O sonambulismo na Educação ou abram as escolas em meio ao pico da pandemia!!
Natal, RN 20 de abr 2024

O sonambulismo na Educação ou abram as escolas em meio ao pico da pandemia!!

9 de abril de 2021
O sonambulismo na Educação ou abram as escolas em meio ao pico da pandemia!!

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Desde o início da pandemia a Organização Mundial da Saúde vem afirmando que uma das práticas eficazes de diminuir o contágio da covid-19 é o distanciamento social e a consequente diminuição de circulação das pessoas. A organização destacou em seus relatórios quais os setores que seriam prioritários para funcionamento incluindo entre eles a venda de alimentos em mercados (não em restaurantes e bares), instituições farmacológicas e de saúde e a educação básica. Mas também afirmou ser de responsabilidade dos governos fazer a definição dos setores que deveriam abrir ou fechar.

Em nosso mundo capitalista global se decidiu por fechar as instituições educativas e manter o comércio pois, como poderíamos resistir sem economia funcionando? Sob a alegação de que o ensino poderia migrar completamente para o modelo remoto, a comunidade educacional foi confinada em suas casas. Professores tiveram que aprender a fórceps como lidar com as plataformas virtuais (compradas dos grandes conglomerados que viram nisso um mercado), a lidar com a distância no contexto de aprendizagem, a ver sua casa e intimidade invadidas, a não ter mais hora de trabalho. Além de custear o acesso a internet e a compra de equipamentos melhores para o trabalho.

As crianças e jovens, das classes médias e elites, foram submetidas a horas intermináveis de videoconferências que se transformaram em espaços de aulas, ao estresse cognitivo e físico de estar em frente as telas e ter de dar conta, monitorados pela família, de aprender nesse novo modelo.

As crianças e jovens das classes trabalhadoras, sem acesso digital, sem equipamentos e espaços físicos adequados, vivendo a maior crise econômica que esse país já teve, com 20.000.000 de pessoas desempregadas ou desalentadas, foram ficando pelo caminho. Mesmo com esforços pontuais de redes de ensino e das escolas que tentaram, dando nó em pingo d’água, se aproximar dos estudantes.

Segundo os dados do PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) há uma evasão de 4 milhões de meninos e meninas da Educação Básica. Isso fruto da pandemia e do fechamento das escolas por mais que um ano, que deveria ter sido usado só em momentos de pico.

Diferente de outros países, que além de reconhecerem rapidamente a necessidade da educação presencial, providenciaram a compra de vacinas, o Brasil negou a pandemia, abriu setores da economia e fechou a educação. O ensino superior, mais bem equipado, resistiu no remoto. As empresas educacionais maiores também.

Mas e a rede pública? O Congresso Nacional acaba de divulgar relatório de estudos sobre o repasse financeiro do MEC à educação básica que diminuiu 59,2% em 2020, ou seja, a educação básica brasileira deixou de receber algo na ordem de 1 bilhão e 600 milhões de reais em plena pandemia. Do orçamento de guerra previsto para enfrentamento da COVID19 nas áreas de Saúde, Educação, Meio Ambiente e Direito à Cidade, deixaram de ser aplicados 80,7 bilhões de reais, segundo o Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC). No início de 2021, o presidente em exercício vetou projeto de lei que previa inclusão digital para professores e estudantes das redes públicas de ensino.

Na última semana a UNICEF (Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância da ONU) publicou avaliação sobre as perdas educacionais no ano um da pandemia. Florence Bauer, representante do UNICEF no Brasil, afirmou "Por isso dizemos que as escolas devem ser as últimas a fechar e as primeiras a reabrir", ao comentar os resultados do relatório. Defendendo a mesma posição da OMS desde o início da pandemia.

Como sonâmbulos, vários segmentos de autoridades (deputados, vereadores, ministérios públicos) do país e do nosso estado se levantaram para repetir a frase dita por Bauer na tentativa de forçar o retorno presencial do ensino escolar, em pleno pico da pandemia, quando atingimos a inimaginável marca de mais de 4.000 mortos por dia e já perdemos em torno de 340.000 almas brasileiras.

O sonambulismo também inclui o argumento da (falsa) preocupação com o abismo entre a rede pública de ensino e as empresas educacionais (como se isso tivesse ocorrido devido a pandemia). Afirmo ser falso porque em um ano de escolas fechadas ninguém havia pensado nisso! Em seu surto sonambúlico, desconsideram a ausência de vacinas para os trabalhadores da educação e que serão lançados nos transportes coletivos, já precários e inadequados, aumentando os riscos com aglomerações.

Seria fundamental começarmos uma discussão séria sobre a educação pública, para garantirmos o direito a educação, gratuita, laica e de qualidade socialmente referenciada, às crianças pobres desse país. Como nós, estudiosos da educação, temos dito a anos e referendamos desde o início da pandemia. Crianças não devem ficar longe da escola! Mas estamos num agravamento da pandemia e as escolas carecem de estrutura física.

Onde essas autoridades estavam desde o início da pandemia quando os recursos foram cortados para a educação? Onde estavam quando chamávamos a atenção para necessidade de destinar recursos para fazer as reformas necessárias nas escolas (a muito tempo precárias), provendo-as de banheiro com papel higiênico, lavatórios com toalhas descartáveis, salas de aula arejadas, espaços de refeição adequados e formação para quem nelas trabalham (pasmem, caros sonâmbulos, as escolas não têm esse básico)?

Passou-se um ano de sono profundo para esses senhores e senhoras que nunca foram em uma escola pública (nem nada entendem de educação como direito) e agora levantam em surto de sonambulismo e se arvoram, de seus escritórios remotos, a lançar a comunidade educacional a se expor a morte. Diga-se de passagem: trabalhadores da educação com baixa remuneração, estudantes (que na rede pública são crianças, jovens, adultos e idosos) das classes trabalhadoras. Ou seja, os pobres!

Convido a uma discussão séria sobre a educação pública. Que as autoridades acordem de fato e não sonambulem para mostrar serviço!

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