Seridó é guardião do Doce Seco, uma sobremesa quase extinta
O historiador e folclorista Câmara Cascudo disse sobre doce seco: “a casca é a farinha de mandioca, fina, feito angu, seca, com outra porção de farinha para abrir o ponto. A espécie, recheio, é feita de farinha de mandioca, sessada em peneira fina, gengibre, gergelim, castanha de caju, pimenta-do-reino, cravo, erva-doce, mel de rapadura...”
Com massa fina e crocante, recheado com “espécie”, o doce seco resiste no Seridó do Rio Grande do Norte, pelas mãos das doceiras Maria de Fátima da Silva, “Betinha Cafumbó”, de Caicó, Vandilza Gonçalves, de Jardim do Seridó, e Zélia Fernandes, de São João do Sabugi.
Betinha Cafumbó, 59 anos, cresceu assistindo as tias da família Cafumbó, na produção de raivinhas, sequilhos, biscoitos e doce seco. Betinha aprendeu a fazer doce seco com sua tia Nilza Cafumbó, quando tinha 30 anos, para atender a alta demanda de encomendas, principalmente em dezembro, com a chegada das festas natalinas.
Nos últimos anos, Betinha tem grande preocupação com a provável extinção do doce seco. Então, ela tem abraçado oportunidades de transmitir seu conhecimento, como em 2019, no Encontro de Doceiras do Seridó, em que Betinha fez a receita do doce seco, ao vivo, diante da plateia, e na segunda edição da Revista Bucho Cheio, lançada em dezembro de 2023, onde Betinha é destaque, com receita e modo de fazer.
Vandilza Gonçalves da Silva, 58 anos, de Jardim do Seridó, ajudava sua avó Josefa Elvira a separar e moer os ingredientes para fazer o doce seco. A aprendizagem do doce seco, aconteceu naturalmente nesta convivência. Atualmente ela faz a sobremesa somente por encomenda.
Em São João do Sabugi, a tradição do doce seco é perpetuada pelas mãos de Zélia Fernandes, que conta com 87 anos. Foi com Maria Cabocla que Zélia aprendeu a fazer doce seco e, hoje, as filhas de Zélia também já fazem sob encomenda.
Nem frito, nem assado, o doce seco tem massa crocante graças à colaboração do vento. Se o ar estiver úmido, a massa não seca. Feito em várias etapas, pode demorar até três ou quatro dias para ser concluído e, ao final, pode ser decorado com colorau ou corante comestível. Na lembrança dos seridoenses, o doce seco é associado as tradicionais festas em família.
A professora aposentada Elvira de Assis, hoje com 74 anos, relata que o doce seco reunia a família no sítio Quixeré, município de São João do Sabugi, desde o fazer até o compartilhar na mesa, nas festas natalinas e outras comemorações importantes.
“Quando tinha qualquer festa na Casa do Alto, toda família participava. Mamãe, tia Francisca Catarina, e as filhas dela, faziam o doce seco, em três dias. Os homens assavam a castanha, e elas ajudavam a quebrar, moer ou pilar pra usar na espécie. Acontecia principalmente em dezembro, para Noite de Natal e quando juntava os netos para Primeira Eucaristia. Eu criança, rodeava a mesa e tia Francisca dava um pouco da espécie, dizendo que, quando ficasse tudo pronto, chamava. Quando terminava, todo mundo saía pra casa, com uma vasilha com o doce seco”, relembra Elvira.
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Essa reportagem faz parte do projeto "Saiba Mais de perto", idealizado pela Agência SAIBA MAIS, e financiado com recursos do programa Acelerando Negócios Digitais, do ICFJ/Meta e apoio da Ajor.
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