Tráfico de Pessoas: entenda o perfil das vítimas e os desafios no combate à prática contemporânea da escravidão
Natal, RN 13 de mai 2024

Tráfico de Pessoas: entenda o perfil das vítimas e os desafios no combate à prática contemporânea da escravidão

30 de julho de 2023
6min
Tráfico de Pessoas: entenda o perfil das vítimas e os desafios no combate à prática contemporânea da escravidão

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Negras, do sexo masculino, em situação de vulnerabilidade e com baixo grau de escolaridade. Este é o perfil da maior parcela das vítimas de Tráfico de Pessoas no Brasil, revelou o Procurador do Trabalho Gleydson Gadelha. O titular regional da coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas foi o entrevistado do programa da Agência Saiba Mais no canal do YouTube, o Balbúrdia, na última sexta (28), antevéspera do Dia Mundial e Nacional de Combate ao Tráfico de Pessoas.

Mais de 25 mil pessoas são traficadas anualmente em todo o mundo. O dado é do Escritório sobre Drogas e Crime da ONU, que em 2013 adotou 30 de julho como o Dia Mundial contra o Tráfico de Pessoas. A atividade ilegal movimenta aproximadamente 1 trilhão de dólares, sendo uma das atividades ilegais mais lucrativas e disseminadas pelo mundo, rivalizando com o tráfico de drogas e armas.

Apesar dos números alarmantes, Gleydson Gadelha alerta que ainda faltam dados sólidos no Brasil, em todos os Estados da Federação, para embasar as ações de enfrentamento.

Nós não temos dados que amparem”.

Rio Grande do Norte

O procurador revelou que os estados do Nordeste, incluindo o Rio Grande do Norte, têm sido alvo do tráfico de pessoas, tanto para fornecer vítimas para operações dentro do país como para o exterior.

Diante dessa realidade, Gadelha falou sobre as iniciativas em andamento para combater esse crime no Estado do Rio Grande do Norte. O Ministério Público do Trabalho está lançando uma campanha de articulação com a imprensa, parceiros e observatórios para promover ações práticas e organizadas durante todo o ano.

Um dos desafios é criar uma coordenadoria estadual para acompanhar e mapear todas as ações, projetos e programas relacionados ao tráfico de pessoas.

O apoio do estado é fundamental para garantir que as políticas públicas de combate ao tráfico sejam implementadas com eficácia”.

Mapear os municípios e incentivar a implementação de políticas públicas de prevenção e acolhimento foram ações apontadas como essenciais para enfrentar o problema. Assim como, criar programas adequados de qualificação para as vítimas resgatadas. Muitas vezes, essas pessoas possuem baixa escolaridade e necessitam de formação específica para conseguir se reintegrar à sociedade de forma digna.

Entrevista ao programa da Agência Saiba Mais no canal do YouTube, o Balbúrdia

É fundamental continuar lutando contra o tráfico de pessoas, aprimorando nossas estratégias e garantindo o suporte necessário para proteger e auxiliar as vítimas dessa grave violação dos direitos humanos”, avaliou Gadelha.

Transversalidade

Com base no Protocolo de Palermo da ONU, a legislação mundial aborda o tráfico de pessoas para diversas finalidades, incluindo exploração sexual e retirada de órgãos. O chamado "turismo de órgãos" é uma das práticas mais sombrias, onde indivíduos são levados a outros locais sob falsas promessas e, posteriormente, têm seus órgãos e tecidos retirados à força, resultando em um comércio perverso e desumano. Segundo Gadelha, meninos e meninas são frequentemente vítimas desse tipo de tráfico, sendo submetidos a modificações físicas e hormonais para atender a determinados mercados de exploração sexual.

Representando uma forma de escravidão contemporânea, o Tráfico de Pessoas é uma prática que mercantiliza vidas, tratando como mercadorias a serem exploradas em nome do lucro, sendo um guarda-chuva sob o qual diversas finalidades podem ser encontradas. Mas uma das mais recorrentes é o trabalho escravo, em que pessoas são deslocadas de suas regiões de origem e submetidas a condições degradantes. O fenômeno ocorre em todos os estados e lugares, explorando uma massa de pessoas, sobretudo aquelas em situação de vulnerabilidade socioeconômica.

Direitos Humanos

Nesse contexto, para Gadelha, os direitos humanos são construídos a partir do momento em que se posiciona contra a violação dos princípios fundamentais que garantem a dignidade e a liberdade de todas as pessoas.

Nós construímos os direitos humanos quando nós resistimos à pauta que nos ofende como seres humanos”.

Para o procurador, a luta pelos direitos humanos é contínua e envolve a proteção dos mais vulneráveis, a denúncia de injustiças e a busca por um mundo mais justo e inclusivo. “É fundamental que cada indivíduo e a sociedade como um todo se comprometam a enfrentar as violações e promover ações concretas para a garantia dos direitos humanos para todos os seres humanos”, ressaltou Gadelha.

Exploração sexual

Ao tratar da exploração sexual, o procurador avaliou que o tema transcende o conceito vulgarmente conhecido como prostituição. Além da exploração sexual de mulheres, Gadelha lembrou que também ocorrem casamentos forçados em algumas regiões do mundo, onde mulheres ou até mesmo meninos são vendidos como parte de redes de tráfico humano.

Atualmente, segundo ele, observa-se que o tráfico de pessoas não se limita apenas à exploração sexual feminina, sendo os meninos a grande marca desse comércio. Dentro do Brasil, há registros de rotas nacionais que levam pessoas de um local para outro, “muitas vezes submetendo-as a modificações hormonais e físicas para atender a um determinado mercado de exploração sexual”, esclareceu Gadelha. O caso dos meninos que são forçados a realizar transformações físicas, conhecido como "kit transformação", é citado pelo procurador para exemplificar o nível de crueldade presente nesse tipo de tráfico.

Trabalho escravo

Para Gadelha, a discussão sobre trabalho escravo e tráfico de pessoas é inseparável, pois ambos estão interligados e representam sérias violações dos direitos humanos. No Brasil, o Ministério Público do Trabalho desempenha um papel fundamental no enfrentamento desses problemas e é parte de uma rede pública que foi criada na década de 90, crescendo ao longo do tempo com a colaboração de vários parceiros.

Segundo o procurador, há um foco importante em comunidades quilombolas e assentamentos, onde as pessoas vulneráveis são identificadas e mapeadas, buscando auxiliá-las na regularização de suas terras e inserção em seu ambiente local.

Combate

O combate ao tráfico de pessoas é uma questão transversal, que atravessa diversas áreas, incluindo os direitos humanos, a segurança pública e a justiça social. Para o procurador, não se pode falar em combate ao tráfico de pessoas sem falar de combate à pobreza e à desigualdade socioeconômica que existe no mundo.

É imperativo, em sua avaliação, que a sociedade, os governos e as organizações estejam unidos para enfrentar essa grave violação dos direitos humanos e trabalhem em conjunto para prevenir, identificar e punir os envolvidos nesse crime hediondo, sendo fundamental promover ações de conscientização, fortalecer políticas públicas de proteção às vítimas e aumentar a capacitação das autoridades para identificar e investigar casos. Além disso, Gadelha pontuou como urgente a criação de estruturas, como observatórios estaduais, para monitorar e combater essa forma contemporânea de escravidão.

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