Médicos progressistas tentarão chegar ao Legislativo e criticam colegas anticiência
Natal, RN 26 de abr 2024

Médicos progressistas tentarão chegar ao Legislativo e criticam colegas anticiência

6 de junho de 2022
8min
Médicos progressistas tentarão chegar ao Legislativo e criticam colegas anticiência

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A pandemia de covid-19, que causou no Brasil mais de 660 mil mortes do começo de 2020 até agora, além de gerar impacto na economia, na política e nas relações pessoais e sociais, foi marcada tanto pelo trabalho abnegado de profissionais da saúde e necessidade de desenvolver vacinas em tempo recorde como no negacionismo e postura anticiência de parte da categoria médica. Esse conflito entre posições e visões do mundo antagônicas foi levado para a política e em 2022 fará parte dos debates eleitorais, já que muitos médicos progressistas e conservadores tentarão mandatos eletivos em todo o país. No Rio Grande do Norte, este cenário também será visto, com profissionais da saúde tentando chegar na Câmara Federal e Assembleia Legislativa.

Um desses médicos é o infectologista Alexandre Motta (PT), da linha de frente no combate ao covid durante a pandemia, que foi candidato ao Senado em 2018, obtendo 242.465 votos. Em conversa com a reportagem da Agência SAIBA MAIS, ele disse que "a categoria médica não tem uma posição uniforme acerca das propostas e das pautas da saúde, portanto médicos com visão mais conservadoras vão seguir com candidaturas marcadas por negacionismo. Na esquerda, a categoria tem bons quadros e ofereço meu nome para disputar vaga na Câmara Federal, tendo como um dos propósitos, ajudar na construção de uma bancada de deputados federais que possa ajudar Lula a governar e desfazer toda a destruição que Michel Temer e Jair Bolsonaro proporcionaram ao país", disse.

Também ouvido pela reportagem do SAIBA MAIS, o médico infectologista Petrônio Spinelli (PT) foi secretário adjunto de Saúde durante o período mais agudo do covid, antes da vacinação, e lançou pré-candidatura a deputado estadual. "É fundamental que todos entendam a importância da ciência e também que tenhamos candidaturas da área da saúde, para levar para a Assembleia Legislativa o tema da defesa da ciência e da qualidade de vida da população como fator importante para que garanta condições de saúde, o que terá impacto no SUS", registra.

Perguntados sobre as pautas de campanha, Alexandre defende que sua pré-candidatura vai propor debate "sobre a luta contra o fascismo e a defesa da democracia, além da defesa dos valores intrínsecos dos trabalhadores e os direitos que tem que ser readquiridos e foram tirados pelas reformas trabalhista e da previdência, inclusive os médicos foram bastante prejudicados na reforma previdenciária já que começam a começam trabalhar tarde. Também vou defender que o SUS tenha restabelecida sua capacidade de investimento e a reversão do teto de gastos. Quero lembrar que é preciso fortalecer o programa de saúde da família, que resolve 80% dos problemas que depois acabam indo para os hospitais do SUS", assinala. Já Petrônio ressalta que "minhas bandeiras de campanha defenderão que qualquer política pública vai corresponder à realidade social das pessoas. Se o ambiente não é sadio, se as pessoas não têm direito à renda, educação, cultura, habitação, acesso à água, dificilmente terão saúde adequada. Então a luta da saúde é associada à luta pela inclusão e diminuição das desigualdades e insisto que o Estado avance nessa pauta", afirma.

Como médicos progressistas analisam s colegas conservadores e negacionistas? "Colegas que defenderam tratamento precoce ou mesmo contra a vacinação são bolsonaristas e se deixaram contaminar por uma visão do mundo equivocada. Infelizmente ajudaram na desinformação, graças a esses médicos muitas pessoas confiaram num remédio supostamente eficaz e se expuseram demais ao vírus e passaram a ver vacinas como experimentais, quando elas são eficazes. O negacionismo destes médicos ainda fundamenta 20% da população que não se vacinou, fazendo com que o vírus permaneça em circulação, é um caminho lamentável. Uma parte da categoria médica esqueceu que era médica e se tornou apenas bolsonarista", diz Alexandre, que em 2020, na qualidade de infectologista e ex-candidato ao Senado, fez vídeos divulgados pelas redes sociais com muitas críticas ao prefeito de Natal Álvaro Dias (PSDB), que é médico e fez campanha para reeleição naquele ano defendendo tratamento precoce com Ivermectina, remédio sem qualquer comprovação científica para combate ao covid.

Já Petrônio aponta que "acho incompreensível que qualquer profissional da área da saúde possa defender posturas anticientíficas, a nossa formação pressupõe usar a ciência em benefício da população", diz Alexandre. "Durante o processo políticos na pandemia, interesses mesquinhos acabaram desviando alguns profissionais, com um "canto de sereia", o que levou colegas a defender medicações sem comprovação por questões políticas ou eleitorais ou simplesmente para contrapor uma visão de inclusão social. Nossa expectativa é que a narrativa negacionista, bolsonarista, anticiência seja derrotada nas urnas",

GERALDO FERREIRA

No outro campo ideológico e político, o prefeito da capital Álvaro Dias não será candidato a nenhum cargo e evita falar de Ivermectina e políticas de saúde em entrevistas. Porém, médicos de matiz conservadora já anunciaram pré-candidaturas. É o caso do presidente do Sindicato dos Médicos do RN (Sinmed/RN), médico anestesista Geraldo Ferreira, que na quinta-feira, 2, se descompatibilizou da direção da entidade para disputar cadeira na ALRN. Segundo nota do sindicato, " ele deverá percorrer as cidades do Rio Grande do Norte, além de visitar clínicas, ambulatórios, hospitais e instituições como cooperativas de trabalho e crédito, para divulgar o seu projeto e suas propostas que serão voltadas para a carreira pública, assistência a população, trabalho médico, empreendedorismo e cooperativismo". Os temas covid e vacinação não estão presentes no texto da nota.

Em entrevista ao próprio portal do Sinmed, Geraldo assinalou que "quanto a mim, resta procurar toda a categoria, pedir o seu comprometimento, apresentar as nossas propostas para que, finalmente, a categoria médica possa recuperar esta cadeira na Assembleia, que tivemos a oportunidade de eleger através do médico que fez parte da diretoria do Sinmed RN, Dr. Paulo Davim, eleito Deputado por duas vezes e, posteriormente, Senador. O desejo da categoria é poder reviver esses momentos e eleger uma liderança que tenha comprometimento com as lutas da categoria, que tenha conhecimento das lutas médicas e do que a categoria pretende com o futuro da profissão do médico”, ressaltou.

Geraldo jamais criticou a vacinação. Mas já defendeu tratamento precoce quando nenhum estudo sério apontava para isso. Em 26 de janeiro de 2021, quando as vacinas ainda não haviam sido disponibilizadas para a população, o presidente do Sinmed fez coro com a Associação Médica do Rio Grande do Norte (AMRN) e confirmou que o tratamento precoce pode interromper a evolução do vírus em 75%. “Isso é muito relevante, não podemos desprezar isso e nem privar as pessoas do direito de se tratar. Além disso, podem ser usados também azitromicina, anita” disse.

Ainda antes, em maio de 2020, ainda no início da pandemia, Geraldo Ferreira, defendeu o uso da hidroxicloroquina, preconizada em lives por Bolsonaro, para pacientes em estado inicial da Covid-19, e afirmou que a valorização do tratamento tomou rumos políticos. No mesmo período, o Sinmed recorreu à Justiça para contestar o pedido de lockdown em Natal e Região Metropolitana, solicitado pelo Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Estado (Sindsaúde), Em nota divulgada na ocasião pelo Sindicato dos Médicos, além de ser contrário à medida de restrição de circulação, também novamente foi citado o uso da hidroxicloroquina, medicamento defendido e lembrado frequentemente pelo presidente Jair Bolsonaro. Meses depois o próprio Bolsonaro abandonou a defesa da medicação.

ALBERT DICKSON E ROBERTA LACERDA

O deputado estadual e médico oftalmologista Albert Dickson (PSDB) também ganhou destaque durante a pandemia pelo negacionismo. E pelo modus operandi em torno de suas "consultas". Reportagens de portais nacionais mostraram que o potiguar oferecia 'tratamento precoce', de orientações a receitas de medicamentos sem eficácia comprovada em troca de 'likes' no YouTube, Embora nunca tenha condenado a vacinação, Dickson, que tenta reeleição este ano, continua postando em suas redes sociais informações não comprovadas sobre tratamento.

Já a médica infectologista Roberta Lacerda foi um passo além durante a pandemia. Pré-candidata a deputada federal pelo PL, partido de Bolsonaro, ela não apenas defendeu tratamento precoce e medicamentos como ivermectina, tendo em março de 2021 dito que "a Ivermectina tem poder de parar a pandemia', como fez campanha contra a vacinação infantil em vídeos no You Tube e postagens nas redes sociais, chamando a vacina de ‘experimental’. Em 13 de agosto de 2021 ganhou destaque negativo nacional como protagonista de matéria do portal UOL na reportagem "Médica distorce dados para levantar suspeita sobre covid em não vacinados".

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