E nem só de pão vive o homem, mas de palavras, disse faz muito tempo o Galileu. Talvez seja por essa razão que estou escrevendo agora e você lendo. Somos esses famintos de palavras. “Vamos comer Caetano”, canta Adriana Calcanhoto. Comer as letras e beber a sonoridade de suas músicas. Por isso ouvimos canções e cantamos.
O que temos pra comer hoje?
Arnaldo Antunes canta que a “a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”. Um escritor cubano, que esqueci infelizmente agora o nome, cunhou uma frase que Frei Betto costuma repeti-la aos quatro cantos: “Fome de pão e de beleza”.
Pois bem, a gente é faminto do saber e do sabor costurados pelos alfaiates das palavras, seja na tradição oral ou escrita.
O Ministério da Cultura e o Ministério da Educação, juntos com outras pastas em parceria com governos municipais e estaduais e ONGs estão retomando seriamente políticas públicas voltadas ao livro, leitura e bibliotecas com projetos bem arrojados de difusão da leitura em vários formatos na educação formal e não-formal. Mas ainda é muito pouco. Junto aos programas de assistência social, reforma agraria, direitos humanos, mulher, igualdade racial, indígenas, dentre outros, o livro tem que rolar nas mãos, mentes e corações das pessoas e também em rodas-de-conversa e o que tiver de criatividade,, como os Agentes de Leitura. É preciso entregar essa outra bebida e comida. “Nem só de pão vive o homem, mas também de palavras”. A cidade de Natal, em sua única administração popular do prefeito Djalma Maranhão, preso e exiliado pela ditadura militar, dirigida por Maílde Pinto na pasta de Moacir de Góes, fez essa cidade quase inteira ler, através dos projetos culturais e das bibliotecas volantes.
É preciso efetivar esse direito humano cultural garantido nas normativas nacional e internacional. É um direito de todos, um dever do Estado e co-responsabilidade dos indivíduos e da coletividade. Os governos em seus três níveis, o chamado terceiro setor, os empresários e trabalhadores e a sociedade brasileira, somos todos chamados a combater e desnutrição dessa outra fome.
Temos fome, fome de pão e de beleza. Há dentro de nós uma tensão faminta e sedenta. Precisamos comer e beber. Muitos sequer conhecem que carregam em si essa necessidade, mas podemos desapertá-los com uma motivação encantadora. O que não podemos mais é deixar os brasileiros e brasileiras morrerem de fome do sabor e do saber das palavras, seja no resgate da tradição oral e na promoção do incentivo à leitura e do seu acesso.
Para efetivação da cidadania temos que garantir esse deleite, esse direito.