Caso Gabriel: A dor de perder o filho e a demora em julgar os acusados
Natal, RN 7 de mai 2024

Caso Gabriel: A dor de perder o filho e a demora em julgar os acusados

21 de abril de 2024
6min
Caso Gabriel: A dor de perder o filho e a demora em julgar os acusados
Imagem: cedida

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O júri popular que irá julgar os policiais militares acusados pela morte de Giovanni Gabriel de Souza Gomes, de 18 anos, acontecerá no próximo dia 04 de junho, depois de ter sido adiado em várias ocasiões e às vésperas de quando completa quatro anos desde que o jovem foi assassinado, em 05 de junho de 2020. Quase quatro anos depois do crime, os PMs continuam soltos. A Agência Saiba Mais conversou com Priscila Sousa da Silva, mãe de Gabriel, que contou como tem sido esses anos desde a perda física do filho e ainda falou sobre a demora do sistema de justiça para julgar agentes do Estado.

Priscila conta que, desde o acontecimento, buscou provar que o filho era inocente.

“O que me motivou a lutar por justiça foram os comentários maldosos de que meu filho era bandido, e eu tinha a capacidade de provar que ele não era, como provei. E a ajuda da população e dos grupos de movimentos que me ajudaram bastante, e minha motivação também para que outras mães não passem pelo que estou passando”, afirma.

Em junho próximo, completam-se quatro anos desde que Gabriel, morador do bairro Guarapes, Zona Oeste de Natal, foi visto pela última vez quando saiu para visitar a namorada. O corpo do jovem só foi encontrado nove dias depois, em avançado estado de decomposição, em São José de Mipibu (RN).

Os acusados pelos crimes de homicídio qualificado, sequestro e ocultação de cadáver são Paullinelle Sidney Campos Silva, Bertoni Vieira Alves, Valdemi Almeida de Andrade e Anderson Adjan Barbosa de Sousa, todos da PM. Enquanto não vão a júri popular, eles respondem em liberdade.

A mãe de Gabriel conta como tem sido enfrentar o sistema de justiça enquanto busca justiça para o próprio filho.

“Para mim tem sido muito decepcionante enfrentar o sistema de justiça. Foi um desafio ter que me calar por muitas coisas. Por exemplo, ter a vontade de dizer bem claro que a justiça toda sabe que esses réus são os culpados e mesmo assim eles ficam enrolando pra dar a sentença, porque ficam procurando um modo de dar a sentença favorável aos réus”, relata.

Ela ainda destaca a questão racial, argumentando que o fato do filho ser jovem e negro motivou o crime. “Gabriel foi morto por preconceito de ser jovem, porque pra polícia todo jovem é bandido, ainda mais sendo negro e morando em bairro periférico. E o sistema não faz nada pra mudar isso”.

E ainda fala sobre como enxerga a polícia hoje em dia, após o caso.

“Hoje quando vejo a polícia não me sinto mais segura, não sei se fico ou se corro. Pra mim é uma frustração saber que aqueles que poderiam proteger a população é quem estão matando nossos jovens sem motivo algum”.

Priscila conta como se sente com a demora para o julgamento dos PMs. “Eu já esperava por essa demora do júri e por todos esses adiamentos. O que me mantém resiliente é que todos esses adiamentos e essa demora de marcar uma nova data para o júri é que toda essa demora só prova ainda mais que eles são culpados [sic]”, revela.

Saiba quem é Priscila Sousa da Silva

A mãe do jovem Gabriel tem 37 anos e é auxiliar de serviços gerais. Priscila conta que se casou e teve filhos muito jovem. “Me casei com 12 anos e já engravidei da minha primeira filha. Quando eu fiz 13 ela nasceu e com 14 anos já tive um menino”, narra.

Além de enfrentar o assassinato do filho Gabriel, Priscila também precisou provar na justiça a inocência do filho. Imagem: Cedida.

Com o divórcio que surgiu logo depois, vieram também as dificuldades de manter as necessidades básicas dela e dos filhos. “Com 15 anos me separei. Tive que começar a trabalhar e sustentar meus dois filhos praticamente sozinha, recebendo uma pensão do pai deles de 30 reais por mês e que ia aumentando 10 reais por ano”, conta Priscilla. “Todo o gasto de roupas, calçado, material escolar, remédios e maior parte da alimentação era minha,  e a parte da educação também!”

Além de enfrentar o assassinato do filho Gabriel, Priscila também precisou provar na justiça a inocência do filho, mas conseguiu.

“Para mim foi um desafio enorme quando descobri que eu tinha que enfrentar a justiça para provar a inocência do meu filho. Foi um desafio pra mim ter que enfrentar quatro policiais. Me sinto vitoriosa, eu consegui provar que meu filho não era ladrão e mesmo que a justiça inocente os assassinos, o que importa é que todo mundo sabe que eles são culpados. Até a justiça sabe que eles são culpados”, relata a mãe.

Além da justiça para o próprio filho, ela também busca, agora, conscientizar e promover mudanças no sistema. “Eu luto para que o sistema se envergonhe mais ainda, para que ele elabore algum projeto ou leis mais justas. O sistema precisa mudar.  Igual a mim tem várias outras mães que têm suas vidas acabadas por conta do sistema”, desabafa a mãe, que conta também como tem sido difícil para ela desde que perdeu o filho.

Não é fácil se olhar no espelho e procurar por você mesmo, perguntar pra si mesmo cadê aquela mulher e ter a certeza que não vai voltar nunca mais. Por mais que eu tente nunca mais vou ser a mesma pessoa. Quando tento ser feliz por completo com minha filha, meu marido, minha neta, de repente minha felicidade é engolida [sic] pela saudade do meu filho e isso é culpa desse sistema”.

Ela ainda conta como tem, desde então, conciliado as diferentes demandas da vida pessoal, profissional e social como mulher. Segundo Priscila, depois de todo o sofrimento que passou e continua enfrentando, ela precisou continuar equilibrando diferentes áreas da vida. “Só uma mulher consegue acordar às 4h da manhã com uma tristeza e um choro no rosto, e sai pra trabalhar e quando chegar no trabalho estar com um sorriso enorme no rosto,  recebendo os clientes com uma simpatia gigante. só  uma mulher consegue equilibrar sua vida pessoal, depois de todo sofrimento que passei”.

“Quando perdemos um filho, é um pedaço de nosso corpo que vai embora. Em casa sou uma mulher forte para poder colocar ordem na casa e não perder meu moral de mulher [sic], porque se choro minha família chora junto comigo”, relata. “No trabalho sou a mulher simpática e alegre pra não assustar as crianças com meu sofrimento, e na minha vida social sou uma mulher realizada determinada onde faço amizades e conto sempre a história do meu filho. Só uma mulher consegue ser forte assim”.

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