OPINIÃO

Candidato a vereador

Há dias notava-se um ar diferente nele. Estava mais solícito e gentil. Saía logo cedo distribuindo bom dias pela rua. Até deixou o carro em casa e se aventurou no horário de pico do transporte público. Logo desconfiaram de alguma perturbação. Mas não era nada. Pelo contrário, absolutamente pleno de suas ideias, estava candidato a vereador.

Lutava por uma cidade melhor. E para tal, propunha uma série de progressos. Mais saúde, mais educação, mais emprego. Antes de poder concretizar seus nobres objetivos investiu na melhoria dos pequenos detalhes: posou para fotos com braços cruzados e olhar firme. Contemplou a cidade como nunca havia feito e aproveitou para denunciar o descaso que nunca tinha reparado.

Não seria uma campanha fácil. Afinal, a disputa estava saturada de candidatos que assim como ele, também queriam uma cidade melhor. Precisava de algo mais pessoal. Como dizem por aí: mais povão. Então passou a defender o lema: “Vamos sair do atraso, vamos olhar pra frente!”.

Ganhou confiança. Munido de jargões indecifráveis, mas aparentemente inteligíveis, era outro homem: um resolvedor de problemas. Para cada conflito uma resolução: “Tem fome? Empreenda, seja seu próprio prato de comida. Faça como eu, alimente-se do sonho de uma cidade melhor”.

Elegeu-se. Adaptou-se às vestimentas sociais, aos ritos burocráticos e a todas as benesses do cargo. Viu sua vida sair do atraso antes mesmo de construir a tal cidade melhor. Já nem olhava para a frente. Aquele ponto onde estava lhe parecia suficientemente agradável. Curiosamente, passou a olhar mais de canto.

 

 

 

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Ana Clara Dantas é jornalista e escreve às sextas-feiras