A ditadura BraZileira e um passado que nunca existiu
Natal, RN 26 de abr 2024

A ditadura BraZileira e um passado que nunca existiu

21 de abril de 2022
5min
A ditadura BraZileira e um passado que nunca existiu

Ajude o Portal Saiba Mais a continuar produzindo jornalismo independente! Apoie com qualquer valor e faça parte dessa iniciativa.

Quero Apoiar

A revelação de como os militares tratavam a TORTURA, mostra o quanto foram desumanos. Mas isso é apenas PARTE do todo. Os áudios são do período em que o Superior Tribunal Militar (STM) autorizou que fossem gravadas as sessões, entre 1975 e 1985 e se tornaram públicos recentemente.

Cabe ressaltar a reação dos militares. O vice-presidente, Mourão, com sua habitual “troglodice” e ignorância insuspeita, veio com frases infames, lembrando que os mortos estão mortos e que os áudios não têm nenhuma importância pois é apenas passado, fazendo parte da “história”. Já o presidente do STM, Luís Carlos Gomes Mattos, general do Exército, disse que os áudios são “tendenciosos”, que tem como objetivo tácito “atingir a imagem das forças armadas”, que são uma entidade acima de qualquer suspeita (sic). Já a ministra Maria Elizabeth Lima Rocha, única mulher da Corte (15 ministros) e um dos 5 civis do STM, disse que os áudios são “dolorosos”, mas que o STM certamente era contra os “abusos” da Ditadura, como se os membros do STM fossem vestais recolhidos a monastérios distantes do que se passava dos bastidores desse regime.

A discussão sobre o passado braZileiro continua sendo o tabu mais resistente da nossa história, pois o próprio general Mourão trata do período como uma grande guerra revolucionária, como se as forças armadas enfrentassem exércitos bem armados e treinados, enfrentados por uma democracia sólida. É uma piada infame. Aliás a tortura recebe um tratamento bastante específico e fica até “humanizada”, quando os militares se referem a ela como “excessos” e que foram dos dois lados.

Para quem nutre ainda essa percepção de que houve uma grande batalha pela liberdade nesse país, é bom sempre puxar pela história real e concreta, e não pela “história dos dois lados”. O país nunca se libertou da tutela dos militares, que sempre se considerou parte integrante do processo político. A tortura feita pelo aparelho de Estado é totalmente diferente de uma tortura feita por insurgentes. O primeiro tem que respeitar a Lei, tem que estar dentro dos padrões institucionais, enquanto os segundos estão se insurgindo contra esse sistema. Se os segundos devem estar sujeitos às leis e ao julgamento legal, os primeiros, ao agiram como os segundos, se tornam criminosos. Simples assim.

A tortura foi usada e abusada pelas forças de repressão. Não era um “excesso”, mas uma prática comum e se tornou parte dos aparelhos de Estado, a tal ponto que o próprio sistema teve que intervir, não porque tinha alguma preocupação humanitária, mas porque era um período em que a Ditadura começa a dar sinais de cansaço e de perda de apoio. A tortura institucionalizada pela Ditadura não é um conto de fada, nem um delírio subversivo, é uma realidade e esta realidade foi transferida para os corpos repressivos e está presente nas polícias militares país afora.

Esse debate volta sempre à tona, exatamente porque os generais conseguiram impedir que a sociedade passasse a limpo esse período sombrio, inventando uma coisa grotesca chamada “anistia ampla geral e irrestrita”, uma espécie de “borrachinha histórica” para apagar o que esses criminosos, que usavam farda e tinha a proteção do Estado, fizeram ao longo de duas décadas. As infâmias e as práticas criminosas da Ditadura continuam sendo colocadas debaixo do tapete e isso enfraquece a democracia, pois os saudosistas estão sempre por aí e um deles é hoje presidente da república e enaltece esses bandidos.

Os saudosistas da Ditadora, muitos deles jovens, acreditam num conto da carochinha, criado pelos próprios militares, para mostrar um país que não existiu. Mas este conto, que na verdade tende mais para o HORROR do que para outra coisa, continua a ter muitos aderentes e crentes.

A Ditadura, além dos crimes contra a civilização, deixou um legado catastrófico na economia, com uma inflação anual acima dos TRÊS DIGITOS, 215,27% em 1984; uma crise econômica que obrigou o país a recorrer, sem sucesso, ao FMI, por sete vezes seguidas entre 1983 e 1984; e um desemprego descontrolado. Os “bons tempos” foram, na verdade, um mito criado e que foi absorvido pela sociedade, que relatam fatos específicos que não eram derivados do regime, mas da própria sociedade em evolução, e quem não sabia o que acontecia, porque existia a censura, de fato achava que vivia na normalidade.

A Ditadura deixou como legado um aparelho burocrático corrompido no qual o Estado aparelhava os cargos públicos com apaniguados e isso se tornou “institucional” e prospera até hoje. Basta ver como os militares rapidinho se acotovelaram nos cargos públicos neste governo e silenciam sobre as centenas de malfeitos de Bolsonaro.

Esses áudios revelam, a bem da verdade, como nosso passado não foi totalmente exposto e será necessário recontar esse momento sombrio, mesmo que sob a perspectiva histórica, para que a sociedade braZileira saiba, de fato, como vivemos a longa noite sobre as botas dos militares.

Apoiar Saiba Mais

Pra quem deseja ajudar a fortalecer o debate público

QR Code

Ajude-nos a continuar produzindo jornalismo independente! Apoie com qualquer valor e faça parte dessa iniciativa.

Quero Apoiar

Este site utiliza cookies e solicita seus dados pessoais para melhorar sua experiência de navegação.