Em votação simbólica, o Plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (10) um projeto que dispensa a autorização do cônjuge para procedimentos de esterilização voluntária (laqueadura, para mulheres, e vasectomia para homens). Pela lei que ainda está em vigor, homens e mulheres casados precisam desse aval para se submeter ao procedimento. A proposta já foi aprovada na Câmara e segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro.
O texto mantém o prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o ato da esterilização. Mas, passa a permitir à mulher a esterilização cirúrgica durante o período de parto. A proposta também altera a idade mínima para a realização, que cai de 25 para 21 anos. O texto mantém o outro critério já previsto em lei: homens e mulheres podem fazer a esterilização em qualquer idade se tiverem, pelo menos, dois filhos vivos.
A mudança de regras é uma demanda da bancada feminina e foi aprovada na mesma sessão que comemorou os 16 anos da Lei Maria da Penha. Se sancionada, o PL 1.941/2022 passará a valer 180 dias após ser publicada no “Diário Oficial da União”.
De autoria da deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC), o projeto foi aprovado na forma do relatório da senadora Nilda Gondim (MDB-PB), que substituiu a senadora Margareth Buzetti (PP-MT) na função. O projeto tramitou em conjunto com o PL 5.832/2019, do senador Jorge Kajuru (Podemos-GO), que trata do mesmo tema.
Nilda Gondim destacou a elevada efetividade da esterilização cirúrgica como método contraceptivo permanente. Quanto à redução de idade para o procedimento, ela avaliou que o Sistema Único de Saúde (SUS) está plenamente apto para fornecer informações adequadas para a tomada de decisões conscientes.
“A aprovação do projeto fará com que a legislação do Brasil esteja em consonância com a de países como Canadá, França, Alemanha, Argentina e Colômbia, que, no caso de pessoas capazes, vedam a esterilização apenas de menores de idade”, observou em seu relatório.
Para Nilda, a permissão para laqueadura durante o parto vai aumentar o acesso ao método e evitar que a mulher se submeta a duas internações, o que reduz os riscos de complicações cirúrgicas e a taxa de ocupação de leitos hospitalares.
Discussão
Margareth Buzetti tinha emitido relatório favorável ao projeto, mas foi substituída na relatoria em decisão tomada nesta terça-feira (9). Em Plenário, ela criticou a forma como a substituição foi feita, sem aviso prévio do presidente do Senado, mas defendeu a aprovação do texto. “Essa é uma pauta nossa. É uma pauta feminina, e é isso que interessa. Vamos aprová-la hoje, se Deus quiser, mas precisamos de respeito”.
Presidindo a sessão, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) esclareceu que a substituição seguiu o rito do Senado: quando há dois projetos com o mesmo teor nas duas Casas legislativas e o Senado recebe proposição da Câmara, o senador que tenha apresentado projeto semelhante é nomeado relator.
A senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) elogiou a dispensa do consentimento prévio do cônjuge para esterilização, avaliando que essa conduta restritiva era uma forma de estímulo à violência doméstica e um atentado à autonomia reprodutiva das mulheres. Ela citou estatísticas “alarmantes” sobre a falta de planejamento familiar.
“55 por cento das gestações no Brasil não são planejadas. Ainda mais grave: os índices de gestação na adolescência são altos, atingem mais as meninas negras e as mais pobres, e geram evasão escolar”, lamentou.
‘Harmonia’
O senador Guaracy Silveira (Avante-TO) manifestou sua contrariedade à revogação do consentimento expresso dos dois cônjuges para a esterilização. Para ele, o fim desse consentimento entra em conflito com os termos constitucionais sobre a garantia da harmonia da família. “Não podemos de maneira nenhuma pregar a desagregação”, disse.
Em resposta, Nilda Gondim reiterou os termos do projeto, que, segundo ela, garantem à mulher o direito de decidir o que quer para sua vida. “Que ela avise a seu companheiro, a seu marido. Enfim, ela tem o direito de decidir se quer usar o método contraceptivo”.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) complementou, argumentando que a harmonia da família “tem que ser dos dois lados”. “Obrigar a mulher a ter mais filhos, não poder usar contraceptivos, distorce totalmente o projeto de lei: o direito de optar por ter filhos ou não”, definiu.
Planejamento familiar
O presidente do Senado também comemorou a aprovação da proposta. Em uma rede social, Rodrigo Pacheco ressaltou que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso adequado de métodos contraceptivos contribui para a prevenção dos riscos à saúde relacionados à gravidez indesejada.
“Também contribui para a redução da mortalidade infantil, melhora o acesso à informação sobre planejamento familiar e colabora para o desenvolvimento do país”, escreveu Pacheco.