Meu caro leitor e minha cara leitora, já começo logo pedindo uma coisa para você: pare 10 segundos e pense qual a coisa que mais tem te cansando recentemente. Pensou? Obviamente, não tenho como saber sua resposta, nem é essa a intenção do texto. Mas aqui vai a minha: estou cansado de Brasil.
É quase como o que magistralmente relatou Eliane Brum em sua coluna “Doente de Brasil”, para o El País. Um cansaço de ver as mesmas coisas acontecendo e não acontecendo. É a menina Agatha assassinada e nada acontece.
Um chefe de governo defende dia sim e outro também a morte de pobre e preto, nada acontece. Um atleta racista só precisa mudar de nome para continuar sendo louvado, enquanto a vítima é relegada ao ostracismo. Um maquiador vira alvo porque usou uma mulher negra para mostrar seu trabalho. E tudo isso cansa, muito.
E cansa porque as vozes que se levantam são sempre as mesmas. Até quando surge um discurso (infelizmente) histórico como o do técnico de futebol Roger Machado - nada mais irônico que tenha sido no Maracanã que matou o goleiro Barbosa em 1950 - são as mesmas pessoas que falam, repercutem e compartilham. Nada muda...
E isso só vai mudar quando as vozes forem outras. Não basta, meu caro leitor e minha cara leitora, ser apenas contra o racismo. Isso não é nada, sinceramente. A sua obrigação é ser anti-racista. Ainda mais vivendo no porto que mais recebeu gente escravizada no maior fluxo de “imigração” forçada da história e que vê até hoje o Estado agindo contra o mesmo povo.
Só quando o Brasil encarar seu maior demônio, que é o legado da escravidão, não veremos mais Roger’s se esgoelando para dar uma aula a quem já deveria ter aprendido aquilo tudo há muito tempo.
Parece que certo mesmo estava Nabuco, quando disse que “a escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil”. Só acho que ele não imaginou que seria por tanto tempo.