Prefeitura do Natal apresenta projeto a empresários e ignora moradores

Os moradores das regiões da Praia do Meio, Brasília Teimosa (Praia do Forte) e Praia dos Artistas, situadas na Zona Leste de Natal, reclamam que não foram ouvidos no processo de elaboração do projeto de recuperação dessas áreas, apresentado aos empresários do setor de turismo na última sexta (15).

“Eu não tenho como dizer se concordo ou não porque não vi nada, não teve uma reunião, uma audiência pública. Não procuraram a gente nem antes, nem depois. O que vimos foi uma maquete que passou no jornal da televisão. Nós somos moradores nativos e temos que ser ouvidos”, critica Neto Bezerra, funcionário público que mora na Rua do Motor, entre as praias do Meio e Areia Preta.

Saiba +

Em reunião com “trade”, Prefeitura anuncia reforma de praias de Natal

Neto conta que mora na região desde os três anos de idade e lembra das lagoas de água doce que se formavam no terreno onde já foi o Hotel Reis Magos. Ele e os nove irmãos foram criados lá, onde também criou os cinco filhos, uma delas faz doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

“Minha mãe ficou viúva aos 26 anos e veio de Mossoró com os dez filhos. Depois de um tempo conseguiu comprar uma casinha. Eu comprei a minha aos 16 anos, vendia picolé de manhã na praia, estudava à tarde e voltava à noite pra vender bala na praia”, relembra Bezerra, que se preocupa com a especulação imobiliária e a pressão para deixar o local onde cresceu e criou os filhos.

“Como não fomos escutados, devemos entrar com ação no Ministério Público. Sabemos que vai haver muita especulação imobiliária por aqui. Nossa área é a pupila dos olhos de todo prefeito”, pondera.

As obras

Segundo a Prefeitura do Natal, os serviços já foram iniciados na Avenida 25 de Dezembro, que fica por trás do antigo Hotel Reis Magos e vai até a Rua do Motor. Pelo planejamento, será feita drenagem, pavimentação asfáltica, calçadas, sinalização, paisagismo e nova iluminação para que os veículos estacionem na via e desafoguem a orla. Essa parte da obra já havia sido anunciada pela prefeitura em julho do ano passado, com orçamento de R$ 5 milhões e recursos do Ministério das Cidades.

“O Projeto de Requalificação da Orla Central de Natal acabou de ser oficialmente lançado pela Prefeitura de Natal, gestão Álvaro Dias. Dizem que o Trade Turístico já conheceu e aprovou o projeto. E a comunidade local? Dizem que houve escuta comunitária. Mas, a principal Associação Comunitária local, a AMA Praia do Meio, diz que há controvérsia”, denuncia Milton França, educador e ambientalista.

"O diálogo com a comunidade local foi insuficiente e não foi natural e eficiente. Tivemos que provocar mais de uma vez e nem sempre fomos atendidos, mesmo quando eu ainda era o presidente da AMA Praia do Meio, membro nos conselhos municipais Concidade [Conselho da Cidade do Natal] e Conplam [Conselho de Planejamento Urbano e Meio Ambiente de Natal ], e do Projeto ORLA, além de participante dos seminários de Elaboração do PGI- Plano de Gestão da Orla de Natal. Mesmo assim, tive que quase implorar para ver o projeto. Ele foi mostrado numa fase ainda inicial, onde fizemos algumas sugestões de melhorias. Foi prometido mostrar quando o projeto já tivesse sido consolidado com os subprojetos executivos disponíveis. Isso não aconteceu", continua o ambientalista.

As únicas imagens disponibilizadas até o momento sobre o projeto foram publicadas recentemente nas redes sociais. No vídeo, o prefeito de Natal, Álvaro Dias, afirma que haverá equipes nos locais das obras nos turnos da manhã, tarde e noite para garantir o cronograma de execução das obras. Além disso, a postagem traz a opinião de pessoas que estavam na rua para disfarçar a falta de participação popular na elaboração da proposta.

“Não sabemos ainda quantas das nossas sugestões foram acatadas, total ou parcialmente. Não vi ainda se incluíram a necessária requalificação da Rua Rodrigues Dias, que é paralela à 25 de Dezembro. Vi na maquete divulgada que a prefeitura mantém o Skate Park num dos pontos de maior carregamento de areia da orla central. O único estudo feito foi o de solo”, analisa Milton França.

O projeto de revitalização das praias ainda prevê intervenções a partir da avenida Nilo Peçanha, na avenida Getúlio Vargas até a Avenida Café Filho, onde serão feitas obras de revitalização. O atual sentido do fluxo de veículos será mantido, mas os atuais quiosques serão substituídos por novas unidades, serão colocados novos banheiros, guarda-sóis fixos e padronizados ao longo da Avenida Café Filho, além de novos modelos de lixeiras subterrâneas. 

"Ao que parece, o único estudo de campo feito para elaboração e aplicação do projeto de requalificação da Orla Central foi a prospecção do solo e medições. Será que os projetos dos mirantes da Getúlio Vargas e as passarelas da Praia do Forte desconsideram os perversos cenários de potencial bloqueio de paisagens e a privatização militar de áreas de histórico uso civil oportunizados através do novo Plano Diretor (Lei 208\2022)? Afinal, a população de Natal e do RN já sabem que o novo Plano Diretor de Natal, aprovado por 25 vereadores e pelo prefeito Álvaro Dias, causará grandes perdas ao patrimônio público cênico-paisagístico e a qualidade de vida de natalenses e potiguares quando permitiram, sem nenhum estudo de impacto e consulta pública adequada, a construção de prédios de 22 andares na Ponta do Morcego , sete andares na Avenida Café Filho (frente da praia), 20 andares na 3ª faixa de quadras da orla e 44 andares no amplo terreno da ex tancagem da Petrobras", aponta o ambientalista.

Pelo projeto da prefeitura da capital, também será construído um skate parque para competições, passarelas acessíveis, estacionamento para buggys, o Largo do Sol Nascente (área para realização de eventos), campo de futebol, quadra de areia, quadra poliesportiva e nova iluminação pública, além de um Centro de Apoio ao Turista, uma base da Guarda Municipal e intervenções nas proximidades do Hospital Universitário Onofre Lopes (Huol), onde será instalada uma rotatória e novo estacionamento. 

"Pelo que vimos em alguns trechos da maquete eletrônica divulgada em redes sociais, há alguns desafios que o projeto necessita vencer para seu êxito. Exemplos: como funcionará adequadamente o Skate Park que querem construir ao lado do campo de futebol se o local é um dos pontos de maior carregamento de areia da orla central? Como será a construção e a operação de infraestruturas para uso civil na Praia do Forte, se a maior parte dela e da Fortaleza dos Reis Magos passaram a ser uma Área Especial de USO EXCLUSIVO MILITAR ( segundo a Lei Municipal 208/2022 art.s 17 e 54 e mapa das AEMs)? Quer dizer, o Uso Civil dessa região é ILEGAL desde março de 2023, quando entrou em vigor o novo Plano Diretor de Natal", questiona Milton França.

Saiba +

Prefeitura recebe três propostas para engorda da praia de Ponta Negra

Prefeitura de Natal vai reformar avenida que fica por trás do antigo Hotel Reis Magos

Comerciante premiado da Redinha é preso por tentar trabalhar na praia