Mudança na Lei Djalma Maranhão deve reduzir eventos gratuitos em Natal
Natal, RN 16 de mai 2024

Mudança na Lei Djalma Maranhão deve reduzir eventos gratuitos em Natal

28 de dezembro de 2023
7min
Mudança na Lei Djalma Maranhão deve reduzir eventos gratuitos em Natal
"Cores do Nosso Samba" é um dos eventos que recebe incentivo para ser gratuito atualmente | Foto: reprodução Instagram @coresdonossosamba

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Com as mudanças na Lei Djalma Maranhão que reduzem pela metade o incentivo fiscal para financiar projetos culturais em Natal, a classe artística aguarda, a partir de 2024, a queda em espetáculos e eventos culturais na capital potiguar, além de uma redução no número de projetos gratuitos.

Na última terça-feira (26), na última sessão do ano, a Câmara de Natal aprovou uma matéria apresentada pelo prefeito Álvaro Dias (Republicanos) que baixou de 2% para 1% o valor proveniente de impostos a ser usado como incentivo cultural, por meio da renúncia fiscal.

Segundo o presidente da Associação dos Produtores Culturais e Artísticos do Rio Grande do Norte (APCA) e CEO da Idearte Produções, Amaury Jr, Natal vai na contramão do Brasil, que vê o governo federal aumentar os investimentos na cultura. 

“Precisa se ampliar, não diminuir e dividir o pão. O que a gente espera de 2024 é um apagão, é uma redução significativa”, lamenta.

O produtor ainda reclama da retirada do IPTU como fonte de recursos da lei, deixando somente o ISS. A partir de agora, com a mudança apresentada pela Prefeitura e aprovada pela Câmara Municipal, o IPTU será considerado apenas para fins de aferição do teto do valor a ser renunciado, não podendo ser utilizado como valor destinado à captação de projetos.

Para a Prefeitura, a redução no incentivo cultural visa “consolidar” o Fundo de Incentivo à Cultura. O valor da renúncia fiscal iria para este fundo.

“É um absurdo o Fundo ser de R$ 400 mil reais como ele é quando é lançado, porque ele é lançado a bel prazer da gestão. A gente é a favor disso [do Fundo], toda classe é a favor, mas não tirando da Lei Djalma Maranhão, não tirando de uma conquista”, afirma.

Já a cantora e compositora Tanda Macêdo, que concorreu ao Prêmio Multishow neste ano na categoria “Brasil”, representando o RN, diz que as mudanças não são positivas para o segmento cultural.

“Estamos nos reerguendo de um período crítico e muito difícil, e a realidade agora mudou ainda para pior. Vamos esperar para o próximo ano essa adaptação dos artistas e uma disponibilidade de patrocínio 50% menor, 50% menos de eventos, de empregos”, comenta.

De acordo com a cantora, a Lei Djalma Maranhão não beneficia somente os artistas e produtores, mas toda a cadeia produtiva por trás. 

“Por mais que a justificativa seja colocar no Fundo de Cultura, mas de qualquer forma estão tirando da cultura para colocar na cultura, e não aumentando o recurso da cultura”, diz.

“[Para] alimentar o Fundo de Cultura não deveria ter que tirar da lei de incentivo para que esses editais e esse outro tipo de fomento acontecesse. A classe artística esperava um outro caminho que não foi possível”, aponta. 

É a mesma opinião de Mônica Mac Dowell, coordenadora geral do “Cores do Nosso Samba”.

“Entendo a necessidade de se ter um recurso para o Fundo de Cultura. Acho extremamente importante, mas não tirando da lei de incentivo. Há que se ter um orçamento próprio para isso”, argumenta.

Diminuição de eventos gratuitos

Mais um ponto criticado pela classe artística é a mudança nos critérios de participação nas modalidades na Djalma Maranhão, que são três: doação, patrocínio ou investimento. Na doação, o projeto é 100% isentado e por isso precisa ser totalmente gratuito; no patrocínio, a isenção não é total, e por isso há uma cobrança de ingresso. 

Agora, entretanto, os projetos beneficiados na modalidade doação que já foram alcançados pela lei por cinco anos só poderão buscar o aporte financeiro na modalidade de patrocínio. Ou seja, eventos que já foram grátis por cinco anos terão que cobrar ingresso. A matéria ainda abre uma brecha para propostas com “comprovado reconhecimento cultural, a ser aferido e aprovado pela Comissão Normativa” da Djalma Maranhão.

“A gente tentou dialogar de toda forma, tanto com o Poder Executivo quanto com a Casa Legislativa, mas o caminho que a gente esperava infelizmente não aconteceu”, lamenta Tanda Macêdo, que esteve presente na programação do Natal em Natal no dia 25 ao lado de Waldonys. 

“Após cinco anos, esses projetos terão que necessariamente passar a ser cobrados. Dificulta a continuidade de projetos gratuitos, que vão na contramão de tudo que a gente acredita para facilitar o acesso à cultura de maneira democrática”, afirma Mônica Mac Dowell, se somando às vozes que enxergam a medida como retrocesso.

Mac Dowell vê mudanças na lei como necessárias, “mas não dessa forma”. 

“Para 2024 o que se pode esperar realmente é uma redução de projetos importantes que vêm acontecendo na cidade, com bastante autonomia, com resultados, com democratização do acesso à cultura. Pra mim um dos pontos mais graves da alteração é essa dificuldade de renovar os projetos na categoria doação, que sempre foi uma luta até muito particular minha nessa defesa dos projetos nessa categoria”, explica a produtora cultural.

Nome por trás do Festival DoSol, Anderson Foca enxerga um processo de precarização da cultura em Natal, intensificada com a alteração na lei.

“Tem outros outros itens dentro da mudança da lei também que são muito ruins, para além da mudança pela metade do investimento, com algumas alterações que também dificultam muito a captação. Realmente é um desmonte da lei. É uma coisa que a gente espera que o prefeito vete porque foi um corte sensível e que a cidade vai sentir”, diz.

Procuramos o secretário de Cultura de Natal (Secult), Dácio Galvão, para comentar as mudanças e as críticas da classe artística, mas não obtivemos sucesso. Em uma publicação no site oficial, a Prefeitura alega que a revisão da Lei Djalma Maranhão “vai fortalecer e democratizar mais o incentivo à Cultura em Natal”.

“A atual gestão da Prefeitura de Natal é a que mais investiu em Cultura na história da cidade e poderá, a partir da atualização da lei, acelerar também o fortalecimento da Política Pública de Editais e Seleções Públicas. O mecanismo vai ampliar o leque de recursos a produtores e artistas. Não há, portanto, risco de redução em incentivos e fluxo de investimentos ao segmento”, justificou o Executivo. 

“Atualmente, a Prefeitura do Natal mantém uma política permanente de editais e seleções públicas que atende a todo o calendário cultural e produtivo da cidade. Entre 2021 e 2023, esses mecanismos oficiais resultaram na aplicação de R$ 142 milhões em investimentos diretos às produções culturais locais”, continuou.

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