Maio Amarelo: Reduzir os danos de sinistro no trânsito é reduzir velocidade
Natal, RN 29 de mar 2024

Maio Amarelo: Reduzir os danos de sinistro no trânsito é reduzir velocidade

16 de maio de 2023
Maio Amarelo: Reduzir os danos de sinistro no trânsito é reduzir velocidade

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 Por John Fontenele Araujo

O Movimento Maio Amarelo que tem o objetivo de colocar em pauta o complexo tema do TRÂNSITO para toda a sociedade foi criado no Brasil pelo Observatório Nacional de Segurança Viária. A estratégia tem sido o de estimular a participação da população, em especial dos usuários, da sociedade civil organizada, de empresas e dos governos em todos os níveis em uma discussão, desenvolvimento e implantação de ações para um trânsito mais seguro e humano. A implantação do Maio Amarelo foi com base na resolução de uma Assembleia-Geral das Nações Unidas em foi que definido que a fase de 2011 a 2020 como a “Década de Ações para a Segurança no Trânsito”. A escolha do mês de maio foi em decorrência da resolução da ONU ter sido publicada em 11 de maio de 2011. A proposta era reduzir em 50 % o número de acidentes de trânsitos.

A necessidade do Movimento Maio Amarelo fica evidente quando compreendemos a história do desenvolvimento das nossas cidades. Peter Norton, um historiador norte americano, explica que, apesar das cidades terem sido construídas pelos seres humanos, hoje, diferente da sua origem, elas não estão sendo arquitetadas para as pessoas, mas para um modelo econômico e por isso seu principal modelo de mobilidade é direcionado para o automóvel individual.

Peter Norton sugere que o desenvolvido da mobilidade nas cidades seguiu um processo histórico e que pode ser divido temporal em quatro paradigmas: Segurança em primeiro lugar (1900 – 1920); Controle (1920 – 1960); Segurança no Carro (1960 – 1980) e Responsabilidade (1980 até agora).

Peter Norton dividiu a história em paradigmas para explicar a “ditadura dos automóveis” dos dias atuais e como esse processo foi possível e aceito passivamente pela sociedade. Sua proposição é baseada no conceito de segurança. Para Peter em cada fase histórica o conceito de segurança mudou e adaptou a construção das cidades.

O primeiro paradigma, que ele chama de “segurança em primeiro lugar”, é da fase inicial em que houve a introdução do automóvel nas cidades, momento este em que os homens e as mulheres como pedestres ainda eram valorizados e que os acidentes eram sempre um problema dos automóveis. O ser humano como pedestre sempre era considerado inocente quando ocorria um sinistro.

O segundo paradigma, chamada de “controle” por Peter, foi uma superação e negação do primeiro, pois negava a sua premissa básica de que o pedestre sempre tinha razão. Neste momento, o entendimento era que as causas dos acidentes era a falta de regras que controlasse o trânsito. Mudando radicalmente o olhar sobre a organização das cidades, pois foi deixado de se valorizar as pessoas e passou-se a valorizar as regras. Nesta fase é que ocorrem o surgimento dos primeiros códigos de trânsitos e novas leis são estabelecidas. Além das novas regras de trânsito, uma arquitetura para as cidades surge, onde um novo desenho das ruas e avenidas são elaborados para um melhor controle e um tráfego seguro para os automóveis.

Com o desenvolvimento das cidades e o aumento da circulação dos automóveis, principalmente em decorrência das facilidades criadas pelas novas regras e as novas vias, o número de sinistro no trânsito aumentou e é claro que suas consequências ficaram mais graves, incluindo um aumento de mortes em decorrência dos acidentes. Nesta época então surge um novo paradigma: “segurança nos carros”. Nesta fase passou-se a admitir que os acidentes são inevitáveis, então, devemos criar mecanismos em que os veículos sejam mais seguros. É neste momento que surgiram o cinto de segurança e os airbags, os chamados sistemas de restrição dos condutores. Também nesta fase é que se inicia de forma aprofundada uma maior segregação entre os veículos e os pedestres.

Já no final do Século XX surge o quarto paradigma, chamado de “responsabilidade”. Ele não negou o paradigma anterior em sua totalidade, pois não retorno a ideia de que o pedestre deveria ser sempre considerado como inocente nos sinistros de trânsito. Todavia, ele trouxe de volta a responsabilidade para o condutor dos automóveis sobre os sinistros. Nesta fase surgem os sistemas de segurança automáticos, tais como o cinto de segurança automático e a obrigatoriedade de airbags em todos os veículos, além de novas regras de limites de velocidades. Ficou ainda devendo o retorno à concepção de que o importante são as pessoas, como os pedestres. Ou seja, a cidade é para as pessoas e não para os carros.

Atualmente os dados acerca das consequências sociais e econômicas dos acidentes de trânsitos são alarmantes, pois estes acidentes custam cerca de 3% do Produto Interno Bruto. Além disso, hoje sabemos que a principal causa de morte entre crianças e jovens de 5 a 29 anos são acidentes de trânsito. Uma situação inaceitável.

Um fator que está diretamente relacionado com a gravidade dos acidentes é a velocidade dos automóveis. Um automóvel com velocidade de 30 Km/h gera lesões leves em pedestre, com 40 Km/h as lesões são moderadas, com 50 Km/h as lesões já são graves e a partir de 60 Km/h há uma alta probabilidade de morte em decorrências das lesões.

Assim, entendemos que o enfoque deva ser no desenvolvimento de cidades com mobilidade segura, um transporte seguro para todos os usuários das vias. Essa estratégia considera uma vulnerabilidade das pessoas às lesões graves no trânsito e reconhece que o sistema deveria ser projetado para sempre aceitarmos que ocorrerão erros humanos. Assim, devemos entender que os sinistros podem ocorrem por problemas nos veículos, nas vias e nos condutores. Então, a estratégia na construção de vias e corredores seguros, mas não pensando em reduzir a zero os acidentes, mas sim em reduzir os danos destes acidentes. Assim, o enfoque é na velocidade segura, em uma velocidade abaixo dos 40 Km/h para reduzimos os danos dos acidentes, contribuindo para eliminar as lesões fatais e reduzir lesões graves no trânsito.

Por isso, neste Maio Amarelo de 2023 quando estamos reforçando a importância de ações para reduzir acidentes de trânsito, devemos lutar para que as velocidades permitidas para os automóveis sejam reduzidas nas cidades. Para que as cidades sejam para as pessoas e não dos automóveis. Neste Maio Amarelo a escolha é pela vida e passa pela redução da velocidade, ou então estaremos apenas acelerando a nossa ida ao cemitério.

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John Fontenele Araujo é médico e professor titular da UFRN

contato: [email protected]

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