Mudanças climáticas impactam de forma diferente as regiões de Natal
As fortes ondas de calor e as mudanças climáticas que afetam o mundo, transformam e preocupam a vida das pessoas. Em Natal, conhecida como "Cidade do Sol", o cenário não é diferente, e o clima afeta as áreas da cidade de formas diferentes. As zonas Norte e Oeste, por exemplo, sentem mais os efeitos das mudanças climáticas. Essas situações demonstram um tema relativamente novo e que vem sendo debatido pouco a pouco: o racismo ambiental.
O termo foi criado na década de 80 por Benjamin Franklin Chaves Jr e entrou em debate público após uma fala da ministra da igualdade racial, Anielle Franco, relacionando o estudo com as fortes chuvas que atingiram o Rio de Janeiro. O Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e coordenador do Coletivo Nacional de Juventude Negra (Enegrecer) e do Coletivo Salve Natal, Saulo Cavalcante, explica o tema mostra que parte da população natalense sofre com isso:
“É o processo de impacto e oneração de grupos étnicos e populações racializadas através das consequências da degradação ambiental e de eventos climáticos extremos ou mesmo da privação de acesso a recursos naturais e a processos decisórios sobre os territórios em que vivem”, defendeu.
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Ou seja, as regiões periféricas e que concentram o maior número de pessoas pretas e pardas são as mais suscetíveis a enfrentar problemas de mudanças climáticas, como ondas de calor e fortes chuvas, sendo, assim, as regiões mais afetadas pelo racismo ambiental. Em Natal, as comunidades localizadas nas zonas Norte e Oeste são predominantemente compostas por negros e pobres e habitantes da orla, que dependem da pesca artesanal para sobreviver.
Falta de áreas verdes na zn agrava calor, defende estudante
Pensando nisso, a reportagem da Agência Saiba Mais esteve na Zona Norte de Natal para conversar com quem enfrenta esse problemas diariamente. Ismael Nascimento é morador do Nossa Senhora da Apresentação, o bairro mais populoso da cidade, e é estudante de Arquitetura e Urbanismo. Ele afirma já ter estudado explicações sobre o racismo ambiental e passou a relacionar o assunto com a região onde mora:
“Isso é uma coisa que os arquitetos urbanistas têm que pensar muito nas na hora de criar e desenvolver as cidades: criar esses espaços e pensar como esses espaços vão servir para essa população. E como morador da Zona Norte, eu percebo que tem um descaso em relação a isso. Principalmente quando dentro da questão urbana de infraestrutura de Natal, eu acredito que tenha uma grande negligência quanto a serem feitos espaços públicos em Natal, principalmente na Zona Norte”, comenta o estudante.
Ismael também falou da falta de equipamentos públicos, como praças e áreas verdes, que forneçam alívio térmico nessa questão ambiental, principalmente na Zona Norte. Entre 1984 e 2013, Natal perdeu mais da metade de sua área verde, o que deixou a cidade entre 0,9 0C e 1,50C mais quente, segundo o professor do IFRN (Instituto Federal do Rio Grande do Norte), Malco Jeiel, geógrafo e doutor em Climatologia pela Universidade Autônoma de Madrid.
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“Aí justamente isso acaba sendo ligado ao racismo ambiental, porque esses espaços livres não estão sendo feitos em periferias, que é onde estão concentradas a maior população negra e parda de Natal. Esses espaços não estão sendo feitos na zona norte, ou onde as pessoas precisam,. Aí as pessoas mais pobres ou as pessoas pretas e pessoas pardas têm que sempre ficar à mercê dessas políticas públicas. Afinal todo mundo tem que ter um direito à cidade. Existe a lei de direito à cidade. E porque o direito à cidade está sendo relacionado apenas às pessoas que têm poder aquisitivo e não a maior parte da população?”, questiona o estudante.
Ismael ressaltou, ainda, que todos têm direito à cidade e, além de tudo, se reconhecer nela.
“E o racismo ambiental acaba sendo justamente quando as políticas públicas não são pensadas para essa grande parte da população que é pobre, preta, periférica, parda, indígena e que mora dentro das cidades e não tem direito a esse acesso. Não tem direito à cidade. Porque a cidade não é feita só para os grandes empresários construírem, né?”, finaliza.
Calor não é o único problema
Recentemente, a Agência Saiba Mais mostrou que 8 lagoas de captação em Natal estão sob alerta de vazamento, como apontou a Defesa Civil do RN. Isso aconteceu devido às fortes precipitações que atingiram a cidade em novembro de 2023. É importante destacar que, 7 dessas lagoas estão na Zona Norte e uma delas na Zona Oeste, justamente as regiões citadas nesta matéria.
A Secretaria de Infraestrutura de Natal informou que está realizando os serviços nas lagoas afetadas, cumprindo o calendário da pasta. Só que os moradores temem que novas chuvas possam afetar ainda mais as suas vidas.
Na lista das lagoas estão a do Jardim Progresso, José Sarney, Santarém, Dom Pedro I, Redinha I, Parque das Dunas I, Parque das Dunas II e São Conrado. A única lagoa fora da zn é a de São Conrado, que fica no bairro de Nossa Senhora de Nazaré, na Zona Oeste de Natal.