Combate à fome no RN conta com Rede Xique Xique; R$ 1,6 milhão de alimentos da agricultura familiar foram vendidos em 2021
Natal, RN 17 de mai 2024

Combate à fome no RN conta com Rede Xique Xique; R$ 1,6 milhão de alimentos da agricultura familiar foram vendidos em 2021

21 de junho de 2022
9min
Combate à fome no RN conta com Rede Xique Xique; R$ 1,6 milhão de alimentos da agricultura familiar foram vendidos em 2021

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Enquanto milhões de pessoas passam fome no país, redes solidárias de agricultura familiar oferecem comida saudável à população ao mesmo tempo em que criam renda para aqueles que vivem da terra. No Rio Grande do Norte, a Rede Xique Xique é exemplo disso.

São cerca de 150 núcleos familiares envolvidos, com média de quatro pessoas em cada unidade. O grupo já tem 18 anos e no auge da pandemia, em 2020, esses pequenos negócios venderam quase R$ 1,5 milhão em alimentos. Em 2021, foram mais de R$ 1,6 milhão.

“A Rede nasceu em 2004 como fruto de um amplo processo de construção coletiva, com a contribuição de um conjunto de organizações da sociedade civil que atuam em diferentes áreas e lutam pela autonomia e melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo e da cidade”, conta a coordenadora Nara Lima, ao destacar que a atuação se dá em 20 municípios.

“Estamos em Mossoró, Baraúna, Tibau, Grossos, Serra do Mel, Pendências, Ipanguaçu, São Rafael, Governador Dix-Sept Rosado, Apodi, Felipe Guerra, Paraú, Upanema, São Miguel, São Miguel do Gostoso, Natal, Parnamirim, Maxaranguape, Bom Jesus e Afonso Bezerra”, enumera.

É da agricultura familiar o maior percentual da comida que vai para a mesa dos brasileiros. De acordo com o IBGE, em 2017, o segmento respondia por 48% do valor da produção de café e banana; nas culturas temporárias, são responsáveis por 80% do valor de produção da mandioca, 69% do abacaxi e 42% da produção do feijão.

Para Nara, a rede contribui para o combate à fome “a partir da soberania alimentar, da subsistência e da produção de alimentos saudáveis”.

O espaço de comercialização garantiu a produção de alimentos suficientes para suprir as necessidades de consumo das próprias agricultoras, mas também para atender às demandas de compras coletivas de cestas emergenciais e de pedidos feitos via delivery.

Os principais produtos vendidos são arroz, feijão, raízes, como batata e macaxeira, legumes, ovos, frutas e polpas de frutas.

Foto: João Vital

A rede marcou presença, de 14 e 19 de junho, na I Feira Nordestina da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Fenafes), onde Nara constatou que foi maior a procura por alimentos. “No estande dos artesanatos a venda é menor, mas só em estar divulgando nossos produtos e história de cada artesã, temos muito ganho”, avalia.

O evento foi uma iniciativa da Câmara Temática da Agricultura Familiar do Consórcio Nordeste – coordenada pela governadora Fátima Bezerra – e realizado através das secretarias de Estado do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (Sedraf), Emater-RN e Fundação José Augusto (FJA).

Incentivo

A rede foi beneficiada pelo Projeto Governo Cidadão/Banco Mundial, com R$ 592 mil, por meio de convênio com o Governo do Rio Grande do Norte, para produzir polpa de fruta “de verdade”. Localizada na comunidade Mulugunzinho, em Mossoró, a nova unidade de produção artesanal da Associação tem capacidade de processamento mensal de, em média, 10 mil quilos de polpa de acerola, cajarana, caju, goiaba, graviola, limão e manga.

A construção da pequena fábrica, a compra de equipamentos e de um veículo de carga para escoamento da produção já foram concluídos, beneficiando 11 núcleos dedicados à agricultura familiar, chefiados por mulheres, e mais de 400 agricultores indiretamente ligados à Associação. Na unidade construída pelo Governo Cidadão, a Xique-Xique promove processos agroecológicos, a economia solidária e o protagonismo feminino.

Durante a Fenafes, o Governo do RN firmou nova parceria com a Rede Xique Xique e Acopasa, que são habilitadas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), para promover certificação agroecológica.

O valor investido é R$ 104,4 mil com base no disposto no Plano Plurianual do Governo do Estado, que definiu como meta até 2023 promover a certificação agroecológica junto à produção de pelo menos 300 famílias de agricultores e agricultoras familiares.

Foto: Vlademir Alexandre

"O selo é importante pra poder mostrar à sociedade que o produto é agroecológico orgânico. Ele estará presente nas prateleiras dos supermercados ou na venda direta pra passar pra sociedade de onde aquele alimento tá vindo, como é produzido, sem veneno e com foco social", avalia a coordenadora da Rede Neneide Lima, ao completar que a metodologia usada pelo grupo é participativa, o que inclui capacitações e formações dos integrantes.

O incentivo também vem das aquisições governamentais. Pela lei a Lei 10.536/19, que instituiu o Programa Estadual de Compras da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Pecafes), o Estado pelo menos 30% de gêneros alimentícios comprados para suprir hospitais, restaurantes populares, sistemas prisional e socioeducativo, entre outras instituições, devem ser produzidos pela agricultura familiar.

"Desenvolver o campo e fortalecer a agricultura familiar é prioridade no RN. Criamos estrutura própria, a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural e da Reforma Agrária; aprovamos a lei do Pecafes; criamos linha de crédito para a agricultura familiar, beneficiando principalmente mulheres e jovens; criamos o programa Gente no Campo, com 120 vagas de graduação e pós-graduação, com bolsa, para agricultores familiares e seus filhos na área da Agroecologia. Para nós, a agricultura familiar deve ser mais do que subsistência, deve permitir a manutenção das famílias com dignidade e qualidade de vida, até porque ela alimenta 70% da população", afirmou a governadora Fátima Bezerra durante a feira.

ASA

A Rede Xique Xique e outras organizações da agricultura familiar, junto com movimentos sociais e sindicatos do setor integram a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA). O objetivo do grupo maior é fortalecer a construção de processos participativos para o desenvolvimento sustentável e a convivência com o semiárido referenciados em valores culturais e de justiça social.

As entidades que integram a ASA estão organizadas em fóruns e redes nos 10 estados que têm esse clima: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais.

Por meio da ASA, o estado já ganhou cerca de 80 mil cisternas e o Brasil, mais de um milhão, desde o início dos anos 2000.

“As reuniões mensais discutem estratégias de convivência com o semiárido. Um dos resultados é o desenvolvimento de tecnologias sociais de captação e armazenamento de águas de chuva, dentro das cisternas de 16 mil litros, pelo programa Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC)”, conta a suplente de coordenação da ASA no RN, Ivi Dantas.

“Essa tecnologia social é a porta de entrada dos programas de convivência, é a tecnologia reconhecida internacionalmente. E agora temos a P1+2 – Programa Uma Terra e duas Águas, que pretende ampliar o estoque de água das famílias agricultoras, com uma cisterna para consumo e cozinha e outra cisterna voltada à produção”, detalha Ivi, que é técnica do Centro Feminista 8 de Março.

Ela ressalta que a política de cisternas vem sendo desmontada pelo governo Bolsonaro, o que motivou a ASA a realizar a campanha “Tenho Sede”, de denúncia e arrecadação para que essas construções não parem.

“A campanha, que tem colaboração de Gilberto Gil, permite também dialogar com a sociedade sobre a importância da retomada desses programas. Mesmo tendo construído muitas cisternas, ainda existem pessoas que não têm acesso à água, que é um princípio pra dignidade humana e afeta diretamente a vida das mulheres. Elas são as maiores responsáveis pelas tarefas da casa e por esse trabalho de ir buscar a água. Quando você tem uma cisterna do lado da sua casa, reduz o trabalho doméstico e melhora a qualidade de vida das mulheres”.

Visita do ex-presidente Lula à I Fenafes | Foto: Elisa Elsie

Em Natal, Lula comentou a relação entre produção de alimentos e combate à fome

Em Natal para participar da Fenafes, o ex-presidente Lula, em pré-campanha para retornar ao governo federal, justificou o interesse pelo tema: “Em 2002, quando fui eleito presidente, a primeira coisa que eu disse é que a gente ia acabar com a fome desse país”.

Lula seguiu sua fala lembrando que no dia 10 de dezembro de 2002, antes mesmo de tomar posse, foi convidado pelo presidente Bush para entrar na guerra do Iraque e negou. “Eu falei: presidente Bush, eu não conheço o Iraque, não conheço Saddam Hussein. Ele está a 14 mil quilômetros de distância do Brasil. Eu não vou guerrilhar com ele, eu vou guerrilhar com a fome no meu país, que está matando 54 milhões de pessoas”.

Também contou que ao sair da Polícia Federal, encontrou o Papa Francisco com o intuito de realizar uma campanha de indignação, porque mesmo se produzindo mais alimentos do que se consome, ainda restam 900 milhões com fome.

“O problema não é falta de produção de alimentos. Isso significa que tem dois outros problemas: o povo pobre não tem emprego, não tem dinheiro pra comprar alimentos e a classe dirigente não tem vergonha na cara de não garantir ao povo o direito de comer”, disparou.

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