Arquidiocese de Natal cria mecanismos para combater crimes sexuais
Natal, RN 8 de mai 2024

Arquidiocese de Natal cria mecanismos para combater crimes sexuais

3 de novembro de 2023
5min
Arquidiocese de Natal cria mecanismos para combater crimes sexuais
Foto: Brunno Antunes

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A Arquidiocese de Natal, que teve um padre excomungado em 2017 por pedofilia, tem novos mecanismos para combater abusos sexuais, incluindo criação de ouvidoria e regras para acesso de crianças e adolescentes em espaços paroquiais. Nesta sexta-feira (3), o arcebispo metropolitano de Natal, Dom João Santos Cardoso, publicou o decreto 20/2023, que institui normas de conduta para o trato com pessoas vulneráveis.

O documento foi publicado após reunião com a comissão arquidiocesana de tutela para menores e adultos vulneráveis, realizada na quarta-feira (1º). A decisão está em concordância com a Carta Apostólica Vos estis lux mundi (“vocês são a luz do mundo”), do Papa Francisco, que, em 2019, ampliou procedimentos para prevenir e combater esses crimes dentro da Igreja.

O texto do papa obriga religiosos a reportarem à hierarquia qualquer suspeita de abuso sexual e exige a denúncia de qualquer tentativa da hierarquia católica de encobrir esses atos cometidos por padres e demais religiosos.

O assessor jurídico da Arquidiocese, Cláudio Cavalcante, foi designado ouvidor. Curiosamente, a parede de sua sala estampa imagem de Nossa Senhora da Luz, conhecida também como Nossa Senhora das Candeias, da Candelária ou da Purificação. Ao ser questionado sobre o quadro, Cavalcante diz que está ali há onze anos. “Não é coincidência do destino. O decreto é justamente isso: vós sois luz do mundo. Isso mostra que os caminhos de Deus são justamente assim, é nisso que acredito, é o que me faz sair todo dia de casa para trabalhar”, comenta.

Ele reconhece a importância da medida para a Igreja: “Cumpre com o preceito do Santo Padre e garante acesso a todos que realmente tenham demanda a apresentar na matéria em questão. Além disso é da natureza deste órgão a atenta e diligente ação, de forma estável e institucional, para receber todos os casos e encaminhá-los para os devidos setores de instância resolutiva, de forma independente e impessoal.”

A circunscrição eclesiástica não divulga número de investigações. O ouvidor explica que os processos se tornam públicos apenas com as sentenças. Antes, seguem em segredo de justiça, bem como na seara penal brasileira.

Um caso

No Rio Grande do Norte, o único caso em que comprovadamente houve esse tipo de profanação ocorreu em 2017, quando o Tribunal Eclesiástico Interdiocesano de Natal excomungou o padre José Irineu da Silva, 42 anos, seis anos após ter abusado de um menino de dez anos, na sacristia da Capela de São José Operário, no Distrito de Arapuá, em Ipanguaçu.

“A decisão do arcebispo de Natal, Dom Jaime Vieira Rocha, arcebispo naquela época, foi a primeira e até agora única envolvendo um padre denunciado por esse tipo de crime.”, lembra Cláudio Cavalcante.

O ex-padre potiguar respondeu pelo crime também na “Justiça dos homens”. Condenado por estupro de vulnerável, ele foi preso em Goiás, em 2019, em ação do Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN).

Normas

O novo decreto católico, composto por 17 artigos, estabelece que qualquer acusação deve ser encaminhada ao arcebispo acompanhada de declaração escrita, com indicações detalhadas dos fatos e pessoas envolvidas. Também detalha o procedimento a ser adotado.

“Reunida a materialidade e os indícios de autoria, o processo será enviado para as comissões e/ou instâncias resolutivas (Tribunal Eclesiástico/Comissão de Tutela de Menores/Gabinete do Arcebispo) para o devido processamento - ocasião que deverá ser garantida o contraditório - para se chegar ao um decisão justa.”, explica Cláudio Cavalcante.

O texto – assinado pelo arcebispo metropolitano, Dom João Santos Cardoso, e pelo chanceler da cúria, Padre Francisco de Assis de Melo Barbosa – determina que qualquer colaborador vinculado à Arquidiocese de Natal que “incorrer na prática de má conduta sexual com menor de idade ou adulto vulnerável” será afastado de suas funções, até que o fato seja devidamente apurado, ou demitido.

Além da criação da ouvidoria, ficou proibida a presença de crianças e adolescentes desacompanhados de seus responsáveis no escritório, na casa paroquial, na secretaria paroquial, em veículos pertencentes a qualquer Instituição da Arquidiocese de Natal, em veículos pessoais onde estejam clérigos ou demais religiosos.

Desse modo, também não será permitido oferecer alojamento a menores desacompanhadas pelos responsáveis durante atividades organizadas por entidades ligadas à Arquidiocese de Natal, pastorais, movimentos e serviços.

As confissões (Sacramento da Reconciliação) devem ser feitas em lugares adequados, que garantam segurança e visibilidade ou em salas com portas ou janelas de vidro transparente e, sempre, em ambientes onde circulem outras pessoas, resguardado o sigilo, obrigatório e inviolável do rito.

Serviço

A ouvidoria da Arquidiocese passa a ser o órgão responsável por receber e acolher as denúncias relacionadas a abuso físico ou psicológico, cujas vítimas sejam crianças e adolescentes ou adultos vulneráveis (pessoa em estado de enfermidade, deficiência física ou psíquica, ou de privação da liberdade pessoal que, de fato, mesmo ocasionalmente, limite a sua capacidade de entender ou querer e, em todo o caso, de resistir à ofensa).

A ouvidoria funciona no Centro Pastoral Pio X – subsolo da Catedral Metropolitana de Natal, de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 13h às 17h.

As denúncias também poderão ser enviadas para o e-mail [email protected] ou o contato pode ser feito também através do telefone (84) 98131-0883.

Leia decreto na íntegra.

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