Médicos brasileiros são humanos?
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Médicos brasileiros são humanos?

14 de dezembro de 2018
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Na última semana estava eu a passear pelas redes sociais quando meio que de repente me vi envolvido em uma discussão sobre a humanidade dos médicos brasileiros. Um senhor de meia idade me interpelou de forma ríspida:

- “Os médicos brasileiros em sua grande maioria não são humanos no seu trato com os pacientes. E servem somente pra uma lógica mercantilista e pecaminosa com a indústria farmacêutica. Como que o senhor tem a “pachorra” de se considerar progressista e ser médico ao mesmo tempo?”

Desconsiderando a deselegância do senhor e as dificuldades de se debater sem agredir no meio das redes sociais, achei interessante abrir uma reflexão sobre a humanidade dos médicos brasileiros. E vou começar com a pergunta que eu o fiz e que finalizou o debate.

“O que dentro da sociedade capitalista onde vivemos não possui uma lógica mercantilista?”

Pra mim aqui está o cerne dessa questão. Não vivemos isolados nas nossas profissões, estamos conscientes ou não, sempre nos posicionando em troca de bens ou serviços visando o bem estar e também o lucro. Essa é a natureza da nossa sociedade de consumo e isso cria cicatrizes em todos nós.

A formação médica pré-industrial tinha uma base muito mais ampla que considerava a formação filosófica e antropológica no binônimo saúde-doença. Ao longo do último século fomos mudando progressivamente para atender um novo conceito de sociedade, agravando após a década de 60, 70 com a “mecanização” exuberante dos exames de imagem. Hoje todo mundo vai a uma consulta médica ansiosos pelos exames de alta tecnologia que ele pode fazer.

Isso cria problemas na formação médica, pois se tenta “materializar” no Biologicismo todas as “angústias” de uma sociedade moderna. E o estudante de medicina se frusta pois ele não consegue, mesmo com toda a tecnologia, explicar a epidemia de Depressão e Transtorno de Ansiedade que temos no mundo atualmente (por exemplo). Já há um grande debate dentro do ensino médico, da importância de aproximarmos os estudantes das pessoas, trabalhando empatia e controle das emoções como pilares. Mas é verdade que ainda estamos caminhando lentamente nessa questão.

Mas será que a formação de um jornalista, engenheiro e ou advogado também não precisa ser revista? E será que se mantivermos a lógica funcional da nossa coletividade amparada no consumo desenfreado vamos conseguir mudar somente melhorando o ensino universitário? São questões interessantes e que possuem respostas complexas. Mas se simplificarmos esse debate escolhendo como nossos vilões os médicos, podemos até “lacrar” nas redes sociais, mas dificilmente sairemos disso.

Temos graves problemas na formação médica e no perfil social elitizado dos estudantes de medicina. E isso precisa de políticas públicas a médio e longo prazo para “humanizar” o ensino e acelerar a entrada na universidade de estudantes das regiões remotas e de baixa renda. Mas isolar e criminalizar somente os médicos, além de não resolver o problema, aumenta o afastamento desses profissionais dos pensamentos progressistas. Paradoxalmente exigimos humanidade deles mas atuamos com a “pachorra” da antipatia para conseguir.

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