Três fatos distintos que me chamaram a atenção nos últimos dez dias:
1 – Um empresário, amigo meu de Facebook, postou dia desses uma imagem de Lula caminhando nas obras de transposição do Rio São Francisco, por ele iniciadas, com a seguinte frase: “Não dá para confiar em pedreiro. Eles nunca entregam a obra completa”.
2 – Durval Teófilo Filho foi morto a 2 de fevereiro a tiros por seu vizinho, o sargento da Marinha, Aurélio Alves Bezerra, no condomínio onde eles moravam em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro
3 – Em Manaus, um entregador do IFood foi agredido e imobilizado violentamente por um cliente, que se recusou a passar o pix para pagamento e tentou tirar a comida pedida a força do trabalhador.
Fatos isolados, aleatórios, ocorridos em lugares diferentes e em dinâmicas distintas, de uma bobagem de rede social até um assassinato a sangue frio. Nada a ver uma coisa com a outra. Será?
No exemplo 1 vemos não apenas o já conhecido antipetismo que deságua na achincalhação do nome do ex-presidente Lula. Na verdade, a piada se refere a uma profissão. Mais que isso, uma profissão associada a Nordestinos. O empresário que postou a foto é nordestino, mas, branco e de ascendência europeia. Lula é natural de família pobre do interior pernambucano, como se sabe, indo morar em São Paulo num pau de arara. Mas, além disso: Na “piada” Lula ainda encarnaria um pedreiro “ladrão”, que recebe dinheiro e não termina a obra.
No exemplo 2, o mais trágico, já sabemos, pela mídia e pelas investigações que o assassino é branco e atirou no vizinho porque estava com medo dele ser um assaltante. O vizinho morto era negro.
No exemplo 3 sabemos também que o motoboy agredido é o que se chama no Brasil de pardo e, pelo trabalho que exerce, de classe social pouco abastada. O agressor, branco, é filho de um vereador em uma cidade próxima á capital amazonense.
Nada nessas histórias são aleatórias ou sem simbolismos. Os três agressores são brancos e com poder aquisitivo. Os três agredidos são negros e/ou oriundos de famílias humildes.
Garimpei três exemplos, mas poderia ter escolhido dez, trinta, cem. Diariamente vemos este tipo de coisa acontecendo. Trata-se de evidente preconceito de classe (ou odio de classe) que é quase uma epidemia entre os endinheirados (tanto os que realmente são quanto os que acham que são) brancos do Brasil. O preconceito de classe leva automaticamente a um racismo associado. Se é preto, é pobre. Se é preto e pobre, logo, é marginal e vai assaltar. Se é Nordestino, tem que ser porteiro ou pedreiro no Sul Maravilha.
O racismo estrutural brasileiro é real, palpável e cotidiano. E dialoga umbilicalmente com o ódio a pobres que um perfil da elite brasileira tem, como o personagem Justo Veríssimo, de Chico Anysio.
Triste saber que semana que vem, quando chegar o dia de escrever mais um coluna, terei lido sobre mais dezenas de casos como os citados aqui. São doenças brasileiras que precisam ser extirpadas. Mas, claro, primeiro é preciso tirar um governo que praticamente chancela o racismo e o ódio a pobres. O Brasil está na UTI.