação Permanente (APP) porque são importantes para preservação do curso de água, que sofre com erosão e assoreamentos, o que diminui o volume de água. É das margens do Rio Doce, por exemplo, que é retirada a água para abastecimento de grande parte da Região Norte da capital.

Imagem: MPRN

Eixos estruturantes

As modificações no Plano Diretor também incentivam o aumento de edifícios nas proximidades das principais vias, que passam a ser chamadas de “eixos estruturantes”. Com isso, nessas vias os interessados poderiam construir até 50% a mais do que nos demais lotes do mesmo bairro, independentemente da capacidade da infraestrutura em suportar essa carga, como no caso do esgotamento sanitário.

A proposta prevê que seriam consideradas eixos estruturantes as avenidas Alexandrino de Alencar, Av. Ayrton Senna, Av. Bahia, Av. Cel Estevam (Av. 9), Av. da Integração, Av. das Fronteiras, Av. Deodoro, Av. Duque de Caxias, Av. Florianopolis, Av. Guadalupe, Av. Hermes da Fonseca, Av. Interventor Mário Câmara (Av. 6), Av. Itapetinga, Av. Jaguarari, Av. Jerônimo Câmara, Av. João Medeiros, Av. Maranguape, Av. Moema Tinôco, Av. Mor Gouveia, Av. Nevaldo Rocha, Av. Paulistana, Av. Prudente de Morais / Av. Omar O’Grady, Av. Rio Branco, Av. Rio Doce, Av. Rio Grande do Norte, Av. Rio Grande do Sul, Av. Roberto Freire, Av. Salgado Filho, Av. Senhor do Bonfim, Av. Tocantínea, Av. Tomaz Landim, Av. Xavantes, BR-101, Rota do Sol (Av. Dep. Antônio Florêncio de Queiroz), Rua Agrestina, Rua Eng. João Hélio, Rua Mira Mangue, Rua Conselheiro Tristão e Rua Monte Rei.

Estacionamentos

Com a modificação, os interessados poderão construir unidades multifamiliares com 10,4m2, com um quarto e um banheiro, sem a necessidade de caga para estacionamento. Pelas regras atuais, edifício residencial multifamiliar com área construída de até 50m² precisa ter uma vaga de garagem por apartamento, duas vagas no caso de edifício residencial multifamiliar área construída de até 50m² a 150 m² e uma vaga a cada dois apartamentos no caso de Hotel ou Apart Hotel de até 50m².

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