Sem plano para transporte, Semurb defende liberação de prédios mais altos perto do Parque das Dunas
Natal, RN 12 de mai 2024

Sem plano para transporte, Semurb defende liberação de prédios mais altos perto do Parque das Dunas

9 de outubro de 2023
11min
Sem plano para transporte, Semurb defende liberação de prédios mais altos perto do Parque das Dunas

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Como fazer de uma cidade pequena e litorânea um lugar agradável, com temperaturas amenas, em plena era das ondas de calor e eventos climáticos extremos? A resposta, certamente, é complexa e, entre as discussões, está a questão do bom funcionamento do transporte público como alternativa aos veículos individuais.

Em Natal, as reclamações sobre as condições dos ônibus e o preço da passagem (R$ 3,90 no cartão e R$ 4 em dinheiro) são tão antigas quanto boa parte da frota. O assunto, foi um dos temas abordados durante a 5ª Conferência Brasileira de Mudança do Clima, realizada nessa última semana na capital potiguar. A cidade foi escolhida para sediar o encontro porque o Rio Grande do Norte é considerado um símbolo no processo de transição energética.

Ao longo do evento, outras cidades e estados trouxeram exemplos do que tem sido realizado no setor. A representante do Tocantins, por exemplo, mostrou o trabalho de monetização de créditos de carbono como resultado da redução do desmatamento. O estado tem 44% do território composto por unidades de conservação, terras indígenas e reserva legal, sendo que 91% do território é de cerrado e 8% pelo Bioma Amazônia.

Na ocasião, o titular da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal (Semurb), Thiago Mesquita, falou sobre o Plano Municipal de Mobilidade Urbana da cidade, aprovado em 2022, que segue parâmetros internacionais.

Implementamos 110 km2 de ciclofaixas e ciclovias relacionados a um novo modal, que é importantíssimo tanto como alternativa em termos de modal, mas especialmente nesse conceito relacionado às mudanças climáticas, e queremos implementar mais 200 quilômetros até o final do ano que vem... fizemos do Plano Diretor de Natal todas as áreas que margeiam as Zonas de Proteção Ambiental terão uma certa exclusividade nesse tipo de modal”, explicou o secretário durante a 5ª Conferência Brasileira de Mudança do Clima, realizada nessa última semana em Natal.

Nada foi dito sobre frota de ônibus ou outro tipo de veículo que venha a funcionar como transporte público na cidade. O Sindicato das Empresas de Transportes Urbanos de Passageiros de Natal (Seturn) já descumpriu 11 determinações judiciais que ordenaram a volta das linhas que foram tiradas de circulação durante a pandemia da Covid-19.

O projeto de construção de uma trincheira no cruzamento da Avenida Salgado Filho com a Alexandrino de Alencar, zona sul de Natal, também não foi citado.

Conferência foi realizada na sede do Idema I Foto: Mirella Lopes
Conferência foi realizada na sede do Idema I Foto: Mirella Lopes

1º do Brasil

Segundo o titular da Semurb, Natal tem o 1º Plano Diretor do país a definir a política municipal de combate às mudanças climáticas, com metas e objetivos de reduzir 50% de suas emissões relativas ao ano de 2005 e ações até 2030.

Durante a Conferência, Thiago Mesquita foi questionado pela série de mudanças efetuadas na última revisão do Plano Diretor de Natal, aprovado pelos vereadores da capital potiguar em dezembro de 2021 e sancionado pelo prefeito Álvaro Dias (Republicanos) em março de 2022. À época das discussões, o Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) criticou as modificações sugeridas ao Plano em vigor (de 2007) que diminuíam as áreas de proteção, como a ampliação do gabarito de construção que passaria da altura máxima de 65 metros (22 pavimentos) e 90 metros (30 pavimentos) em alguns bairros, para 140 metros (46 pavimentos) em toda a cidade.

“Como corredores ecológicos vão compensar capacidade de adensamento, ampliada pelo Plano Diretor aprovado em 2021, que extinguiu as áreas de adensamento básico, estabelecendo apenas a existência de áreas adensáveis e Zonas de Proteção Ambiental?”, questionou Carol Farkatt, assessora parlamentar.

Na avaliação da Semurb, o novo Plano trouxe parâmetros científicos ao chutômetro do Plano anterior.

“Natal tem uma vocação natural por preservação. Temos uma cidade que tem quase 90% da sua formação geológica arenosa e boa parte dela, com o acúmulo desse material arenoso são as dunas. A gente trabalha com grandes áreas de fragilidade ambiental que hoje garantimos a preservação, conservação ou uso restrito a, aproximadamente, 50% do território, o restante precisamos avançar do ponto de vista de uso e ocupação do solo porque, como ela mesmo colocou, o Plano Diretor de Natal não é mais um chutômetro em relação ao adensamento populacional, como foi o anterior... Se estabelecia que 70% da cidade era de saneamento básico e não se tinha uma relação técnica-científica, um modelo que pudesse justificar isso, hoje nós temos. Está relacionado ao modelo matemático de infraestrutura de bacia de esgotamento sanitário que limita o adensamento à capacidade de infraestrutura, não só ele, mas é o principal fator para definir esse adensamento”, justificou Mesquita.

Thiago Mesquita, titular da Semurb I Imagem: reprodução
Thiago Mesquita, titular da Semurb I Imagem: reprodução

Natal tem cerca de 33% de seu território 10 Zonas de Proteção Ambiental (ZPA’s). O plano da Semurb para mitigar os efeitos do aquecimento global e evitar contribuir para o aquecimento da Terra é criar corredores ecológicos que liguem as ZPA’s com Áreas de Proteção Permanente (APP’s), para ampliar as conexões entre essas áreas e potencializar o sequestro de carbono. Para Mesquita, quando mais adensamento, mais saudável é a cidade.

Se eu consigo concentrar a cidade em torno de um eixo de infraestrutura, sem espalhar a cidade, diminuo custos de infraestrutura, de coleta, transporte e tratamento de resíduos, de esgotamento sanitário, distribuição de água, diminuo os custos de mobilidade urbana, diminuindo as emissões e a necessidade das pessoas se deslocarem”, acrescentou.

PARQUE DAS DUNAS

O titular da Semurb defendeu, também, a recente mudança no Plano Diretor de Natal que permitiu a ampliação do gabarito de construção, ou seja, a elevação de prédios mais altos, no entorno do Parque das Dunas, unidade de conservação e reserva de Mata Atlântica de Natal importante para a manutenção da temperatura mais amena e de ventilação na cidade.

O próprio plano de manejo do Parque das Dunas não define limite de gabarito em relação a ele. Hoje, o principal documento que uma unidade de conservação ambiental pode ter é o plano de manejo. Está acima, inclusive, dos planos diretores municipais. No plano anterior foi estabelecida uma regra, mais uma sem qualquer base técnica-científica, que havia limitação de gabarito ao redor, que era muito discrepante porque você considera Hermes da Fonseca, Salgado Filho e Rui Barbosa como ao redor do Parque das Dunas, mas quando vamos para Tirol e Petrópolis, temos prédios colados no Parque das Dunas. Não havia sentido você limitar gabarito numa área que não tem influência direta relacionada ao aspecto desta unidade de conservação”, citou Mesquita.

Parque das Dunas, em Natal

ENGORDA DE PONTA NEGRA

Durante a Conferência Brasileira de Mudança do Clima, o projeto da engorda da praia de Ponta Negra foi citado como exemplo de política de mitigação dos efeitos das mudanças do clima.

Infelizmente, é necessário se fazer uma engorda, um aterro hidráulico na orla da praia de Ponta Negra. Temos observado um avanço muito rápido da dinâmica costeira. Temos uma atividade eólica muito forte, ventos que sopram o ano todo a, pelo menos, 4 metros por segundo a 60 – 80 metros de altura... então já tem uma erosão eólica acentuada, especialmente naquela ponta do continente que é a praia de Ponta Negra... estamos trabalhando esse projeto de resiliência ambiental, para poder nos adaptar ao processo de mudanças climáticas, porque hoje já não dá mais para falar apenas em combater as mudanças climáticas. Os problemas são concretos e alguns deles são irreversíveis. Precisamos nos adaptar a esse processo e esse projeto de aterro hidráulico é necessário, cientificamente aprovado, para que possamos tentar diminuir os efeitos já ocasionados pela potencialização, por mais que seja um efeito natural, foi potencializado, ao longo dos anos, por causa do aumento da temperatura média registrada também na nossa região litorânea”, defendeu Thiago Nóbrega, secretário da Semurb.

A obra de engorda da praia de Ponta Negra está prevista para o 1º semestre de 2024. Foi orçada inicialmente em R$ 76.068.755,93 para teve o custo ampliado para R$ 110.632.018,98 (R$ 32.563.263,05 a mais), entre recursos da Prefeitura de Natal e do Governo Federal. A projeção da Prefeitura do Natal é alargar faixa de areia da praia em até 100 metros, na maré seca, e 50 metros na maré cheia.

Praia de Ponta Negra, em Natal (RN), com a estreita faixa de areia ocupada por barracas I Foto: Mirella Lopes
Praia de Ponta Negra, em Natal (RN), com a estreita faixa de areia ocupada por barracas I Foto: Mirella Lopes

URGÊNCIA

Julho foi o mês mais quente da história mundial, não apenas em relação às últimas décadas, mas até mesmo quando a temperatura é comparada às projeções relativas há milhares de anos.

Foi nesse “clima” de urgência, que ambientalistas, pesquisadores, integrantes de ongs e interessados no tema se reuniram na sede do Idema, em Natal, entre os dias 4 e 6 de outubro, para a 5ª Conferência Brasileira de Mudança do Clima.

Dados da Oxford de 2021 apontam que os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por 52% das emissões que poluem a atmosfera. Enquanto isso, os 50% mais pobres são responsáveis por 7%.

Ou seja, aqueles que mais contribuem com as mudanças do clima são os que menos poderão experienciar o seu impacto”, comentou Caio Magri, diretor-presidente do Instituto Ethos, que apresentou os dados citados no parágrafo anterior durante a abertura da Conferência.

Sabemos hoje que as populações mais pobres são as mais impactadas, justamente, por serem relegadas a habitar áreas de risco, sujeitas a deslizamentos de terras e alagamentos, ou até mesmo a plantas industriais, lixões e aterros sanitários, estando sujeitos não apenas a questões do clima, mas a questões sanitárias, de bem-estar e de saúde. Portanto, pensar na agenda climática desassociada à agenda de direitos humanos e de enfrentamento às desigualdades não é mais possível”, alertou Magri.

A partir do encontro foram discutidas metas, além da construção de alternativas e metodologias para que instituições públicas e privadas de todo o país orientem suas ações na busca por uma vida mais justa e sustentável.

O ano de 2023 representa uma verdade essencial para o Brasil. Saímos de quatro anos de negacionismo climático explícito e um desmonte absoluto das políticas de salvaguardas ambientais do Brasil”, lembrou Macri.

As sugestões coletadas serão reunidas em um documento e apresentadas durante a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP-30), em 2025, em Belém, no Pará.

“As propostas serão anexadas ao Plano Clima, que é o compromisso do Brasil para atender ao Acordo de Paris. A agenda é para que as instituições assumam compromissos. Quando falávamos em aquecimento global parecia algo distante, agora vemos que os resultados estão aí”, detalhou Felipe Saboya, diretor-adjunto do Instituto Ethos.

O Brasil está entre países mais afetados, sendo a Amazônia e o Nordeste as regiões do país mais vulneráveis às mudanças climáticas. Além das vidas afetadas, o prejuízo financeiro, segundo o governo brasileiro, chega aos R$ 5 bilhões por ano, apenas por causa de problemas resultantes da mudança do clima.

Felipe Saboya durante a Conferência em Natal I Foto: Mirella Lopes
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